Portugal a um passo de fazer história no andebol. As contas e a receita do sucesso
A seleção nacional de andebol tem nesta terça-feira (15.00 horas, SportTV4) com a Eslovénia um jogo-chave para conseguir chegar às meias-finais do Campeonato da Europa. Só um triunfo manterá as esperanças da equipa treinada por Paulo Pereira, que depois terá também de vencer a Hungria na última jornada da ronda principal para garantir um lugar entre os quatro melhores do torneio.
À partida para este Europeu poucos esperariam que Portugal estivesse nesta altura na luta pelo pódio, mas os triunfos diante da França e da Bósnia na primeira fase, e frente à Suécia, vice-campeã da Europa, já nesta segunda fase de grupos, colocaram a equipa das quinas a precisar de duas vitórias para fazer história e conseguir a melhor classificação de sempre neste torneio, depois do sétimo lugar alcançado em 2000. Um feito que pode ainda ser batido mesmo que perca um dos dois jogos que faltam disputar. Isto porque o terceiro classificado dos dois grupos irá disputar o jogo de atribuição do quinto lugar, que dará acesso à disputa do torneio pré-olímpico, que se realiza em abril.
Uma boa notícia para o selecionador nacional é a recuperação do lateral esquerdo André Gomes, que não pode jogar com a Suécia e a Islândia devido a uma microrrutura na coxa direita. "Ele sente-se bem e penso que está a 100%", revelou Paulo Pereira nesta segunda-feira, em Malmö, cidade onde a equipa nacional realiza os jogos desta ronda principal, garantindo que o duelo com a Eslovénia "é excecional" para André Gomes devido às características do adversário.
Ricardo Andorinho, antigo andebolista que esteve na seleção que conquistou o sétimo lugar no Euro 2000, disse ao DN não estar surpreendido com os sucessos desta equipa, pois "a qualidade já existia, só precisavam de voltar a entrar nos grandes palcos", dos quais estavam afastados desde 2006, "sempre por pequenos detalhes".
O antigo andebolista, de 43 anos, acredita que Portugal poderá fazer história no Europeu e está convencido de que "a Eslovénia está ao alcance da seleção nacional, desde que consiga sentir-se confortável" frente a um adversário que diz ser "a que melhor joga coletivamente" no torneio. "É uma equipa que joga sempre perto das defesas contrárias, pelo que estão sempre perto da baliza com grandes possibilidades de marcar, pois não arriscam em remates aos nove metros e só atacam pela certa, o que a tornam uma equipa muito consistente", explica Ricardo Andorinho, que junta os portugueses aos eslovenos na arte de surpreenderem os adversários pelo "jogo coletivo muito forte".
"É preciso que a nossa seleção adapte a sua defesa agressiva a um estilo mais recuado para que possa procurar ganhar vantagem nos lances de um para um", acrescenta, lembrando que as duas equipas já se conhecem muito bem dos vários jogos que têm feito.
Numa altura em que os dois jogos que faltam disputar apresentam-se decisivos para fazer história, Ricardo Andorinho assume que "é preciso fazer diminuir o impacto que as decisões dos árbitros têm nos jogadores", que em sua opinião foi um fator importante na derrota deste domingo com a Islândia. "Os jogadores não podem dispersar as atenções por outros fatores que não a tarefa que têm de fazer em campo. É que, no andebol, a pressão do público e a arbitragem podem destruir uma equipa e, como tal, a cabeça deve estar só naquilo que têm de fazer", sublinha.
O antigo andebolista, que fez 98 jogos pela equipa das quinas, acredita que a concentração estará no máximo. "Tenho a mesma confiança para este jogo com a Eslovénia como tinha antes do jogo com a França, para o qual acreditava na vitória, apesar de ser a seleção com melhor currículo nos últimos anos", frisou, destacando ainda a "surpreendente" vitória por dez golos de diferença frente à Suécia, uma potência na modalidade, "que dificilmente voltará a repetir-se", por se tratar de "uma escola de andebol" com atletas "muito competitivos". São estes dois jogos que fazem elevar a sua confiança naquilo que Portugal poderá fazer nos dois jogos que faltam.
