Sala do trono do Palácio de Mafra restaurada pela primeira vez em 200 anos
"É possível que tenha havido algumas intervenções no princípio do século XX, mas uma intervenção desta natureza e com esta dimensão é a primeira vez", afirma o diretor do palácio, Mário Pereira, à agência Lusa.
Os andaimes colocados a quase toda a altura da sala, para os próximos cinco meses de obras, encobrem grande parte das pinturas do teto e das paredes, uma empreitada original que começou em 1804 e durou um ano, sob a direção de Cirilo Volkmar Machado, autor da pintura do teto.
Cirilo convidou Domingos Sequeira, pintor da corte e coautor das pinturas do Palácio da Ajuda, para efetuar a pintura das paredes, composta por figuras que representam as diversas virtudes.
A pintura mural é reveladora de uma longa história, a começar desde logo pela sua degradação, resultado de largos anos à luz das velas e de infiltrações na ala norte do palácio, mais exposta ao mau tempo, que levou a família real a mudar-se para a ala sul, no século XIX.
A pintura encomendada pelo então futuro rei D. João VI, ainda no final do século XVIII, e iniciada em 1804 para substituir as tapeçarias e tapetes orientais e flamengos, com que o seu avô D. João V tinha mandado decorar a sala, 70 anos antes, em 1735, e onde se mantiveram desde o fim da construção do palácio.
Além de eventuais tentativas de esboço que a limpeza e as fotografias em três dimensões podem vir a revelar, dando a conhecer mais sobre o processo da criação artística da época, as pinturas neoclássicas diferenciam-se do estilo barroco, de que o Palácio de Mafra é o monumento mais paradigmático no país, segundo o responsável.
Enquanto o Palácio é símbolo da riqueza nacional e do poderio régio, as pinturas foram encomendadas numa fase posterior, quando as forças de Napoleão Bonaparte já avançavam grande parte da Europa, para exaltar a nacionalidade, descrevendo as campanhas da Índia.
Foram o primeiro passo de uma grande campanha de decoração no interior do palácio, iniciada precisamente na sala do trono, a mais importante do palácio, onde o rei recebia os súbditos para o célebre 'beija-mão'.
Com a entrada das tropas napoleónicas no reino e a fuga do rei para o Brasil, em 1807, não só a empreitada não foi terminada, porque deixou de ser financiada pelo rei, como também as tapeçarias, quadros e mobiliário retirados da sala do trono foram levados pela família real para o Brasil, de onde não regressaram.
Inaugurado como palácio real para descanso da família real em 1735, só em 1911 veio a ser aberto ao público, depois do fim da monarquia, e musealizado nos anos 30 do século passado.
Contudo, a sala do trono só veio a abrir aos visitantes uma década depois.
As obras foram viabilizadas pelo mecenato e são financiadas pela Fundação Millenium BCP.