Propaganda política para plateias vazias

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A uma semana do arranque oficial da campanha eleitoral, vale a pena olhar para o que andam a fazer os partidos para passar a quem neles poderá votar a mensagem do que defendem e do planeiam fazer com a representação que alcançarem. E fazendo essa análise, cujas conclusões pode ler aqui, chegamos uma vez mais à triste conclusão de que, simplesmente, os políticos já pouco nos representam. As desastradas campanhas eleitorais são prova e consequência disso.

Se a comunicação evoluiu e, para o bem e para o mal, temos hoje acesso a ferramentas e instrumentos como a internet, o fact cheking, as redes sociais, os políticos não têm nem ideia de como utilizar esses instrumentos para chegar diretamente aos votantes, mantendo-se presos aos formatos de 50 anos - mesas com lombo de porco e discurso à sobremesa, cartazes que se canibalizam nas principais rotundas do país.

Se vivemos na era da informação, tendo acesso rápido e fácil a qualquer notícia, esclarecimento, arquivo, background, a maioria das pessoas nunca esteve tão pouco interessada em manter-se informada - basta comparar consumidores de informação com os de entretenimento -, antes querem ver validadas as suas crenças e de resto o carnaval é rei e quanto mais palhaços melhor. O que ajuda a explicar a profusão de soundbites e julgamentos na praça pública.

Se a sociedade se desenvolveu, se abriu e se globalizou, até nos costumes, os políticos mantêm a discussão entre si o mais acesa possível e focada nos temas de sempre sem terem a noção - ou sem quererem saber - de que já não há ninguém sentado a ouvi-los falar daquilo que não melhora nem piora em nada a vida dos eleitores. Ainda não entenderam que muito poucos ainda se identificam com a definição de direita e esquerda, cada vez menos se encontram plenamente representados por uma fação partidária, raros são os que não conseguem colher ideias válidas (e espantar-se com a sobrevivência de outras tantas bastante inacreditáveis) nos programas de quase todos os partidos. E a polarização desajustada só contribui para afastar ainda mais os portugueses das urnas.

Os consistentemente crescentes números da abstenção não deixam margem para dúvidas. Nos últimos sufrágios, só as autárquicas tiveram metade dos eleitores a votar - legislativas (51,4% de abstenção), presidenciais (60,8%) e europeias (69,3%) não levaram muito mais do que um terço a sair de casa. Uma tendência que se agrava conforme se recua na idade dos votantes: os jovens entre os 18 e os 30 anos são os que menos vão às urnas, mas a abstenção já se espalhou à faixa seguinte, até aos 45 anos.

De 2015 para 2019, somaram-se perto de 300 mil aos abstencionistas; no total, foram 4,25 milhões de portugueses que se demitiram de escolher quem os governaria.

Em 1987, dois terços dos eleitores diziam sentir-se próximos de um representante político, encontravam-se nas ideias que um partido defendia. Quantos o diriam hoje? Talvez seja tempo de o descobrir e arrepiar caminho, ou arriscamo-nos a ter um sério problema de legitimidade democrática.

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