Santos deve manter núcleo duro mas há dois leões à espreita
A caminhada da seleção portuguesa de futebol rumo ao seu sexto Campeonato do Mundo FIFA consecutivo, que se disputa, descontando algum eventual imprevisto, entre 21 de novembro e 18 de dezembro no Qatar, começa amanhã na Cidade do Futebol, em Oeiras, quando o selecionador Fernando Santos anunciar a lista de convocados para os três primeiros jogos do Grupo A do apuramento europeu. Azerbaijão (dia 24, em Turim, casa emprestada de Portugal), Sérvia (dia 27, em Belgrado) e Luxemburgo (dia 30, na capital local) serão os adversários do campeão europeu em título nesta primeira ronda, sendo a República da Irlanda o outro rival do conjunto das quinas rumo à fase final - para a qual se apuram diretamente os primeiros classificados de cada agrupamento.
Depois de falhar a qualificação para a final four da Liga das Nações e antes de se dedicar a pensar na fase final do Euro'2020 que passou a 2021, Portugal tem um arranque relativamente tranquilo rumo ao Qatar, com duas partidas acessíveis e uma, fora, frente àquele que será, provavelmente, o principal adversário na competição pelo posto que dá acesso direto ao Mundial. Não será, todavia, provável que o selecionador faça grandes alterações no grupo para este triplo compromisso, pelo menos em relação ao que escolheu para os jogos de novembro do ano passado, mesmo que este seja o início de um ciclo para uma competição que só terá lugar no final do próximo ano.
Uma ideia que também partilham Augusto Inácio e Manuel Cajuda, embora admitindo que possam existir uma ou duas novidades na convocatória. "Não sei se ele vai fazer alterações, mas a competência do Fernando leva-me a pensar que ele vai escolher os melhores do momento para esta realidade. Acredito que ele vai manter o que continua bom do núcleo de há três, quatro anos. Mas os treinadores procuram sempre levar os melhores do momento, sem estragar o trabalho que já foi feito. Isso não dá a obrigatoriedade de manter tudo na mesma, porque todos os dias há coisas novas na nossa vida, há situações novas, há momentos de forma e a seleção sempre foi uma equipa feita para os melhores do momento e não para os melhores de determinado tempo", começou por dizer o técnico algarvio ao Diário de Notícias.
"O grosso da lista deve manter-se, o Fernando gosta de ter aquele lote consigo e depois pode existir uma ou outra nova convocatória. Mas o grosso vai andar à volta daqueles em que ele acredita, que são os que tem convocado ultimamente", concorda Augusto Inácio.
Em relação à última chamada é certo que dois nomes vão ficar de fora: Rúben Semedo lesionou-se ao serviço do clube grego e Paulinho não joga há um mês. Para os substituir, dois regressos parecem incontornáveis: Pepe e André Silva. O central de 38 anos, aliás, colheu largos elogios dos dois técnicos depois da extraordinária exibição em Turim. "Este jogo que o Pepe fez frente à Juventus mostra que ele vale por dois ou por três. Portugal tem um lote de jogadores fantásticos e o Fernando Santos tem muito por onde escolher", refere Cajuda, enquanto Inácio vai mais longe: "Foi um monstro! Houve uma altura em que estava a pedir a substituição... Mas qual substituição, tinha era de 'morrer' ali porque se saísse o FC Porto perdia! Fez um jogão para nunca mais ninguém esquecer. A dupla está formada, para mim é Pepe e Rúben Dias".
Ainda assim, o antigo lateral admite que o portista possa não fazer as três partidas. "Em jogos que obriguem a esticar muito a corrida dos centrais, o Pepe já tem alguma dificuldade. Num bloco mais baixo, aguenta-se bem, porque sabe jogar na zona, no espaço, antecipa onde a bola vai cair pela sua experiência. Se a linha jogar subida e ele tiver de fazer sprints de 25 metros, os gémeos já começam a chiar...", diz o técnico lisboeta enquanto solta uma sonora gargalhada: "Depois deste jogo com a Juventus devia estar um mês a descansar".
Já para o ataque, o dianteiro que tem estado em foco no Eintracht Frankfurt parece ser a opção óbvia. "Estou convencido que o André Silva vai ser convocado, porque se Portugal precisar de um 9 puro, de referência, ele é o único que está aí. Mas também há a hipótese de ser o Cristiano Ronaldo a jogar solto na frente. É a posição onde Portugal é mais deficiente", admite Inácio, enquanto Cajuda não vê a lesão do dianteiro leonino com apreensão: "Acha que o Paulinho é uma preocupação para o selecionador? Ele tem um valor enorme mas enquanto esteve no Braga, a fazer épocas excecionais, nunca foi preocupação...André Silva? Todos os bons jogadores serão opção para o selecionador. O miúdo do Liverpool, o Diogo Jota, por exemplo já está recuperado. E eu estou aqui para apoiar todas as decisões do meu selecionador."
