Roma tornou-se num pesadelo para o 5 Estrelas de Beppe Grillo
A conquista da Câmara de Roma em junho deu ao Movimento 5 Estrelas, do comediante Beppe Grillo, a oportunidade de passar das palavras aos atos. Mas o sonho de que o sucesso das suas políticas na capital italiana pudesse aumentar as probabilidades de chegar ao poder nas legislativas de 2018 está a transformar-se num pesadelo. Tudo porque a presidente da câmara, Virginia Raggi, que ganhou com um discurso anticorrupção, revelou que sabia desde julho que a sua vereadora do Ambiente estava a ser investigada pela justiça.
Paola Muraro, uma escolha pessoal de Raggi para lidar com as recorrentes crises do lixo de Roma, trabalhou durante 12 anos como consultora da empresa que gere os resíduos urbanos da cidade. Os media italianos revelaram que a vereadora do Ambiente está a ser investigada por alegadas ligações à máfia do lixo, que se alimenta dos lucrativos contratos do setor.
Numa audiência parlamentar, nesta semana, Muraro disse que sabia da investigação desde julho, tendo então informado os dirigentes do 5 Estrelas. Não disse nada publicamente porque estava à espera das conclusões do inquérito, alegando que não cometeu qualquer crime. Raggi, que sempre tinha negado saber do caso, confirmou entretanto que sabia da investigação mas mantém a confiança na vereadora.
Para piorar a situação, e depois de algumas das suas nomeações terem causado polémica, a autarca anunciou que o chefe de gabinete deverá sofrer um corte no ordenado e deixar de ter um adjunto. Mais uma saída a juntar às demissões de cinco tecnocratas, incluindo a do responsável pelas finanças de Roma, que se queixou da incompetência na nova administração. Os media italianos, que costumam ser críticos do partido de Grillo, passaram ao ataque: "Caos em Roma", escreveu o La Repubblica. "Uma revolução falhada", referiu o Il Messaggero.
E os partidos políticos não ficaram calados. "Nunca vi tantas mentiras juntas", disse o primeiro-ministro italiano, Matteo Renzi. As últimas sondagens colocam o seu Partido Democrático lado a lado com o 5 Estrelas nas intenções de voto para as legislativas de 2018, que podem vir a ser antecipadas - Renzi prometeu demitir-se caso perca o referendo sobre as alterações constitucionais, que deverá realizar-se ainda neste ano. "O Movimento 5 Estrelas não passou no teste de colisão e não tinha airbag", disse o ministro do Interior, Angelino Alfano. O líder do Novo Centro-Direita acusou o partido de Grillo de ter padrões duplos, já que exige a demissão dos seus inimigos políticos que estão a ser investigados pela justiça, mas recusa fazer o mesmo quando são os seus próprios aliados em risco.
"Os procuradores vão decidir se foi cometido um crime ou se o caso deve ser arquivado. Não os partidos ou os jornais. Entretanto, Muraro deve continuar a trabalhar para limpar a cidade. E que isto seja o fim da controvérsia", escreveu Raggi no blogue de Grillo. A autarca garantiu que caso se prove que houve comportamento ilícito, agirá em conformidade. "Nunca fizemos descontos a ninguém nem vamos fazer."
Raggi explicou que o 5 Estrelas está a "incomodar" algumas pessoas mas não será travado. "Estou a dedicar-me à cidade, de corpo e alma. Somos cidadãos que fomos chamados para reconstruir a cidade após 30 anos de gangrena causada por um sistema político corrupto", explica, dizendo que tem os "ombros largos" e não tem "medo".
Depois de algumas críticas internas, o líder do Movimento 5 Estrelas saiu em defesa da autarca: "Eu estava à espera de muito pior", disse Grillo. "Estava à espera de ser posto sob investigação ou que cinco quilos de cocaína fossem encontrados no meu carro", acrescentou. "Verdade e humildade tornam-nos mais fortes do que antes", escreveu o vice-presidente da Câmara dos Deputados, Luigi di Maio, apontado como provável candidato a primeiro-ministro. "Diálogo com pessoas honestas é o que move este projeto. Eles não nos vão travar."