Música. João Gil 'a tempo' de se estrear a solo.Foram necessários 52 anos de vida para que João Gil se entregasse à solidão. Mas não se trata de uma solidão qualquer. Em João Gil, o primeiro disco a solo de uma carreira de mais de três décadas, parte em busca de um "relançamento total" que teria sido "despropositado" em anos idos. Tão "despropositado" quanto um espectáculo que realizou no Centro Cultural de Belém, que serviu para comemorar 25 anos de carreira. "Não quis muito fazer aquilo. Não era o tempo. Considero desnecessário aproveitar as efemérides. Quero largar esse banco suiço e regressar à experimentação total." Estamos a falar de 2001, ano em que foram reunidas algumas das suas parcerias mais representativas, na colectânea Perdidamente..Estamos em 2008 e o tempo é outro. Para trás ficaram os Trovante, a Ala Dos Namorados e a Filarmónica Gil (esta definitivamente terminada). "Eram veículos que me deixavam circunscrito a uma faixa de rodagem", diz sem um grama de hostilidade. A partir de agora, se o virmos a "acompanhar um cantor de Cabo Verde" ou a "tocar um funaná", o espanto terá que ser guardado para outra oportunidade. "Sem complexos nem arrogâncias", assume. "Não é um corte com o passado. Eu fiz foi as pazes com o passado", defende. "Sempre fiz o que quis, mas tinha que respeitar a personalidade das bandas. Este é um disco de autor. Não vou mudar nada. Continuo a ser reservado. Em palco, posso ser mais extrovertido", confessa sem complexos. Quanto às cantorias, "talvez quando chegar aos 80, mas baixinho como João Gilberto". E sempre com alegria porque Gil é "um homem feliz" desde que nasceu..Apesar da boa disposição permanente, não esquece causas a que se tem associado e mostra-se crítico para com "o significado da palavra solidariedade". E porquê? "Está completamente abastardada. É usada para lançar perfumes, lojas, livros e pessoas. É uma legitimação de negócios, alguns deles obscuros. É urgente arranjar outra palavra ou deixar de a usar. A solidariedade faz-se, não se anuncia." .Gil é um veterano que sabe que "a liberdade custa dinheiro" e que "há muita gente que não diz o que pensa e sente". Os tempos não são fáceis, "mas Portugal está muito melhor que há 30 anos" porque "as pessoas já não cospem para o chão e separam o lixo". Pormenores que se tornam importantes "num mundo que está em mudança", em que "a televisão é para idosos". Consumidor ávido de informação, assume que é o computador que o põe "online com o mundo". Apesar de ser um quinquagenário, Gil pertence à geração "YouTubiana e MySpaciana", fala "essa linguagem" e tem "muita 'ilusão' (no sentido espanhol do termo)".|