Pixies e The Cure: Duas vias distintas para chegar à perenidade

Entre as bandas, há mais diferenças do que proximidades. Une-as um facto indesmentível: resistência ao efémero próprio do rock.
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Em 24 horas e com pouco mais de 300 quilómetros de "intervalo", Portugal acolhe dois concertos de dois grupos de consulta obrigatória, irmanados pelo estatuto de "bandas de culto", capazes de resistir aos poderes de consumo e apetência de gerações consecutivas.

Talvez sejam em maior número os aspetos que separam os Pixies (que tocam no Porto) dos The Cure (que atuam em Lisboa) - mas algum ponto de contacto haverá entre duas formações que já atingiram as três e quatro décadas de carreira, respetivamente e que continuam a arrastar multidões.

A cronologia afasta-os: quando Black Francis e Joey Santiago contrataram Kim Deal para ajudar a formar os Pixies (embora ela nunca tivesse tocado baixo na vida mas fosse recrutada por ter gostos semelhantes aos de Francis...), os The Cure gozavam os louros de uma "abertura" face ao rock gótico inicialmente praticado e rentabilizavam a exposição radiofónica de canções como In Between Days e Close To You (ambas do álbum The Head On The Door) e há muito que Robert Smith tinha trocado o piano que o ocupou na primeira apresentação pública do grupo pela guitarra e pela liderança incontestada dos destinos do conjunto. Em 1986, a caminho da definitiva explosão comercial que se verificaria com Kiss Me, Kiss Me, Kiss Me, os The Cure já estavam na primeira linha dos sobreviventes ao sincrético período da new-wave, enquanto os Pixies começavam o seu percurso no noise-rock, no surf-rock, no garage-rock, e em todos os "departamentos" para que têm sido empurrados, mostrando-se fãs devotos de bandas cuja popularidade acabariam por ultrapassar largamente, casos dos Husker Du ou do Thrwoing Muses.

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Com uma base escolar comum - Francis e Santiago eram vizinhos na época em que frequentavam a Universidade de Massachusetts, Smith, Tolhurst e Marc Ceccagno eram colegas na St. Wilfrid"s Catholic Comprehensive School de Crawley, no West Sussex inglês -, a geografia também separa os dois agrupamentos: os The Cure são britânicos, de Crawley, os Pixies nascem em Boston, Estados Unidos. Os "bifes" sempre alcançaram melhores resultados comerciais em casa e no Velho Continente, os "yankees" precisaram de ser profetas em terra alheia, sendo respeitados pelos compatriotas mas verdadeiramente desejados pelos europeus.

Homens fortes e separações

Ao longo dos apetecíveis percursos destes ativos musicais, cedo se percebeu que os destinos de cada um dos coletivos estão umbilicalmente ligados à presença de dois homens fortes, Black Francis e Robert Smith, que assumem o papel de cantores e principais compositores de cada um dos dois projetos. Quando os Pixies se separaram, entre 1993 e 2004, foi Francis que informou telefonicamente os seus parceiros de que a conversa estava acabada. Para o grupo voltar a reunir-se, foi preciso convencer Francis das vantagens desse recomeço, algo que uma bem sucedida carreira a solo não tornava premente. Do lado dos The Cure, os devaneios de Robert Smith, em especial quando se tomou de amores por uma colaboração muito ativa com Siouxsie and The Banshees (com que chegou a gravar), também puseram em causa a continuidade do conjunto. E sempre que houve despedimentos sumários de ambos os lados (Kim Deal nos Pixies, depois readmitida, Laurence Tolhurst nos The Cure), foram eles os principais decisores e porta-vozes das resoluções.

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Chegam a Portugal em situações distintas: os Pixies trazem, além dos hinos, um disco novinho, Head Carrier, lançado já este ano e de que foram extraídos três singles. Os The Cure não acrescentam novidades patrimoniais desde 2008, ano em que publicaram 4:13 Dream - mas não perdem impacto com este hiato, até porque há a promessa de serem mostrados temas inéditos. Em cada uma das salas (o Coliseu do Porto e a Meo Arena de Lisboa), juntar-se-ão os adeptos de longa data com os entusiastas recém-chegados. O que os une é algo que não se explica facilmente: carisma, eficácia, estilos próprios, percursos em que a intensidade ganha correspondência na resposta do público. Lá diz a velha máxima: mais vale cair em graça... Os Pixies e os The Cure repartem esse mérito - e não caíram.

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