"O tenista mais perfeito que o jogo já viu e provavelmente irá ver em muitos anos", segundo Gastão Elias, escolhido para adversário de treino durante duas semanas no Mónaco em 2007. Roger Federer está sem competir há um ano (derrota na meia-final do Open da Austrália 2020, em janeiro). Fez duas cirurgias ao joelho direito e voltaram as especulações sobre o fim da carreira. O suíço desmente-as e projeta o regresso para os torneios pós-Melbourne. Uma fera competitiva, o homem nascido a 8 de agosto de 1981 em Basileia só voltará se puder aumentar o inigualável palmarés. Disputa a mais longa final da carreira.."Deve estar a chegar à conclusão de que vai regressar muito abaixo do seu nível. Mas se vai voltar? Vai. Não vai acabar assim a carreira, mas se nos primeiros tempos não correr bem, pode desistir", analisa Gastão Elias, ele próprio agastado com algumas lesões que o fizeram perder a carruagem principal do ténis, para onde quer voltar..Elias, atualmente na posição 409 do ranking ATP, longe do melhor lugar (57.º em outubro de 2016), faz a sua análise com dados que poucos tenistas profissionais detêm. "Ao longo dos anos, treinei várias vezes com ele", relembra.."A experiência aos 16 anos [2007] foi um pouco diferente. Fui escolhido para ficar duas semanas com ele no Mónaco, pela nossa agência, que na altura era a mesma, porque estava a ter bons resultados a nível júnior. Partilhei campo todos os dias, várias vezes por dia", recorda.."Aprendi mais a ver como ele jogava do que a treinar. O que me chamou a atenção foi a intensidade do treino físico e a maneira dele treinar. Em todos os treinos integrava o treino físico com o ténis. Nunca tinha visto ninguém treinar com sprints intermitentes na lateral do campo, antes de pegar na raquete e jogar três pontos seguidos", sintetiza da experiência.."Mentalmente, foi muito interessante. Este tipo de combinações de exercícios força-te a ficar lúcido mesmo sem oxigénio. Impressionou-me. E faz muito sentido, porque os erros não forçados vêm da falta de oxigénio no cérebro", conclui o tenista..João Zilhão, diretor do Estoril Open que teve de fazer muitos contactos para trazer Federer a Portugal (antes, fora o braço direito do anterior diretor, João Lagos), não está convencido de que Roger Federer pendure a raquete em breve. Por várias razões, das competitivas ao pós-profissionalismo.."Todos os anos, a partir dos 35/36 anos, se diz que é o último. Mas ainda em 2019 esteve perto de ganhar mais um Grand Slam: serviu dois match points em Wimbledon frente ao Djokovic", argumenta Zilhão, referindo-se à final mais longa da história, quase cinco horas, a primeira de Wimbledon decidida num tie-break que caiu para o sérvio.."Teria sido o mais velho a ganhar um Grand Slam [KenRosewall detém esse registo, ao vencer o Open da Austrália aos 37 anos, um mês e 24 dias]. Ainda assim, ganhou aos 36 anos e cinco meses ( Open Austrália 2018)", o último Grand Slam até à data do currículo de Federer.."O Roger tem uma imagem intocável. Para os muito sponsors, dentro e fora dos courts, mas também para os adeptos. O público está maioritariamente a torcer por ele e ganha consecutivamente o Fan Favourite do ATP [como o de 2020, anunciado a 19 de dezembro]", introduz João Zilhão. "Conheci-o em 2007, quando negociei a vinda dele ao Estoril Open. E estive com ele em 2008, durante a semana em que cá competiu e ganhou. Voltei a estar com ele em 2010, quando perdeu nas meias finais. E vamo-nos encontrando nos grandes torneios", pontua o diretor do Estoril Open.."O Roger enche uma sala. Muito educado e cordial, tem um bom sentido de humor, é muito divertido. Um encantador", prossegue no retrato. E o ténis? "Se tivesse que se fazer