Robert Redford.Os 80 anos de um ator e realizador com obra admirável

O também criador do Festival de Sundance nasceu a 18 de agosto de 1936. Uma viagem a uma vida longa e rica
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Há poucos dias, reencontrámos Robert Redford em A Lenda do Dragão, fábula clássica agora refeita pelos estúdios Disney. O certo é que, para muitos espectadores, ele continua a ser o símbolo de aventuras como Dois Homens e Um Destino (1969) ou a figura impecavelmente elegante de O Grande Gatsby (1974). Em boa verdade, a vida deste ator que, no começo dos anos 60, parecia destinado a uma carreira mais ou menos televisiva já envolveu alguns títulos míticos da história de Hollywood, uma coleção de filmes muito pessoais como realizador, até mesmo a criação de um dos mais importantes festivais de cinema do mundo - nasceu a 18 de agosto de 1936, em Santa Monica, Califórnia, o que quer dizer que faz hoje 80 anos.

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Se é verdade que o cliché de "figura sedutora" condicionou a carreira de muitas atrizes, não é menos verdade que alguns homens não têm ficado imunes aos efeitos de tal classificação. Redford começou por triunfar através desse cliché, em ambiente de comédia romântica, curiosamente a partir de um sucesso teatral: a peça Descalços no Parque, de Neil Simon, em que contracenava com Elizabeth Ashley. Com a respetiva versão cinematográfica, dirigida por Gene Saks em 1967 (com Jane Fonda a substituir Ashley), Redford parecia destinado a tornar-se uma reencarnação do modelo mais tradicional de estrela.

Alguns dos momentos marcantes da sua trajetória são indissociáveis dessa aura romântica que, afinal, tão bem encarnou em O Nosso Amor de Ontem (Sydney Pollack, 1973), O Grande Gatsby (Jack Clayton, 1974) ou África Minha (Pollack, 1985), contracenando com Barbra Streisand, Mia Farrow e Meryl Streep, respetivamente. Em qualquer caso, desde muito cedo, apostou em diversificar a sua imagem, surgindo em obras tão ousadas como O Vale do Fugitivo (1969), de Abraham Polonsky, um dos mais notáveis exemplos da revisão crítica da história do Oeste empreendida ao longo das décadas de 60-70.

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Três filmes seriam fundamentais para cimentar a pose de um "outro" Redford. Dois deles sob a direção de George Roy Hill, definindo uma dupla de sucesso com Paul Newman: Dois Homens e Um Destino (1969), o célebre Butch Cassidy and the Sundance Kid, retrato de dois salteadores do velho Oeste tecido de ironia e tragédia, e A Golpada (1973), variação sarcástica sobre as clássicas histórias de gangsters (em números atualizados pela inflação, continua a ser o maior sucesso de bilheteira de toda a carreira de Redford, ocupando o 20.º lugar na lista dos filmes mais rentáveis de sempre nas salas dos EUA). O terceiro título, Os Homens do Presidente (1976), de Alan J. Pakula, abordando o caso Watergate e a queda de Richard Nixon, é um dos exemplos mais sofisticados da dimensão política do melhor cinema de Hollywood.

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Psicanálise americana

Com uma postura política liberal, sempre sensível aos valores individuais no interior das dinâmicas coletivas, não admira que a trajetória de Redford como realizador envolva uma complexa análise (apetece dizer: psicanálise) das convulsões da sociedade americana. Logo na sua estreia, com Gente Vulgar (1980), conseguiu arrebatar o Óscar de melhor realização, com o filme a ser consagrado também como o melhor do ano. A memória cinéfila não esquece que esse foi um ano de títulos fora de série como O Touro Enraivecido (Martin Scorsese) ou O Homem Elefante (David Lynch); em todo o caso, Gente Vulgar desmonta, com cruel precisão, as ilusões e desilusões dos tradicionais valores familiares made in America, para mais integrando no seu elenco, no papel de uma mãe dilacerada, a admirável Mary Tyler Moore, atriz cuja popularidade estava alicerçada em papéis televisivos incomparavelmente mais ligeiros.

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Sendo Redford um ator de muitas e delicadas nuances, avesso a registos ostentatórios, não admira que o seu trabalho de realizador esteja pontuado por algumas invulgares interpretações, incluindo de principiantes. Assim, em Duas Vidas e Um Rio (1992), evocação nostálgica da pesca no estado de Montana, deu a Brad Pitt um dos seus primeiros papéis importantes; mais tarde, em O Encantador de Cavalos (1998), talvez o filme em que, participando também como ator, mais se reaproxima da sua mitologia de herói romântico, dirigiu a principiante Scarlett Johansson, então com apenas 14 anos. Isto sem esquecer a colaboração com nomes consagrados, como acontece no prodigioso Peões em Jogo (2007), por certo um dos filmes mais desencantados que já se fizeram sobre o envolvimento militar dos EUA no Médio Oriente - o próprio Redford lidera um elenco que inclui Meryl Streep, Tom Cruise e Andrew Garfield (antes da sua fama como Homem-Aranha).

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Foi o conhecimento das muitas vias de produção do cinema americano que levou Redford, em 1978, à criação do Festival de Sundance, em Salt Lake City, no estado do Utah, consolidado, três anos mais tarde, com o Instituto Sundance. Já há muito com dimensão internacional, os seus objetivos fundamentais são a divulgação do cinema independente e a exploração de alternativas de produção aos grandes estúdios. O nome provém da personagem interpretada por Redford em Dois Homens e Um Destino: Sundance Kid.

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