Serviço Nacional de Saúde II

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Retomo o tema Serviço Nacional de Saúde. Abordei o tema quando a Ministra Marta Temido se demitiu.

Sem ainda saber quem a substituirá, deixo algumas ideias.

Como já referi em artigo anterior, o SNS foi criado porque era indispensável dar uma resposta política à forma como os cuidados de saúde eram prestados antes do 25 de Abril de 1974, seguindo exemplos do que se fazia nos países do norte da europa.

Mas não houve na sua génese uma definição filosófica geral orientadora do que deveria ser um Serviço de Saúde de âmbito nacional.

Agregaram-se vontades políticas, juntaram-se hospitais e médicos e nasceu um Serviço que se foi adaptando à necessidade do tempo.

Nasceu dos hospitais e dos médicos hospitalares, e cresceu para os hospitais e médicos hospitalares.

O utente veio depois - não gosto do termo utente, mas era o que havia na altura.
Vamos pensar o Serviço Nacional de Saúde, imaginando-o como um recém-nascido que nascendo em ambiente hospitalar, tem à sua espera um médico pediatra que o examina, mede, pesa, uma enfermeira que o acolhe, limpa e o leva ao colo da mãe. Aqui já estão dois profissionais de saúde. A mãe foi acompanhada por médico e enfermeira obstetras que garantiram que tudo correria bem. Mais dois profissionais. O pai acompanhou e foi vendo que, para que tudo tivesse corrido bem, eram também necessários outros profissionais, auxiliares e outros, que garantiam que tudo estava no seu lugar.

Continua tudo a correr bem e o bebé vai para casa, onde tem a visita dos avós materno e paterno, depois de ter ido ao centro de saúde fazer o teste do pezinho, a cargo de uma enfermeira, e é observado por um médico, o médico da família que vai tratando da "normalidade" doa avós. E a vida corre segura.

Mas, pode haver alguma doença, do bebé, da mãe, do pai, doa avós, e para isso, o médico da família, se achar necessário, recorre a outros colegas para o ajudarem seja no diagnóstico, seja nas terapêuticas.

Bem, até agora já temos cerca de uma dezena de profissionais de saúde, só para um bebé e sua família. Mas não pensável que cada cidadão vá ter um médico, enfermeiro ou outro profissional só para si. Estes profissionais estão habilitados para observarem, tratarem, cuidarem de um número muito maior de pacientes, sãos ou com alguma patologia.

E assim se vão criando os serviços e as diferenciações indispensáveis para que tudo corra da melhor forma possível.

O bebé nasceu num hospital, num Serviço de Obstetrícia, onde havia um serviço de Neonatologia e de Pediatria, com médicos e enfermeiros preparados para o receberem são ou doente.

Mas, caso necessário fosse, no mesmo hospital haveria outros serviços com outros médicos de outras especialidades aptos a tratarem, em conjunto com todos os outros profissionais de saúde, da mãe, do pai, dos avós, tios e primos do bebé, cada um com a sua doença (ou não), referenciados pelo médico da família que os atende no centro de saúde.

O Serviço Nacional de Saúde tem de ter o paciente, mesmo que não necessitando de cuidados inadiáveis, como o centro de toda a sua actividade, congregando à sua volta todos os profissionais necessários para que a sua saúde individual seja um desígnio nacional.

É partindo do bebé e dos profissionais necessários ao seu bem-estar, alargando ao agregado familiar com a intervenção de outros profissionais, que podemos ir construindo um Serviço Nacional através da avaliação das necessidades, locais, regionais e nacionais em termos de recursos, humanos e físicos, para que se possam implementar os vários Serviços de Cuidados Primários em Centros de Saúde e Cuidados Diferenciados em ambiente hospitalar.

Enquanto o Serviço Nacional de Saúde, tal como o conhecemos for uma hospitalocracia e um terreno fértil de reivindicações políticas corporativas, não haverá um verdadeiro espírito de Serviço Público, logo não haverá um verdadeiro Serviço Nacional de Saúde.

Mudam-se os tempos mudam-se as vontades, e sem mudanças estruturais de paradigmas, dificilmente teremos um Serviço Nacional, mas sim uma manta de retalhos de muitos serviços locais, enredados em várias e complexas teias de interesses reivindicativos, campo fértil para a política barata e populista que se tem visto ao longo dos anos da existência do SNS.

Há que ter coragem na mudança necessária para que seja da base que se parte para o topo, tal como preconizava Maslow. Sem a garantia de que as necessidades básicas estão asseguradas, nenhum recém-nascido terá a garantia de que a sua Saúde será a qualidade que todos almejamos nem a excelência que o País tem a obrigação de providenciar.

Médico

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