Republicanos sonham com museu dos centros escolares
Os Centros Escolares Republicanos surgiram na sequência do desenvolvimento associativo europeu para responder aos problemas sociais das cidades. Cidades que tinham crescido significativamente com os grandes fluxos migratórios vindos do campo e Portugal não fugiu à regra, relatam os historiadores. No final da 1.ª República existiam 130 centros no país, 30 dos quais em Lisboa. A grande diferença com as outras associações é que estes centros tinham como vertente a educação.
Em 1986, contabilizaram 33 centros republicanos com escolas em Portugal, "a maioria deles situados em Lisboa e de forte inspiração maçónica", refere Oliveira Marques. Hoje, serão uma dezena e o Centro Escolar Republicano Almirante Reis é dos poucos que mantém a estrutura inicial, não só do ponto de vista arquitetónico como no funcionamento.
Localizado no Martim Moniz, junto à avenida Almirante Reis, que lhe dá o nome, tem duas saídas como todos os outros centros. Isto, para facilitar a fuga em caso de serem surpreendidos pelas autoridades. Este tem a saída principal para a rua do Benformoso e a das traseiras para a do Terreirinho. O almirante Reis (Carlos Cândido Reis) suicidou-se no dia anterior à revolução de 5 de Outubro de 1910, julgando que tinha falhado o golpe revolucionário que levaria à proclamação da República.
Além da sala de aulas original, tem uma biblioteca e um pátio interior, onde até se disputava o "jogo da amarelinha". Este é um dos argumentos para ali construírem um museu que concentre todo o espólio destas instituições: bandeiras, documentos, fotos, móveis e objetos, muitos deles verdadeiras raridades, como é o caso das primeiras urnas de voto.
Os Centros Escolares Republicanos eram fundados nos bairros citadinos com o objetivo de prestar apoio à comunidade, sobretudo na sua educação e formação, distinguindo-se dos centros republicanos, cujo fim era político.
"Independentemente do voluntarismo e da improvisação que se possam entrever na sua criação, a sincera adesão e mesmo militância pela causa da instrução e da alfabetização de muitos dos seus fundadores e sócios, solidamente ancorados no bairro em que viviam, foram certamente um dos fatores de sucesso da ação dos centros escolares republicanos", lê-se num documento da Secretaria-Geral do MInistério da Educação e CIência.
Além de terem um papel de alfabetização, "pretendia-se retirar da rua as crianças em risco e promover a sua regeneração física, através da alimentação e da habituação a práticas de higiene, inexistentes na família (Dicionário de História da I República e do Republicanismo, vol. I, pp. 624-628)".
Eram organizações privadas de natureza associativa, sem fins lucrativos, regulamentados pela lei de 14 de Fevereiro de 1907. Viviam das quotizações e doações dos sócios, o que continua a acontecer com os que resistem. Viveram a "época de ouro" com a 1.ª e República, até 28 de Maio de 1926.
Depois instalou-se o Estado Novo e, com ele, o período mais difícil da sua história, servindo as suas instalações para as reuniões da oposição a Salazar e a Marcelo Caetano. Com o Estado Novo "veio o ensino único, a separação de sexos, onde a ordem, a religião e a família eram os vetores centrais da educação dos jovens", escreve Maria Helena Correia. A configuração máxima desse objetivo está na criação da Mocidade Portuguesa.
Mas os centros escolares republicanos continuaram a marcar a diferença num país analfabeto e conservador. Mantiveram as classes mistas e o ensino laico. Defende Maria Helena Correia: "Os seus fundadores eram cidadãos que, além de aspirarem a uma mudança de regime, desejavam construir cidades novas, onde as crianças e seus pais pudessem alcançar uma base de instrução essencial: ler escrever e contar. Os métodos utilizados eram aqueles usados na Europa mais desenvolvida, baseado na moderna psicologia infantil". À semelhança do que acontecia com as escolas João de Deus.