um livro a explicar como se joga ténis, era com imagens dele a jogar", dispara na mesma direção do argumento do "mais perfeito tenista" avançado por Gastão Elias..Concentrado na reabilitação física após duas intervenções cirúrgicas ao joelho direito em 2020, Roger Federer joga, portanto, a mais longa final da carreira. E, segundo o próprio, não o final da carreira. Perto dos 40 anos (a 8 de agosto), estuda o calendário de fevereiro e março para perceber se e quando volta..Federer desistiu do Open da Austrália - foi adiado um mês devido à pandemia e começa dia 8 de fevereiro - e deu lugar no quadro principal ao português Pedro Sousa. Apesar de falhar o evento australiano pela primeira vez na carreira (desde 1999), o empresário, Tony Godsick, garantiu que o suíço voltará depois do Grand Slam australiano..Interessados não faltam.Neste momento, os organizadores do torneio ATP 500 de Roterdão, na Holanda, alimentam a esperança de acolherem o regresso de Federer. Adiado três semanas devido à pandemia, a prova só começa a 1 de março. "Ele já sabe com certeza que só poderá jogar daqui a cinco ou seis semanas. O nosso torneio é daqui a oito semanas e à melhor de três sets. Estamos a aguardar uma chamada do empresário dele. Com o Federer é sempre necessário esperar", anunciaram os responsáveis pelo torneio holandês, que o suíço venceu três vezes, em 2005, 2012 e 2018..Depois do título na Austrália, em 2018, subiu ao olimpo do ténis, alcançando o 20.º Grand Slam(entretanto, igualado por Nadal e o seu 13.º Roland Garros, em 2020)..Mas Federer, mais velho cinco anos do que o maiorquino (número 2 mundial) e seis do que Djokovic (número 1), soma 103 títulos na carreira, perseguindo o recorde de Jimmy Connors: 109. Os principais rivais somam 87 (Nadal) e 81 (Djokovic). Tal como o americano (7 Grand Slam), Federer é uma máquina de potência e resistência; se Connors jogou até aos 44 anos, Federer parece disposto a chegar pelo menos aos 40 na alta competição..Apesar de ter somado a segunda época sem títulos desde 2001, num ano (2020) em que só fez seis jogos num torneio (caiu nas meias-finais frente a Djokovic), Federer sentirá que ainda pode adiar a provável ultrapassagem nos Grand Slam por Nadal (20 títulos, 34 anos de idade) e Djokovic (17, 33 anos)..O ano de 2020 parece-se muito com o de 2016, também marcado por lesões que o afastaram dos courts. E em 2017 ganhou cinco torneios, dois deles do Grand Slam (Austrália e Wimbledon)..Mas então tinha 35 anos, agora encaminha-se para os 40. Por tudo isto, 2021 é a mais longa final do tenista suíço. Porque terá de se sentir forte física e psicologicamente para enfrentar o ténis forte e rápido dos rivais. Mas, sobretudo, porque terá de se sentir pelo menos ao mesmo nível dos melhores. Ganhar é a única coisa que faz sentido para um campeão deste nível..Além disso, terá de estar no topo da forma para enfrentar a concorrência, que vai além do número um (Djokovic) e 2 (Nadal): há fortes contendores na luta pelos maiores torneios mundiais em Dominic Thiem (3), Daniil Medvedev (4) e em Stefano Tsitsipas (na posição 6, logo a seguir ao suíço, 5.º)..Se Federer é o melhor tenista de todos os tempos? É um tema polémico: perdeu mais duelos do que ganhou a Djokovic e Nadal, etc.. Mas "o tenista mais perfeito" parece assentar-lhe com naturalidade, quando os especialistas analisam cada jogador nas suas várias dimensões: pancada de direita, de esquerda, jogo de pés, no fundo do court, subida à rede, serviço... E, sublinha Elias, não é o melhor e mais perfeito em todas; mas o mais perfeito no somatório de cada uma delas..Em 2021, vamos ouvir falar muito de Federer. Falta saber se é por quebrar mais recordes vitoriosos.