O último jogo será com a Hungria, uma equipa que Ricardo Andorinho diz ser "muito diferente" da Eslovénia, mas que "será mais fácil a Portugal encaixar-se no tipo de jogo que praticam". Mas garante que aqui "o peso do coletivo e a capacidade de os jogadores se ajudarem uns aos outros será determinante".
Contudo, independentemente do que possa acontecer, Andorinho admite que Portugal já deixou uma marca bastante forte neste Campeonato da Europa. "A imprensa internacional tem destacado a qualidade da nossa seleção e diz que é a surpresa da competição, por isso temos de ter a consciência de que estamos a fazer um grande trabalho", sublinhou.
Sobre as possibilidades de Portugal conseguir melhorar a classificação de sempre em Europeus (sétimo lugar), Ricardo Andorinho recorre à mentalidade de um grande desportista nacional: "O Cristiano Ronaldo costuma dizer que tem a certeza de que vai bater os recordes. E a verdade é que neste momento está em aberto conseguir fazer melhor. Chegar às meias-finais ou aos Jogos Olímpicos é algo histórico, mas o foco tem de ser a Eslovénia e quem entrar em campo não irá, por certo, estar a pensar noutros objetivos que não seja o de vencer o jogo, pois só assim é possível chegar aos recordes. É preciso ter a cabeça em cada jogo, afinal os recordes não marcam golos nem ajudam à concentração."
Ricardo Andorinho destaca a importância daquilo que tem sido o desempenho dos clubes portugueses nas provas europeias, algo que Carlos Galambas já tinha destacado ao DN no lançamento deste Europeu: "A melhoria nesta modalidade tem que ver com o bom trabalho feito pela federação, mas também pelos clubes. É bom lembrar que na época passada o Sporting chegou aos oitavos-de-final da Champions e o FC Porto às meias-finais da Taça EHF, e neste ano tem feito muito bons resultados na Liga dos Campeões, tal como o Sporting."
E o certo é que, a avaliar pelo que disseram, nesta segunda-feira, Alexandre Cavalcanti e Miguel Martins, o pensamento está apenas nos jogos que faltam disputar. "Serão duas finais e temos de entrar com tudo para ganhar, começando já com os eslovenos", assumiu Cavalcanti, admitindo que a equipa teve "um jogo menos conseguido" com a Islândia, que perdeu por 28-25, mas destacou que o grupo "já fez história" ao apurar-se para a ronda principal, depois de ter estado "muitos anos fora do Europeu".
"Com a Islândia não fizemos o nosso melhor jogo, com um início atípico. Mais tarde, soubemos que a Hungria venceu a Eslovénia e isso deu-nos uma segunda oportunidade e agora este vai ser o jogo decisivo", assumiu Miguel Martins, avisando que Portugal não poderá "entrar em pânico" caso volte a ter um mau início de partida, até porque em causa está "uma primeira final" que pode dar acesso a "uma segunda final, contra a Hungria", na quarta-feira.
"Já demonstrámos que podemos vencer qualquer equipa e se praticarmos o andebol que praticámos em alguns jogos, podemos mesmo vencer e passar às meias-finais", assegurou Miguel Martins, acrescentando que a confiança está no máximo entre os jogadores portugueses.
O selecionador Paulo Pereira acredita num grande jogo com a Eslovénia e lembra que "em 25 anos de Europeu, Portugal ganhou seis jogos, e agora, em 15 dias, ganhou três". Por isso, deixou a receita para as próximas batalhas: "Temos de continuar a desfrutar um pouco de estar entre os melhores e não estar tão pressionados, ser corajosos para ir à luta."
E nesse sentido deixou um aviso: "Para 95% dos atletas deste grupo, esta é a primeira vez que participam no Europeu. Uma equipa campeã não é tão inconstante como nós. Pode ter um jogo mau, mas nós já tivemos dois jogos maus: com a Bósnia, que ganhámos, e com a Islândia, porque a Noruega é a Noruega", sustentou, assumindo que se a sua equipa "recuperar o funcionamento defensivo" com a Eslovénia poderá "continuar a fazer história".