Reabilitação
Num país tão endividado, não causa espanto que esta ou aquela câmara municipal tenha dívidas. Afinal, quem não tem dívidas? No continuado país relativo, que tanto daria para alimentar a pena do saudoso O'Neill, mais ou menos dívida, que importa...
Na campanha eleitoral autárquica não quisemos saber da assombrosa dívida do município de Lisboa: mais de mil milhões de euros!... Fez-se uma campanha centrada na habilidade do insulto e da propaganda sem disponibilidade para discutir a cidade. Falou- -se de muitos sonhos e promessas, pouco das realidades sombrias, das limitações orçamentais, da hipoteca gigantesca em que Lisboa se afunda. O mais espantoso é que ainda hoje a administração camarária não confronta a cidade com o grande combate à hipoteca. A dívida é relativizada. O grande ministério de Lisboa vai alienando património e apostando na construção civil. Não é original. Mas, face ao garrote orçamental, a cidade precisa de um programa de emergência. Os projectos adiados adiados continuam, o marasmo apenas é quebrado pelas lutas palacianas por lugares ou gabinetes.
A governabilidade da Câmara de Lisboa ficou seriamente afectada depois de quebrado o acordo entre o PSD e o CDS. Nada obriga à antecipação de eleições. Passou pouco mais de um ano de mandato e, afinal, há tantas autarquias sem maiorias estáveis. O que diferencia o concelho de Lisboa é a dimensão dos seus problemas e a extrema precariedade política e orçamental do município.
O debate sobre a reabilitação da Baixa-Chiado, a partir do trabalho obviamente questionável de um grupo liderado pela vereadora Maria José Nogueira Pinto, tem sido útil para fortalecer a exigência de uma qualidade de vida urbana que Lisboa perde todos os dias. E, quando se pensava que este debate interessava ao elenco camarário, eis que o projecto serve apenas como arma de arremesso para ciúmes e vaidades.
A crise política que envolve o elenco camarário - e não é apenas entre PSD e CDS, os socialistas estão também divididos - corre o risco de paralisar a já muito condicionada administração da capital. Com eleições antecipadas ou sem elas, Lisboa precisa de um programa de emergência que a liberte com racionalidade do garrote financeiro e das lutas palacianas. Há demasiados escândalos a envolver os negócios camarários e pouco escrúpulo político. Nesta altura, mais do que a Baixa, é a Câmara de Lisboa que precisa de reabilitação.