Se outros jogadores que têm feito parte do percurso recente da seleção (como Rafa Silva, Pizzi ou mesmo João Mário) são também hipótese (embora atuem em posições onde a concorrência é grande), a possibilidade de surgirem nomes novos não se pode descartar, sobretudo em posições onde os habituais convocados não estão no seu melhor momento. Como sucede no lado esquerdo da defesa, pois Raphaël Guerreiro tem estado lesionado (sofreu a quarta lesão muscular da época e falhou os últimos jogos do Dortmund) e Mário Rui perdeu a titularidade em Nápoles. Sequeira (Sp. Braga) é uma hipótese e já esteve nos convocados mas os dois técnicos apostam noutro nome.
"Eu digo que o Nuno Mendes pode ser a grande surpresa desta convocatória. Ele tem 18 anos mas parece que tem 27 ou 28... Joga com uma maturidade muito grande, joga num sistema que o favorece muito. Numa defesa de três centrais é mais um ala mas já provou num sistema de dois centrais que também sabe defender, embora com propensão mais ofensiva. Mas não me admira nada que nestes jogos ele faça a sua estreia", adianta Inácio, embora admita que Fernando Santos possa resolver o problema de outra forma (até porque o jovem leão tem estado nos sub-21, que vão iniciar a disputa da fase final do Europeu da categoria). "Também pode usar o Cancelo à esquerda ou o Nélson Semedo, embora ele prefira o Cancelo. E tem o Ricardo Pereira, outro polivalente. Mas a minha aposta é mesmo o Nuno Mendes ser convocado, até porque ele tem outra coisa boa, é alto. E, às vezes, esses pormenores marcam a diferença".
Também Cajuda admite a chamada do lateral leonino, embora admita, com humor, a sua preferência por Grimaldo, "que tem aquele pequeno problema de ser espanhol". "Há uma série de jogadores que podem substituir o Guerreiro, como o Nuno Mendes, do Sporting... Eu estou mais inclinado para ser realista no futebol e os selecionadores nacionais têm montes de matéria por onde escolher e nós só temos de os apoiar."
Já João Palhinha, em grande forma no seu clube, é também uma possibilidade a não descartar, até porque dos habituais na posição 6, Danilo tem jogado pouco e William esteve lesionado e tem sido suplente no Betis. "O Palhinha merece uma oportunidade, mas acho que aquilo que o treinador vai fazer é escolher os melhores jogadores, aqueles que têm características ideias para a sua ideia de jogo", diz Cajuda, ideia com que Inácio concorda: "Se o Fernando quiser jogar só com um trinco à frente dos centrais é uma coisa e o Palhinha encaixa bem. Terá tudo a ver com a estratégia e com o modelo de jogo que quer para cada partida, cada uma tem uma história diferente e depois há jogadores que interpretam melhor uns do que outros. Nas bolas paradas, é importante ter um homem alto para defender os cantos e os livres contra junto aos centrais e aí Danilo marca a diferença. E o mesmo se passa nas bolas paradas ofensivas. Acho que a nossa equipa é um pouco baixa. Estou convencido que não vão ser sempre os mesmos a jogar no meio-campo, vão existir alterações de um jogo para o outro e além da gestão física também terá a ver com a estratégia que se pretende: um jogo mais interior, mais ofensivo ou mais de espera e contra-ataque."
Já o momento do capitão da seleção não levanta qualquer preocupação e para os dois técnicos (neste domingo respondeu às críticas pela eliminação da Juventus da Champions com três golos ao Cagliari). CR7 estará no Qatar mesmo à beira dos 38 anos, isto se Portugal se qualificar. "Sou realista e há muita gente que não está a ser. Ele tem 36 anos e querem-no como se ele tivesse 30. É enorme, continuo a pensar que é o melhor jogador do mundo e não lhe vou exigir mais do que aquilo que ele pode dar nesta altura. É bom que os portugueses se comecem a habituar que o Cristiano Ronaldo, com todo o talento que ainda tem, está a caminhar para o fim. Mas ainda é muito e dá para jogar na seleção portuguesa. E acredito que estará no Mundial de 2022, que será o último para ele", salienta Cajuda.
"Vai durar até ao Mundial, claro. Nós, às vezes, não damos o valor devido ao que as equipas portuguesas fazem. O FC Porto nos dois jogos soube explorar muito bem a maneira de o Cristiano não poder aparecer e isso é mérito do Sérgio Conceição, na forma como colocou as peças. Agora, na seleção, estou convencidíssimo que até ao Mundial é ele e mais dez. Só porque fez dois jogos maus as pessoas dizem logo que é por ele ter 36 anos. Obviamente já não tem a velocidade nem a explosão que tinha, por isso é que digo que ele não pode jogar numa das alas e tem de jogar na frente", finaliza o "confinadíssimo" Inácio.
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