PS vai "acomodar" recomendações de Marcelo sobre mudança de género
O PS considerou esta quinta-feira que o veto presidencial ao diploma sobre autodeterminação e identidade de género não coloca em causa o essencial da iniciativa e adiantou que vai "acomodar" os reparos feitos por Marcelo Rebelo de Sousa.
Carlos César assumiu esta posição no final da reunião semanal do Grupo Parlamentar do PS, depois de confrontado com o veto anunciado na quarta-feira pelo Presidente da República ao decreto que estabelece o direito à autodeterminação da identidade e expressão de género e permite a mudança da menção do sexo no registo civil a partir dos 16 anos.
Marcelo Rebelo de Sousa enviou uma mensagem à Assembleia da República em que solicita que se pondere a inclusão de relatório médico prévio à decisão sobre a identidade de género antes dos 18 anos.
Perante os jornalistas, o líder da bancada socialista desdramatizou as consequências da decisão presidencial, dizendo que as mudanças exigidas em relação ao diploma "são perfeitamente acomodáveis" pela Assembleia da República.
"O veto do senhor Presidente da República, na sua melhor leitura, significa a concordância em relação à iniciativa e ao seu conteúdo em geral. Dispõe apenas, no que toca à decisão que é tomada entre os 16 e os 18 anos, de associá-la à existência de um relatório médico, que nem sequer é um relatório de diagnóstico", sustentou.
Ou seja, de acordo com a interpretação de Carlos César, aquilo que o chefe de Estado coloca à Assembleia da República "é perfeitamente acomodável numa alteração que se possa fazer proximamente".
Esta lei, que estabelece também o direito à proteção das características sexuais de cada pessoa, foi aprovada no parlamento no dia 13 de abril, com votos a favor de PS, BE, PEV e PAN e da deputada social-democrata Teresa Leal Coelho, a abstenção do PCP e votos contra de PSD e CDS-PP.
O diploma, resultante de uma proposta do Governo e de projetos de BE e PAN, alarga aos menores com idade entre 16 e 18 anos a possibilidade de requerer um "procedimento de mudança da menção do sexo no registo civil e da consequente alteração de nome próprio", através dos seus representantes legais, sem necessidade de um relatório médico.
O Presidente da República pediu ao parlamento que pondere incluir um relatório médico para a mudança de sexo no registo civil até aos 18 anos no diploma que vetou sobre identidade de género.
"A razão de ser dessa solicitação não se prende com qualquer qualificação da situação em causa como patologia ou situação mental anómala, que não é, mas com duas considerações muito simples. A primeira é a de que importa deixar a quem escolhe o máximo de liberdade ou autonomia para eventual reponderação da sua opção, em momento subsequente, se for caso disso. O parecer constante de relatório médico pode ajudar a consolidar a aludida escolha, sem a pré-determinar", argumenta o Presidente.
Por outro lado, o chefe de Estado sustenta que, "havendo a possibilidade de intervenção cirúrgica para mudança de sexo, e tratando-se de intervenção que, como ato médico, supõe sempre juízo clínico, parece sensato que um parecer clínico possa também existir mais cedo, logo no momento inicial da decisão de escolha de género", acrescentando: "Hipoteticamente, poderia haver uma escolha frustrada, ao menos em parte, pelo juízo clínico formulado para efeitos de adaptação do corpo à identidade de género, quando tal for a opção".
BE diz que sugestão de relatório médico não faz sentido
O BE manifestou hoje a intenção de encontrar "a melhor solução" para ultrapassar o veto presidencial à lei que permitia a mudança de género aos 16 anos no registo civil mas reiterou a sua oposição ao relatório médico.
Em declarações aos jornalistas no parlamento, a deputada do BE Sandra Cunha começou por salientar que o veto não é "à lei e autodeterminação de género e centra-se efetivamente naquilo que é um critério específico, que é o acesso das pessoas entre os 16 e os 18 anos à lei".
No texto que sustenta o veto, divulgado na quarta-feira, Marcelo Rebelo de Sousa pede ao parlamento que pondere incluir um relatório médico para a mudança de sexo no registo civil até aos 18 anos.
"O Bloco considera que introduzir um relatório médiconessa fase, para um ato meramente civil, é não compreender aquilo que a lei pretende e não compreender que é um ato meramente civil, que não envolve cirurgias ou tratamentos irreversíveis", criticou a deputada, considerando não fazer sentido a sugestão do Presidente.
De acordo com Sandra Cunha, "o BE está disponível para, no parlamento, se encontrar a melhor solução para se aprovar a lei e para que esta lei vingue em toda a sua plenitude".
"Iremos ver com os outros grupos parlamentares que apoiam esta proposta a melhor solução para termos um desfecho positivo para todos, maiores e menores de 18 anos", garantiu.
Questionada pelos jornalistas sobre se há abertura, da parte dos outros partidos que viabilizaram a lei, para a confirmar e devolver ao Presidente da República, a deputada começou por explicar que bloquistas ainda não falaram "diretamente com os outros partidos".
"Poderá haver qualquer outro tipo de solução que vá ao encontro ou responda às preocupações do Presidente da República, mas não vos posso avançar qual é porque é algo que ainda temos que conversar, especialmente com as pessoas trans, os jovens e as famílias e tentar encontrar a melhor solução possível", adiantou.
"Aqueles que são proponentes também e que tiveram proposta e iniciativa, já houve declarações de que existe essa abertura para confirmar a lei. De que forma é que ela será feita é o que ainda temos de ver e temos que conversar para encontrar a melhor solução", respondeu apenas.