Os anúncios às licenças de navegação tiradas em Espanha e com validade em Portugal começaram há dois/três meses. Dizem que é uma "carta de marinheiro", sem exame e que é vitalícia. É verdade que qualquer carta de recreio tirada num país da UE é reconhecida em Portugal (artigo 39.º da Lei n.º 93/2018) e muitos "marinheiros" vão às escolas espanholas para obter uma licença. O problema é que este documento só dá para navegar até duas milhas (3,2 km) do porto.."As pessoas estão a ser enganadas", diz Fernando Sá, dirigente da Associação Naval de Lisboa (ANL), salientando: "Há entidades em Portugal que têm aproveitado para divulgar informação sobre a licença de navegação tirada em Espanha, mas não dá para quase nada. Anunciam que é uma carta de marinheiro, mas é muito básica. É como se eu fosse tirar uma carta de bicicleta para conduzir uma moto.".Quem foi aliciado para ir a Espanha fez as contas e viu que ganha em tempo - quatro horas de aulas práticas e duas de teóricas em vez de 20 horas práticas e dez teóricas, como exige a lei portuguesa. Também poupa dinheiro, além do custo do curso, que tem muito menos horas do que os das escolas portuguesas, onde é cobrado no mínimo 300 euros, elimina-se o valor do exame (140 euros), que não é exigido em Espanha..Nos fóruns frequentados por quem tem um barco de recreio percebe-se que até as capitanias tem dúvidas sobre a validade daquela licença no país. O DN telefonou para algumas dessas escolas, em Vigo e em Huelva, e rapidamente conseguiu uma marcação..O proprietário da Escola Náutica de Recreio de Isla Cristina referiu que tem muitos portugueses a tirar a licença na escola, que basta aparecer às horas do curso com a documentação exigida para a obter. Aos sábados, a formação começa às 09.00 (hora de Espanha). Explica que é uma licença "para barcos sem limite de motor até uma distância de duas milhas do porto de abrigo em navegação diurna". E dá para Portugal? "Não sei, pergunte aí", responde..A Direção-Geral de Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos (DGRM) emitiu um alerta, mas que é pouco elucidativo. Refere ter conhecimento, "através de redes socais, de informações relativas a título espanhol denominado Licencia de Navegación", cujo conteúdo reproduz "carta de barco em Espanha válida para Portugal, vitalícia e sem exame, barcos hasta 6 M. sin límite de potencia"..Alertam que, "apesar de o art.º 39 do Decreto-Lei n.º 93/2018, de 13 de novembro, referir que as cartas de navegador de recreio ou os títulos emitidos por administrações dos Estados membros da União Europeia são automaticamente reconhecidos, o reconhecimento é feito, conforme indicado na citada norma, nos termos e para os efeitos do referido decreto-lei". Ou seja, depende de que título para navegar se está a falar..A DGRM indica um contacto para "esclarecimento adicional sobre esta matéria", através do endereço ajuda.bmar@dgrm.mm.gov.pt ou da linha BMar +351 213 035 805 (das 10.00 às 12.00 e das 14.00 às 16.00).."A licença tirada em Espanha não tem equiparação em Portugal", explica Fernando Sá, que, além de fazer parte da ANL, é coordenador pedagógico da Escola de Navegação Treino de Mar, um dos principais formadores da área em Portugal e com instalações na Doca do Espanhol, em Lisboa..Em Portugal, há quatro categorias de cartas de navegação de recreio: Marinheiro (a mais básica), Patrão de Alto-Mar, Patrão de Costa e Patrão Local..O DN questionou a DGRM sobre o tipo de irregularidades detetadas na fiscalização, que se limitou a responder: "A fiscalização é essencialmente realizada pela Policia Marítima. Os problemas detetados têm sido dentro dos padrões 'normais' face ao histórico do passado, devendo ser considerado que estamos neste momento na fase do ano em que se verifica um aumento de afluência à náutica de recreio, situação que acarreta naturalmente a deteção de mais situações anómalas, ainda que em número reduzido, face a outras alturas do ano.".Emitiram até agora 12 072 cartas de navegação, distribuídas da seguinte forma: 5430 de Patrão Local, 5105 de Marinheiro, 1101 de Patrão da Costa e 436 de Patrão de Alto-Mar. E reconheceram 14 cartas da UE, entre as quais duas de Espanha (uma de Marinheiro e uma de Patrão da Costa)..A carta de Marinheiro habilita o titular à navegação diurna à distância máxima de três milhas da costa e de dez milhas de um qualquer porto de abrigo, a de Patrão Local dá para navegar até uma distância máxima de 25 milhas de um qualquer porto de abrigo e de seis milhas da costa, a de Patrão de Costa permite navegar até uma distância da costa que não exceda 40 milhas e a de Patrão de Alto-Mar não tem limite de área..A licença pode ser tirada a partir dos 16 anos, podendo os que não atingiram os 18 apenas manobrar um barco de recreio até seis metros de comprimento, com potência instalada até 22,5 kW, motas de água e pranchas motorizadas, independentemente da sua potência.