Referendo à regionalização avança mesmo apesar das reservas de Marcelo

Executivo firmemente decidido a avançar com referendo à regionalização já em 2024. É uma reforma a que Marcelo Rebelo de Sousa sempre se opôs - uma oposição que já vem dos tempos em que liderou o PSD.
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Estava prometido, foi agora transposto para o Programa de Governo - e pode vir a tornar-se num foco de problemas na coabitação entre o Presidente da República e o primeiro-ministro.

O compromisso consta na página 44 do Programa de Governo, ontem entregue na Assembleia da República: "Criar as condições necessárias para a concretização do processo de regionalização, mediante a realização de um novo referendo em 2024".

O tema é potencialmente criador de problema visto que não é de hoje nem de ontem - é mesmo de sempre - a resistência do Presidente da República à regionalização. Na legislatura 1995-1999, sendo líder do PSD, foi Marcelo Rebelo de Sousa quem conseguiu, negociando com o primeiro-ministro socialista de então, António Guterres, impôr um referendo à regionalização, referendo este que, pelo seu resultado, travou por décadas esta reforma administrativa do Estado. E foi também Marcelo, nessa altura, quem conseguiu pôr na Constituição que não se pode fazer a regionalização sem antes se referendar o mapa e o modelo de competências - algo que agora o Governo de António Costa promete para daqui a dois anos.

Neste capítulo, da descentralização e desconcentração dos serviços públicos, o Governo promete ainda outra coisa: acabar com organismos como as administrações regionais de Saúde ou as direções regionais de Educação. A promessa consta na linha seguinte à que promete o referendo em 2024: "Harmonizar as circunscrições territoriais da Administração desconcentrada do Estado e proceder à integração nas CCDR dos serviços desconcentrados de natureza territorial, designadamente nas áreas da educação, saúde, cultura, ordenamento do território, conservação da natureza e florestas, formação profissional e turismo".

O Governo pretende ainda lançar outra reforma: "a revisão do atual sistema da classificação estatística regional NUT [acrónimo de "Nomenclatura das Unidades Territoriais para Fins Estatísticos]". Ora é esta nomenclatura que, em parte, define os fundos comunitários disponíveis para cada região. Assim, irá promovers-se a "criação de duas novas regiões nuts II, correspondentes à Península de Setúbal, que integrará os concelhos ao sul do tejo da atual NUT II de Lisboa, e a do Oeste e Vale do Tejo, que integrará as atuais NUTS III do Oeste, do Médio Tejo e da Lezíria do Tejo, dando maior coerência ao atual sistema de classificação e fazendo-o corresponder às dinâmicas económicas e sociais registadas"

Ontem, ficou a cargo da ministra da Presidência, Mariana Vieira da Silva, a conferência de imprensa de apresentação do Programa de Governo.

Como se esperava, a ministra foi novamente interpelada pelos jornalistas quanto à ideia, avançada pelo Presidente da República na tomada de posse do atual Governo, de o primeiro-ministro António Costa poder em 2024 trocar o Governo por cargo na Europa. "O Governo tomou posse para uma legislatura que dura quatro anos e seis meses e os compromissos que assumimos aqui no Programa do Governo são para essa duração, e o Governo como um todo compromete-se a estes compromissos que aqui estão até 2026. As respostas são dadas quando as perguntas existem. E para o Governo a questão que me colocou não é uma questão", respondeu. Marcelo Rebelo de Sousa, pelo seu lado, também se escusou a fazer mais comentários. "Já não digo mais nada sobre essa matéria. Sei que querem perguntar pela enésima vez a questão mas eu já disse o que tinha a dizer."

No Parlamento, a oposição reagiu rapidamente, sendo o tom geral de crítica. Duarte Pacheco, do PSD, considerou que o Executivo continua "sem espírito reformista para resolver os problemas estruturais". Já para o PCP (Paula Santos), o Governo "opta pelas mesmas ideias políticas que teve até aqui" e portanto "não responde aos problemas das pessoas e do país". Também o BE (Pedro Filipe Soares) considerou que "este programa não responde à realidade que o país está a enfrentar". Igualmente crítico foi João Cotrim Figueiredo (Iniciativa Liberal): "O Governo não faz ideia de como meter o país a crescer".

Ontem apresentado, o Programa de Governo será discutido no Parlamento nos próximos dias 7 e 8.

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