O Portugal-Sérvia, hoje, traz Luka Jovic de volta o Estádio da Luz como um dos homens do momento no futebol europeu. Ao contrário do que esperaria em janeiro de 2016, quando se mudou, ainda como um adolescente promissor, do Estrela Vermelha para o Benfica, o avançado sérvio nunca pôde mostrar-se aos adeptos portugueses (e os encarnados, em particular) como titular do clube da Luz. Mas regressa agora como um dos mais excitantes jovens atacantes do futebol mundial - e voltará de novo, a 11 de abril, aí para jogar mesmo contra o Benfica, na Liga Europa..Por estes dias, muitas das conversas sobre a seleção sérvia andam em redor dele. Luka Jovic, o avançado que não teve tempo para brilhar no Benfica - foi emprestado aos alemães do Eintracht Frankfurt com uma opção de compra de apenas seis milhões de euros (acautelando uma percentagem, alegadamente entre 20% e 30%, da mais-valia de uma futura transferência) - é agora estrela em destaque na Bundesliga, onde está entre os melhores marcadores e revela um futebol distinto que o coloca no meio de um leilão milionário (Barcelona, Real Madrid, Manchester City, PSG...)..O entusiasmo em redor do jovem avançado estende-se até ao ambiente da seleção sérvia, pela qual Jovic se estreou a marcar precisamente na última quarta-feira, num particular frente à Alemanha (1-1) que serviu para preparar este embate com Portugal, a contar para a fase de apuramento para o Euro 2020. Aproveitando a indisponibilidade física de Mitrovic, avançado do Fulham que tem sido o ponta-de-lança de referência da Sérvia nos últimos anos, Jovic estendeu para a seleção a marca goleadora que tem deixado nos relvados com a camisola do Eintracht Frankfurt e deixou o aviso de que está pronto a assumir os focos do ataque nesta campanha de qualificação que os sérvios iniciam na segunda-feira no Estádio da Luz..Se às custas de Mitrovic ou não, falta saber, mas parece nesta altura difícil que o selecionador Mladen Krstajic possa ignorar a estrela do momento. Ainda para mais depois dos elogios que lhe dedicou publicamente. "É claro que ele tem um enorme potencial, pode conseguir grandes feitos. Poderia compará-lo com Luis Suárez [avançado uruguaio]. Ele é um avançado clássico, faz um excelente trabalho com a bola e entende perfeitamente o jogo", disse o técnico à imprensa alemã..Zoran Filipovic, um outro antigo avançado do Benfica que hoje é diretor da federação sérvia, compara Jovic com outra pérola encarnada que vive os primeiros tempos na seleção principal portuguesa. "É um jogador que promete, tem tanta qualidade como João Félix."."Calma, ainda há Mitrovic", lembra Jokanovic.Outro sérvio bem conhecido do futebol português é Predrag Jokanovic, que há mais de 25 anos aterrou na Madeira, onde já passou pelos três principais clubes da ilha (Marítimo, Nacional e União), como jogador, treinador ou dirigente. A ascensão meteórica de Luka Jovic não o surpreende, garante o antigo médio. "Não surpreende a mim nem surpreende o Benfica, certamente. Quando o foram contratar sabiam que ele tinha muito talento. Só que quando chegou cá tinha o Jonas, o Jiménez e o Mitroglou à frente dele. Não era fácil um miúdo de 18 anos jogar naquele ataque do Benfica", recorda..Por isso, Jokanovic acha que "o Benfica fez bem" em emprestar Jovic e que o atacante "teve a sorte" de ir para o Eintracht Frankfurt, onde "encontrou um treinador que falava a mesma língua do que ele e que soube rentabilizá-lo. O Niko Kovac, que hoje está no Bayern"..Mas, apesar disso, e de vislumbrar para o atacante do Eintracht um futuro num clube de topo mundial, Jokanovic não está certo de que tenha chegado já a hora para o jovem avançado se impor como o dono do ataque da Sérvia. "Ainda há o Mitrovic, calma. Continuo a achar que ele [o avançado do Fulham] é que vai ser o titular. É como Portugal: descobriram agora o Dyego Sousa, que está a fazer uma boa época, mas a referência continua a ser o Ronaldo.".Luka Jovic é só o último exemplar de talento numa seleção que nunca teve falta deles. Conhecidos como os brasileiros da Europa ainda no tempo da ex-Jugoslávia, os sérvios carregam o legado da seleção que foi vice-campeã europeia em 1960 e 1968 [e chegou às meias-finais do Mundial 1962], mas desde a Guerra dos Balcãs que estilhaçou a antiga Jugoslávia a seleção sérvia não tem conseguido, por exemplo, igualar o nível da vizinha Croácia nas competições internacionais. Ao talento tem faltado uma organização coletiva funcional, num país e numa seleção que continuam um caldeirão cultural efervescente.."Muito talento, mas falta sempre qualquer coisa".Para Jokanovic, a Sérvia "é um pouco como Portugal há 25 anos, quando cá cheguei", diz. "Uma seleção com muito bons jogadores mas à qual continua a faltar alguma coisa para ter sucesso. Não sei o quê, se é organização ou maior união. Veja-se a Croácia, que conseguiu unir-se em torno da