Na última década, em grande parte graças à aposta nos cursos profissionais, Portugal evoluiu muito no desafio de levar cada vez mais alunos a estudarem pelo menos até aos 18 anos. Na faixa etária dos 15 aos 19 anos, o país supera mesmo as médias da OCDE e da União Europeia, com 91,25% dos alunos na escola. Mas esta via alternativa não tem alcançado o mesmo sucesso quando se trata de motivar os estudantes a darem o passo em frente: apesar dos esforços para desenvolver "pontes" entre secundário e superior, nomeadamente com os cursos técnicos superiores profissionais (TeSP), entre 70% e 75% de quem passa pelas ofertas profissionalizantes do secundário acaba por não prosseguir estudos. Uma realidade que universidades e politécnicos querem ver mudada, através de compromissos entre as diferentes forças políticas para melhorar a articulação entre o básico e secundário e o superior.."Diria que há uma realidade dual", diz ao DN Pedro Dominguinhos, presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCISP). "Nas vias científico-humanísticas, 80% a 90% dos alunos prosseguem para o ensino superior. Onde temos um caminho a fazer ainda mais é nos alunos que terminam o ensino profissional. Precisamos de ter mais a chegar ao ensino superior..A aposta nos TeSP, formações superiores de dois anos que não conferem um grau mas permitem prosseguir estudos, cuja oferta se concentra essencialmente nos politécnicos, tem cumprido as expectativas. Até superado, defende. "No âmbito do compromisso assinado com o Ministério do Ensino Superior, os politécnicos definiram um total de 20 mil novas entradas nestes cursos até 2020 e já ultrapassámos as 21 mil", confirmou. Mas o mesmo não sucedeu com o ingresso direto em licenciaturas de alunos vindos de cursos profissionais do secundário, o qual "tem vindo a estagnar já há alguns anos"..Em termos globais, de acordo com dados da OCDE trabalhados pela analista de políticas para o ensino superior desta organização, Cláudia Sarrico, cerca de 60% dos jovens portugueses ainda se lançam no mercado de trabalho sem qualificações superiores. "A instrução dos portugueses sempre esteve uns graus abaixo dos países europeus e, apesar das melhorias, Portugal tem taxas de qualificação baixas", confirma a investigadora num comunicado divulgado pelo CRUP. A percentagem dos portugueses entre os 25 e os 34 anos com curso superior passou de 21% para 34% em dez anos. Ainda assim, apenas Itália (28%), Hungria (30%) e Alemanha (31%) têm menos diplomadas nesta faixa etária..Barreira à transição para cursos superiores.No caso da Alemanha, por exemplo, as baixas percentagens relacionam-se com um sistema educativo que desde cedo encaminha parte dos alunos para vias profissionalizantes das quais é depois difícil prosseguir para o ensino superior. E Portugal poderá estar perante uma barreira semelhante com os cursos profissionais. "A massificação do ensino secundário deve-se também aos cursos profissionais, que estão desenhados para a inserção imediata no mercado de trabalho", diz Cláudia Sarrico. "Há um problema de transição. Esses alunos não estão preparados para o acesso ao ensino superior, daí que a quase totalidade não o faça.".Para António Fontainhas Fernandes, presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), não restam dúvidas de que "tem de existir uma melhor articulação entre o básico e secundário e o ensino superior". No entanto, até porque a procura de estratégias para trazer mais alunos ao superior é precisamente o tema da Convenção do Ensino Superior, que hoje tem início em Lisboa, este prefere "não formular ideias" sobre as estratégias a adotar, deixando-as para os "estudantes e representantes dos diferentes partidos políticos" que são esperados neste encontro..Para o presidente do CRUP, a presença dos partidos é importante, até por estarmos em ano eleitoral. "Esperamos que os programas de governo dos diferentes partidos possam já refletir em parte a reflexão que está a ser feita", diz, defendendo que o papel dos estudantes não é menos importante, porque não basta tomar medidas políticas para ir ao encontro das expectativas dos jovens que atualmente optam por não entrar no superior. "São nativos digitais. Não entram na universidade para se sentarem nos bancos a ouvir", considera, admitindo que também nas universidades deve ser feito um maior esforço de articulação dos cursos com as empresas e outras instituições públicas e privadas..Doutoramentos dos politécnicos só a partir de 2022.Se as universidades contemplam abordagens mais práticas dos cursos, um terreno habitual dos politécnicos, estes também se preparam para assumir responsabilidades que tradicionalmente estavam reservadas às academias. Com o Decreto-Lei 65/2018, passou a ser possível aos institutos conceder doutoramentos, uma pretensão antiga deste subsistema. Mas Pedro Dominguinhos avisa que esse não será um processo instantâneo. "A nossa expectativa é a partir de 2022-23 ter os primeiros doutoramentos a iniciarem-se", explica..Antes, além de um processo paralelo de certificação dos centros de investigação do setor, que já está em curso, faltam medidas políticas, que o presidente do CCISP espera também ver inscritas nos programas dos partidos, nomeadamente a revisão de diplomas como os regimes jurídicos das instituições do ensino superior que ainda não são compatíveis com a possibilidade criada pelo decreto-lei.