Remodelar a matriz antes do próprio governo

Publicado a
Atualizado a

O governo está a jogar nos limites das regras do jogo. Persistem dúvidas sobre as fronteiras da lei da proteção civil e, acima de tudo, instalou-se a polémica com a decisão do recolhimento obrigatório por causa da pandemia. O governo garantiu ontem ao DN que o incumprimento pode levar a cerca de ano e meio de prisão ou multa.

Visa esta medida limitar a circulação ou limitar a liberdade? O que está aqui em causa? Os constitucionalistas ainda não serenaram quanto a este tema. Como afirma Tiago Duarte, constitucionalista, esta medida está nos "limites do fora de jogo".

E o vírus só circula à noite? Porquê limitar sair de casa após as 23 horas quando o que importa é atuar perante os aglomerados, como por exemplos festas e jantares com elevado número de pessoas?

O governo usou uma linguagem suave na apresentação das medidas (na conferência de imprensa após o conselho de ministros da passada quinta-feira) quando estão em causa crimes de desobediência, quer no caso de incumprimento do recolher obrigatório quer na entrada ou saída da Área Metropolitana de Lisboa ao fim de semana. Os portugueses precisam de saber as regras das quatro linhas, de forma clara e usando uma comunicação eficaz, para não ficarem precisamente "fora de jogo".

Perante uma pandemia que avança, de novo, em grande velocidade, vai o governo manter a matriz de avaliação? Uma parte do executivo já admite que poderá ser revista este verão. Fora do poder político, vários especialistas e ex-governantes pedem que essa alteração seja realizada o quanto antes. Adalberto Campos Fernandes, ex-ministro da Saúde, é uma das vozes críticas em relação ao tema. Acusa Governo de "teimosia" e defende a redefinição da matriz de risco. A existência da vacinação e o número de doentes recuperados exigem um novo quadro de avaliação, considera. O ex-governante é também crítico no que toca ao recolhimento obrigatório e defende que coloca em causa o Estado de Direito.

Muito se tem falado de uma remodelação do governo - tema aqui trazido a este editorial há meses, com a previsão do respetivo calendário -, mas o primeiro-ministro e o ministro dos Negócios Estrangeiros já vieram desmentir tal alteração, que implicaria substituir várias cabeças no executivo.

Face à pandemia, antes de qualquer alteração no executivo, António Costa vai ter, certamente, de se preocupar e ocupar primeiro com a revisão da matriz de risco. A economia poderá precisar de um novo instrumento para não voltar aos cuidados (ainda mais) intensivos.

Diretora do Diário de Notícias

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt