Rússia sofre revés no Mar Negro: cruzador 'Moskva' foi ao fundo

Russos e ucranianos têm versões diferentes do que aconteceu com o principal navio da frota russa na região, com os primeiros a falar de um incêndio cujas causas estão a investigar e os segundos a reivindicar um ataque com um míssil Neptuno.
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O cruzador Moskva, o principal navio da frota russa no Mar Negro, afundou esta quinta-feira após sofrer "danos graves" na noite de quarta-feira. Um revés para a Rússia no 50.º dia da invasão, apesar das versões diferentes de Moscovo e de Kiev sobre o que aconteceu. Os russos falam num incêndio que causou a explosão das munições a bordo, dizendo que estão a investigar as suas causas, com o navio a afundar quando estava a ser rebocado para o porto. Já os ucranianos reivindicaram a responsabilidade, alegando ter atingido o navio com os seus mísseis Neptune.

As primeiras informações sobre o que terá acontecido foram transmitidas pelo governador de Odessa, Maksym Marchenko. "Os mísseis Neptuno que guardam o Mar Negro causaram danos graves ao navio russo. Glória à Ucrânia!", escreveu no Telegram na quarta-feira à noite. Por seu lado Oleksiy Arestovych, conselheiro do presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, falava numa "surpresa" para a frota russa. "Está a arder fortemente. Agora. E com este mar de tempestade não se sabe se conseguem receber ajuda. Há 510 tripulantes", referiu num vídeo no YouTube, acrescentando: "Não percebemos o que aconteceu."

Durante a madrugada, o Ministério da Defesa russo confirmava um incidente a bordo. "Por causa de um incêndio, munições detonaram no cruzador Moskva . O navio foi seriamente danificado", indicaram, revelando que os tripulantes tinham sido retirados. Num comunicado ao final da manhã, davam conta de que o incêndio tinha sido controlado: "Não há chamas. A detonação de armamento parou. O cruzador continua a flutuar."

Medidas tinham sido tomadas para o rebocar para o porto de Sevastopol, mas durante essas manobras o navio foi ao fundo. "Quando estava a ser rebocado para o porto de destino, devido a danos no casco causados pela detonação da munição desencadeada pelo fogo, o cruzador Moskva perdeu estabilidade. Nas condições tempestuosas, o navio afundou", admitiu o Ministério da Defesa russo ao final do dia, citado pelo Russia Today.

O navio de 186 metros e 12 490 toneladas remonta aos tempos soviéticos - foi construído na atual Ucrânia e entrou em serviço em 1983 com o nome Slava (Glória) e só em 1995 foi rebatizado Moskva (Moscovo) - e foi modernizado pela última vez entre 2018 e 2020. Com a capacidade para até 680 tripulantes, foi concebido para ser um destruidor de porta-aviões e está equipado com, entre outros, 16 mísseis Bazalt - ou a versão mais recente Voulkan -, além dos mísseis Fort (versão marítima dos S-300 de longo alcance).

Depois de ter participado na guerra da Geórgia, em agosto de 2008, e depois na da Síria, a partir de setembro de 2015, o Moskva fazia agora parte da ofensiva na Ucrânia - foi a partir deste navio que foram dadas as ordens aos guardas ucranianos que estavam na Ilha Zmiinyi (ou Ilha das Serpentes) para que se entregassem, tendo estes desafiado os russos e acabado por ser capturados (inicialmente dizia-se que estariam mortos). O navio atuava a partir da cidade de Sevastopol, na península da Crimeia (anexada por Moscovo em 2014), que abriga a base da frota russa que está no Mar Negro.

"Não podemos confirmar a reivindicação ucraniana de que foi atingido por um míssil, mas também não estamos numa posição para refutar que pode ter sido um míssil ucraniano", disse um responsável do Pentágono, questionado sobre o Moskva, explicando que houve uma "explosão significativa" que desencadeou um "incêndio significativo".

O facto de o cruzador ter afundado é um duro revés para Moscovo, já que sendo o principal navio da frota do Mar Negro representava o poderio militar russo. Este é o segundo navio que Kiev alega ter destruído - o primeiro foi o navio de desembarque Saratov (inicialmente tinha-se falado no Orsk) que explodiu a 25 de março quando estava no porto de Berdyansk, no mar de Azov. O incêndio a bordo alastrou para outros navios da frota, mas Moscovo não fez qualquer comentário oficial na altura.

O incidente com o Moskva ajudará ainda mais à moral ucraniana, especialmente se for confirmado que o navio foi atingido com um míssil Neptuno. Este sistema de mísseis de defesa costeira foi desenvolvido por engenheiros militares ucranianos em resposta à ameaça russa no Mar Negro, depois da anexação da Crimeia em 2014. Tem como base os mísseis soviéticos Kh‑35. As primeiras baterias foram entregues apenas em março de 2021, segundo o Kyiv Post, que alega que os mísseis têm capacidade para destruir navios de até cinco mil toneladas num alcance de quase 300 quilómetros.

Numa altura em que as atenções se centram na região do Donbass, onde se espera uma grande ofensiva russa, Moscovo acusou os ucranianos de atacar duas localidades fronteiriças. Algo que Kiev negou, acusando por seu lado a Rússia de planear "ataques terroristas" na região da fronteira para alimentar a "histeria anti-ucraniana".

Segundo o Comité de Investigação russo, dois helicópteros ucranianos "a deslocar-se em baixa altitude, efetuaram pelo menos seis ataques a edifícios residenciais na aldeia de Klimovo", na região de Bryansk. Iam "equipados com armas pesadas". Sete pessoas, incluindo um bebé, foram feridas "em graus variáveis", disse a mesma fonte, citada pela agência francesa AFP. Klimovo, com uma população de cerca de 13 mil habitantes, fica a dez quilómetros da fronteira.

O governador da região de Belgorod, Vyacheslav Gladkov, acusou igualmente as forças ucranianas de bombardear a aldeia de Spodariushino, não tendo neste caso havido feridos. Um responsável dos serviços de informação FSB, citado pela agência russa TASS, também acusou os ucranianos de um ataque com morteiros contra um posto fronteiriço na região de Bryansk. Na altura, cerca de 30 refugiados ucranianos estariam a entrar na Rússia, mas não haverá feridos.

A Ucrânia reabriu nove corredores humanitários para facilitar a retirada de pessoas do leste e do sul do país. Além dos deslocados internos, a organização da ONU para os refugiados estima que, desde o início da invasão, 4,7 milhões de ucranianos tenham fugido do país.

No terreno, e depois de as tropas russas terem recuado das regiões em torno de Kiev, espera-se a ofensiva russa em Donetsk e Luhansk. Esta quinta-feira, pelo menos 11 pessoas terão ficado feridas em bombardeamentos na região de Donetsk, de acordo com o Ministério do Interior. Segundo o Pentágono, a chuva que tem caído no Donbass pode favorecer a defesa dos ucranianos. "O facto de o solo estar mais molhado tornará mais difícil eles [os russos] fazerem alguma coisa fora das estradas pavimentadas", indicou o oficial, citado pela AFP.

Também Kharkiv, a segunda maior cidade da Ucrânia, continua sob ataque. Segundo o governador, Oleg Synegubov, desde a invasão, pelo menos 503 civis morreram na região - incluindo 24 crianças.

Entretanto, pelo menos 30 prisioneiros de guerra ucranianos foram trocados por russos. De acordo com a vice-primeira-ministra ucraniana, Iryna Vereshchuk, 17 soldados, cinco oficiais e oito civis foram postos em liberdade. A responsável não revelou contudo quantos prisioneiros russos foram libertados ao abrigo deste acordo.

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