Polícia prendeu dois suspeitos de violar adolescente. E mudou delegado
Dos seis suspeitos já identificados pelo crime de violação coletiva de uma adolescente de 16 anos, um entregou-se ontem ao fim da tarde à polícia do Rio de Janeiro. Outro foi detido ao final do dia (Lucas Santos, 20 anos) e os restantes quatro estão fugidos mesmo depois de as autoridades terem efetuado buscas em dezenas de favelas na região do Morro da Barão, onde no dia 21 ocorreu o crime. O anúncio da detenção de Raí de Souza, de 22 anos, o responsável pelas filmagens da violação coletiva, cometida, segundo a vítima, por mais de 30 homens, foi feito quando as autoridades do Rio justificavam a troca de comando dos delegados envolvidos no caso.
A delegada Cristiana Bento, titular da Delegacia da Criança e do Adolescente Vítima, substituiu Alessandro Thiers, da Delegacia de Repressão a Crimes de Informática, cujo trabalho foi chamado de "machista" pela advogada da adolescente. Segundo a polícia carioca, a medida foi efetuada para "evidenciar um carácter de proteção à vítima na condução da investigação, bem como afastar futuras dúvidas sobre a imparcialidade no trabalho".
Thiers tinha declarado numa entrevista que ainda investigava "se houve consentimento dela, se ela estava de facto dopada e se realmente os factos aconteceram". E perguntou à jovem em interrogatório se "tinha por hábito praticar sexo em grupo", no que foi considerado pela advogada da jovem, entretanto afastada do caso por decisão da família da vítima, que agora está sob os cuidados da Secretaria de Direitos Humanos do Rio de Janeiro, como "machista".
A própria jovem, que mantém o anonimato, disse ao programa Fantástico da TV Globo na madrugada de segunda-feira que se sentiu "constrangida". "Ninguém merece ser violentada, não interessa se estava com roupa curta ou longa, a hora que era, o lugar onde estava, faz-me sofrer tanto quanto a violação haver pessoas a dizer que é mentira, pessoas a dizer que eu queria e o próprio delegado a culpar-me, não me senti à vontade com ele, acho que é por causa disso que muitas pessoas não fazem denúncia."
A delegada que trata agora do caso também se desentendeu com o colega. Segundo Cristiana Bento, que interrogara primeiro a vítima durante duas horas com a ajuda de um psicólogo, Thiers obrigou a jovem a prestar outro depoimento logo de seguida, o tal em que foi acusado de machismo.
Fernando Veloso, o chefe da polícia civil carioca, afirmou em conferência de imprensa ontem à tarde que a troca de comando no caso se deveu a uma "tentativa de preservar" o delegado Thiers. Cristiana Bento, ao lado de Veloso, sublinhou que "houve estupro". "O que falta provar é a extensão do crime, quantos o praticaram", acrescentou.
Entretanto, o governador interino do Rio, Francisco Dornelles, também já falou sobre o caso afirmando que se dependesse dele aplicava a pena de morte aos suspeitos.
A adolescente foi violada na madrugada do dia 21 no complexo de favelas São José Operário, na zona oeste do Rio. Segundo depoimento da vítima, encontrou um rapaz, um dos seis foragidos, com quem tinha um relacionamento num baile funk da região. Depois de ter sido, segundo a própria, dopada, só se lembra de acordar numa casa, nua, cercada de homens armados.
Três dias depois, a polícia começou a investigar o caso alertada por um vídeo que circulava nas redes sociais em que um grupo de rapazes toca nas partes íntimas da jovem e um deles diz que "mais de 30 passaram por aqui". Segundo a lei brasileira de 2009, "atos libidinosos", ou seja, tocar sem penetração, também são considerados violação. Como o caso ganhou repercussão a dois meses dos Jogos Olímpicos e motivou muitos protestos tem havido operações policiais todas as noites na região onde o crime ocorreu. A de ontem envolveu 70 agentes.
O presidente em exercício do Brasil, Michel Temer, também foi criticado por ter demorado a manifestar-se sobre o crime. Esta semana, porém, deve anunciar medidas de combate à violação, entre elas a criação de um departamento ma Polícia Federal para crimes contra mulheres.