As medidas e as ameaças de Donald Trump, presidente dos EUA, já estão a contaminar negativamente o crescimento da zona euro e a confiança dos empresários e dos exportadores, deixou perceber ontem Mario Draghi, o presidente do Banco Central Europeu (BCE)..O alerta não é de somenos. Os EUA são o principal cliente das exportações europeias, para onde anualmente são escoadas mercadorias no valor de 375 mil milhões de euros (crescendo mais de 3% em 2017). Para Portugal, os avisos de Draghi também têm relevo. Os EUA são o 11.º melhor cliente da economia nacional, tendo comprado quase 2,9 mil milhões em produtos portugueses. O crescimento em 2017 foi de 5,2%..Portugal, um parceiro antigo dos EUA, pode até não ser diretamente visado com novas medidas protecionistas, mas alguns parceiros europeus podem e a economia portuguesa será indiretamente afetada num cenário de abrandamento do comércio entre os dois grandes blocos. Mais de 74% das exportações portuguesas vão para a Europa, só para se ter uma ideia do grau de exposição de Portugal ao exterior..A reunião do BCE ontem em Frankfurt serviu para anunciar que as taxas de juro da zona euro continuarão em mínimos de sempre (a taxa de refinanciamento em 0%) até que a inflação suba e se mantenha perto dos 2%; e que o programa de compra de ativos, entre eles dívida pública, vai continuar até, pelo menos, setembro deste ano..Mas o aviso mais sério foi mesmo de que o BCE já começou a detetar os primeiros sinais de alguma retração em certos indicadores de atividade e de confiança por causa do "protecionismo".."Após vários trimestres de crescimento acima do esperado, as informações que temos recebido desde a reunião de março apontam para alguma moderação", ainda que continuem "consistentes com uma expansão sólida e abrangente da economia da área do euro", começou por dizer Mario Draghi..O banqueiro italiano referiu, por exemplo, que alguns indicadores caíram inesperadamente, mas também houve "alguma normalização que era esperada, principalmente devido a fatores temporários, por exemplo o clima frio, greves e a época da Páscoa"..Draghi revelou que "todos os membros do Conselho do BCE [todos os governadores, Carlos Costa incluído] confirmaram que as economias "experimentaram alguma moderação no crescimento ou perda de impulso". É uma situação "bastante transversal entre países e setores", disse. E enumerou vários indicadores económicos que caíram, desde a confiança da indústria à produção..Há também fenómenos novos, recentes, como a maior hostilidade do governo dos EUA em assuntos de comércio internacional (barreiras no comércio de aço e alumínio dirigidos à China, por exemplo), que podem prejudicar as perspetivas da economia e dos empresários europeus. Além disso, ainda não é seguro que os EUA não avancem com novas barreiras noutros setores. E que a Europa esteja a salvo no processo. "Os riscos sobre as perspetivas de crescimento da zona euro permanecem globalmente equilibrados", mas "os riscos relacionados com fatores globais, incluindo a ameaça de aumento do protecionismo, tornaram-se mais proeminentes", alertou..E acrescentou: "Sabe-se que os recentes acontecimentos [relativos ao protecionismo, sendo as iniciativas dos EUA as mais pujantes] têm um efeito profundo e rápido na confiança das empresas e dos exportadores e que, por sua vez, podem afetar as perspetivas de crescimento"..Mesmo com as ameaças, a retoma europeia continua. A zona euro deve avançar 2,4% neste ano. Portugal deverá crescer o mesmo..No entanto, a inflação continua muito baixa e precisa de ter um comportamento mais "convincente" no sentido de uma subida..Assim sendo, "continua a ser necessário um amplo grau de estímulo monetário para que as pressões inflacionistas subjacentes continuem a aumentar", argumentou Mario Draghi.