Regras da ONU fazem adiar nova missão dos Comandos

Interpretação das normas sobre abusos sexuais por capacetes azuis obriga a substituir seis militares acusados na morte de dois recrutas.
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Os 13 recrutas que amanhã terminam o curso de Comandos não sabem quando vão receber a boina e o crachá, que iria coincidir com a cerimónia, agora adiada, de entrega do estandarte nacional ao novo contingente a enviar para a República Centro Africana (RCA). A partida desta força foi adiada por um mês, confirmou ontem o Exército.

Em causa está a interpretação legal, que algumas fontes consideraram restritiva, das normas das Nações Unidas - criadas após a ocorrência de abusos sexuais por capacetes azuis - que impedem o envio para missões da ONU de militares envolvidos em processos judiciais - situação em que estão seis dos 19 militares comandos acusados pelo Ministério Público na morte de dois recrutas do curso iniciado em setembro passado.

Note-se que o mais graduado dos militares acusados, coronel Dores Moreira (por falsificação, abuso de autoridade e insubordinação), foi agora nomeado chefe do Departamento de Ciências Militares da Academia Militar, onde se formam os oficiais do Exército.

O DN não conseguiu confirmar de quem partiu essa interpretação legal da medida referida pelo Ministério Público no seu despacho de acusação. Certo é que, quando o Exército analisou o caso há algumas semanas, o então comandante operacional do ramo declarou-se contrário à substituição dos seis militares - três oficiais, dois sargentos e um praça - daquele contingente.

O tenente-general Faria Menezes explicou ontem ao DN que, na sua opinião, a posição expressa pelo Ministério Público "proíbe os militares de exercer a sua profissão" e, na prática, isso corresponde a "uma medida de coação" que não foi decretada por um juiz.

Acresce que retirar aqueles seis soldados do novo contingente dos Comandos para a RCA atrasa o envio da força. Tal deve-se à necessidade de os substitutos fazerem o aprontamento para integrar a força que esteve a treinar no último meio ano com aquele objetivo.

Quem questiona a validade deste argumento para justificar o atraso no envio da força para a RCA é Miguel Machado, tenente-coronel paraquedista na reforma e autor do site digital Operacional (especializado em assuntos de Defesa), questionando a ausência de pessoal de reserva capaz de substituir de imediato alguma desistência (razões de saúde ou familiares, por exemplo).

Miguel Machado foi uma das fontes a interrogar-se sobre se esta demora não reflete a falta de pessoal no Regimento de Comandos, visível no reduzido número de recrutas que termina o primeiro curso deste ano da especialidade (23% dos 57 que o iniciaram) e, mais do que provável, na necessidade de enviar paraquedistas na próxima rotação.

Isto foi admitido pelo major-general comando Raul Cunha (na reserva), para quem "é preocupante" o Exército só conseguir ter duas das três companhias de Comandos - sendo preciso rever "o esforço de recrutamento" e retenção, frisou.

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