Quem acompanhou as negociações do Tratado de Lisboa durante a última presidência portuguesa da UE, em 2007, lembra-se bem das dores de cabeça causadas aos parceiros europeus pela Polónia dos irmãos Kaczynski, Lech e Jaroslaw, o primeiro então presidente, o segundo primeiro-ministro. Lech morreu num acidente de avião na Rússia em abril de 2010, Jaroslaw esteve afastado do poder pelos liberais nos últimos sete anos, mas ontem viu o seu partido vencer as eleições legislativas. O partido Lei e Justiça, de direita e populista, cuja cabeça de lista era Beata Szydlo, ganhou o escrutínio com 39,1% dos votos e 242 dos 460 deputados, segundo uma sondagem à boca das urnas do instituto Ipsos..Em segundo lugar ficou o Plataforma Cívica da primeira-ministra polaca Ewa Kopacz, delfim e sucessora de Donald Tusk, atual presidente do Conselho Europeu. O partido de centro-direita liberal, que governava desde final de 2007, obteve, segundo as projeções, 23,4% dos sufrágios e 133 deputados no Parlamento polaco. Em terceiro ficou o movimento do músico punk Pawel Kukiz, o Kukiz"15, com 44 deputados eleitos. Segue-se o Nowoczesna,partido liberal do economista Ryszard Petru, que consegue eleger 22 deputados. No último lugar surge o PSL - também conhecido como partido dos camponeses polacos - com 18..Aos repórteres da Reuters em Varsóvia, a capital polaca, Michal Zurawski, de 30 anos, explicava ontem porque razão decidiu dar o seu voto ao Lei e Justiça. "As suas propostas são dirigidas àqueles que são menos influentes. Como eu. Cuidar deste grupo de pessoas e criar melhores condições sociais e laborais para elas é bom. Isso irá beneficiar a economia da Polónia e o país enquanto um todo". Jadwiga Horus, uma pensionista, refere por sua vez porque votou na Plataforma Cívica de Ewa Kopacz (e também de Donald Tusk). "Eu prefiro pessoas com provas dadas. Mesmo que elas cometam erros - Plataforma Cívica é, de longe, muito melhor do que o Lei e Justiça"..No poder há sete anos, o Plataforma Cívica viu-se desgastado pela ida de Tusk para Bruxelas, por escândalos como o "Waitergate". Este consiste num conjunto de escutas que foram realizadas a vários governantes em restaurantes, nas quais surgem a proferir declarações grosseiras. "A aliança entre polacos e americanos não vale nada, até é prejudicial, porque cria um falso sentido de segurança na Polónia", disse Radek Sikorski, citado por uma tradução da cadeia de televisão russa Russia Today, reproduzida em vários media. "Vamos arranjar um conflito com russos e alemães e vamos pensar que está tudo ótimo porque fizemos sexo oral aos americanos", afirmou o ex-chefe da diplomacia polaca, que se demitiu em junho. Sikorski surgiu ainda citado como tendo afirmado que David Cameron "é um incompetente" e que o primeiro-ministro britânico "lixou" a União Europeia..Apesar de uma melhoria económica considerável ao longo da última década e de a Polónia - um país com 38 milhões de habitantes - ter sido o único Estado daUE a escapar à recessão após a crise de 2008, foi o Lei e Justiça que ganhou. O partido de Kaczynski defende mão pesada da NATO face à Rússia, é contra a adesão polaca ao euro, promete aumentar a despesa nos benefícios sociais para os que mais precisam e submeter o setor bancário a novas taxas. A formação da direita populista é contra a receção de refugiados do Médio Oriente, argumentando que estes podem influenciar o estilo de vida da sociedade católica polaca. Kaczynski, que ontem se apressou a festejar a vitória com Beata Szydlo, insinuou mesmo que os refugiados podem trazer doenças para o país.