Raquel Tavares diz do seu primeiro disco que é o culminar de 15 anos de carreira. Nada de invulgar, não fosse o caso de a fadista ter apenas 21 de idade. Mas a verdade é que toda a sua história, contada na primeira pessoa, se traduz numa cronologia de acontecimentos precoces. Após a estreia de há uma semana no ciclo Canções Urbanas, Novos Talentos, no Teatro São Luiz, em Lisboa, a mais recente inscrição no volumoso catálogo das novas revelações do fado inicia hoje, na Fnac do Chiado, um breve roteiro de espectáculos em formato showcase para apresentar o álbum de estreia..Comecemos então por essa veloz biografia. Diz Raquel que começou a cantar com seis anos "o fado amador, aquilo a que se costuma chamar fado vadio, nas colectividades, nos rastaurantezinhos, nos guetos de Alfama". E aí fez escola na noite, até aos 14 anos, altura em que venceu a Grande Noite do Fado. Depois, recorda, esteve três anos sem cantar. "Porque me zanguei com as pessoas", justifica, que isto de "começar na noite muito cedo tem esse problema de crescermos depressa demais, de não termos tempo para nos iludirmos. E aos 14 anos achei que as pessoas não agiam da forma mais correcta comigo. Fiquei triste, disse que não cantava mais. Mais isso não serve quando temos o bicho, algo que nasceu connosco. Aos 17 anos senti um vazio, precisava de alguma coisa. E isso era o fado.".A questão inevitável é esta: pode alguém cantar fado na verdura imberbe da sua adolescência? "Sim", garante Raquel, "sem dúvida". Porque o fado, acredita piamente, é fatal como o destino. "Quem nasce, tarde ou cedo vai descobri-lo. Porque cantar fado é uma descoberta de algo que já lá está. Aos 15 ou aos 30 anos, tanto faz. É alquimia, não se explica. Por isso nem sequer faz sentido ter vaidade em ser fadista. Porque acontece assim, é-nos inevitável, aperfeiçoa-se mas não se aprende.".E é com esse sentido quase religioso que a jovem olha para o fado e apresenta o disco de estreia. No homónimo Raquel Tavares acha-se uma colecção de temas compostos para a sua voz, a maioria de créditos divididos entre o omnipresente Jorge Fernando e do jovem Diogo Clemente, talento compositor, jovem da mesma idade. "E este disco é também o culminar de uma história que não é só minha, que é também deles. Sou uma privilegiada por ter a escrever para mim duas pessoas que me conhecem tão bem.".O resultado desta teia de cumplicidades, garante a fadista, é um disco que, "sendo de fado tradicional, não é purista. Como eu". Um disco "pensado durante dois anos: assinei contrato com a Movieplay aos 18 anos, só gravei aos 20. Tinha voltado a cantar há pouco tempo e quando o Jorge Fernando me convidou eu estava muito insegura", justifica. "Precisava de saber mais, procurar perceber o que o público queria ouvir e o que eu queria cantar." Procurou nas casas do Bairro Alto, no restaurante dos Ferreiras, no Café Luso, nas Arcadas do Faia, na Adega Mesquita, no Senhor Vinho, na Casa de Linhares e em todas as capelinhas onde foi amadurecendo a voz noites a fio. Aos 21 anos, diz que encontrou. E que está tudo aqui, neste disco.