seleção e já conseguiu, nos últimos 20 anos, um terceiro lugar [1998] e uma final [2018] em mundiais. Um país que é metade da Sérvia e de Portugal", compara o antigo jogador, atualmente com 50 anos..No último Mundial da Rússia, esta seleção da Sérvia ficou-se pela fase de grupos, com derrotas frente ao Brasil e à Suíça e uma vitória tangencial (1-0) apenas contra a Costa Rica. Mas desde então não voltou a perder qualquer jogo, tendo vencido o grupo 4 da "terceira divisão" da Liga das Nações com quatro vitórias e dois empates [ambos frente à Roménia]. Na última quarta-feira, relembre-se, empatou na Alemanha. E o selecionador Mladen Krstajic assume a presença no Euro 2020 como o único cenário admissível para uma seleção que marcou presença pela última vez num campeonato da Europa ainda sob o nome de Jugoslávia, em 2000. .Já quase metade sérvio, metade madeirense, Jokanovic aguarda com expectativa esse duelo entre as duas seleções que lhe habitam o coração - "na segunda-feira [hoje] sou sérvio, mas quando a Sérvia não joga sou sempre por Portugal", esclarece. Mas não tem dúvidas de que "Portugal é favorito". "Quando se é o campeão da Europa tem de se ser o favorito. Não se pode fugir a essa responsabilidade", diz o antigo médio..Quanto à atual Sérvia, Jokanovic nota que a seleção está já "diferente" do que mostrou no Mundial 2018, "renovada", mas também não embarca em grande otimismo pelo facto de a equipa ainda não ter perdido desde o campeonato do mundo. "A Sérvia ganhou o seu grupo na Liga das Nações, sim, está bem, mas a Liga das Nações que interessava era aquela que Portugal ganhou. O que importa ganhar a terceira divisão?", desvaloriza. Tão-pouco dá grande crédito ao empate no particular frente à Alemanha: "Os alemães jogaram muito desfalcados, quase com a equipa B.".Uma geração de ouro com sucesso nas camadas jovens.Para o antigo médio, que se estreou na primeira divisão portuguesa num União da Madeira-V. Setúbal, a 12 de setembro de 1993, e acumulou 191 jogos e 18 golos ao longo de nove temporadas nos relvados nacionais, o real valor da Sérvia que vai apresentar-se hoje na Luz "é ainda uma incógnita", mas os responsáveis sérvios depositam grande esperança em que esta geração possa colocar definitivamente a sua seleção entre a elite do futebol mundial, dando sequência ao sucesso recente nas camadas jovens..Muitos dos jogadores que se apresentarão na Luz fizeram parte das conquistas da Sérvia no Europeu de sub-19, em 2013 - então sob o comando do ex-Benfica e FC Porto Ljubinko Drulovic - e no Mundial de sub-20 em 2015. Entre os convocados para esta partida frente a Portugal lá estão os nomes de Predrag Rajkovic (guarda-redes, Maccabi Tel Aviv), Milos Veljkovic (defesa, Werder Bremen), Milinkovic-Savic (médio, Lazio), Mijat Gacinovic (médio, Eintracht Frankfurt), Nemanja Maksimovic (médio, Getafe), Aleksandar Mitrovic (avançado, Fulham) ou do benfiquista Zivkovic, todos eles parte dessa geração dourada que cruza com outras referências como os extremos Ljajic (Besiktas) e Lazovic (Génova), ou o médio do Ajax Dusan Tadic, que ainda recentemente esteve em destaque na vitória da equipa holandesa sobre o Real Madrid na Liga dos Campeões..De fora ficam alguns nomes pesados, como o ex-benfiquista Nemanja Matic, o capitão Kolarov (defesa, Lazio) ou o avançado Kostic (colega de Jovic no Eintracht Frankfurt), devido a lesões. De resto, Tadic e Mitrovic também estão a contas com alguns problemas físicos, que os deixam em dúvida até à hora do jogo. "Há muitas lesões em jogadores importantes", sublinha Jokanovic, que aponta a juventude e a inexperiência do setor recuado como o ponto mais fraco de uma seleção que "do meio-campo para a frente é muito forte, capaz de marcar golos a qualquer adversário"..E voltamos ao ponto de partida: o ataque. "Na Sérvia muita gente pergunta porque é que o selecionador não joga com dois avançados, com Jovic e Mitrovic, mas eu não acredito que ele vá jogar assim, fora de casa, contra o campeão europeu. Deve jogar em 4x3x3, quando atacar, e 4x5x1, a defender", revela Predrag Jokanovic, para quem o primeiro lugar deste grupo B de qualificação para o Europeu 2020 está "reservado para Portugal". "Sérvia e Ucrânia vão lutar pelo segundo", diz, com um aviso: "Um ponto ganho a Portugal pode ser decisivo nessa luta." E, aí, a Sérvia tem já a pressão do empate da Ucrânia na Luz, na última sexta-feira. .Sabia que....O histórico entre as duas seleções mostra que Portugal nunca perdeu frente à Sérvia, com a qual já se cruzou em duas fases de qualificação para europeus neste século (o de 2008 e o de 2016). Mas na primeira dessas campanhas os balcânicos também não perderam qualquer dos jogos contra a seleção lusa, então treinada por Scolari, com dois empates a 1-1 e um célebre murro do técnico brasileiro ao defesa sérvio Dragutinovic, para defender o "minino" Quaresma.