PCP avisa que o governo só é de esquerda se alterar leis laborais

Jerónimo de Sousa diz ao executivo PS que tem de se pôr do lado dos trabalhadores. Há "uma inaceitável resistência" por parte dos socialistas em reporem direitos no trabalho
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Na festa dos 97 anos do PCP, Jerónimo de Sousa bem podia ter tido a canção Pode alguém Ser Quem não É, de Sérgio Godinho, como banda sonora para a sua intervenção de ontem à tarde.

Pedindo "mais força" para o PCP, por ser o partido que é "portador da política patriótica e de esquerda", o secretário-geral comunista marcou a pontaria ao governo do PS: "Ou pode considerar-se de esquerda aqueles que reduzem os direitos e alteram a legislação laboral para pior, que criam malfeitorias para os trabalhadores em nome dos interesses do capital?"

Não há dúvidas, como canta a música, que esse alguém não pode ser de esquerda se não o praticar: "Ninguém se pode afirmar de esquerda quando em relação aos direitos dos trabalhadores se põe de um lado e não do lado deles", atirou Jerónimo de Sousa no seu discurso às centenas de militantes que participaram no comício de aniversário do PCP, no auditório da Faculdade de Medicina Dentária de Lisboa.

Num ano em que o primeiro-ministro, António Costa, tem dito que o executivo socialista tem disponibilidade para alterar a legislação, o líder comunista desconfia. Recordando que o PCP apresentou propostas para a reposição de "direitos e rendimentos injustamente usurpados", Jerónimo acusou que estes direitos "tardam não só a ser concretizados como enfrentam uma inaceitável resistência por parte do PS e do seu governo".

O exemplo mais à mão foi a rejeição, a 2 de fevereiro, com os votos contra do PSD, PS e CDS, de projetos do PCP, BE e PEV para repor o pagamento do trabalho extraordinário e em dias feriados.

Na linha do que já vem defendendo desde a Festa do Avante!, em setembro, o PCP notou que o compromisso "de uns e de outros com o grande patronato" permanece nas questões essenciais por parte do PS, que "não descola das orientações" dos governos do PSD-CDS.

Para o secretário-geral comunista, a valorização do trabalho e dos trabalhadores é também "condição do desenvolvimento e do progresso social" que "não pode ficar à espera" da resistência socialista. As propostas que o partido apresentou são "viáveis", defendeu. Por isso, avisou, o PCP continuará a dar prioridade à reposição dos montantes e regras de cálculo das horas extraordinárias, ao pagamento do trabalho suplementar e à reposição dos montantes e regras de cálculo nas compensações por despedimento.

Contra "bloco central informal"

Num tempo de desanuviamento entre socialistas e sociais-democratas, depois da eleição de Rui Rio como novo líder do PSD, Jerónimo de Sousa deixou outro aviso para a possibilidade do regresso de "um bloco central informal" entre o PS e o PSD que atinja a Segurança Social sob a "máscara das reformas estruturais".

Desde a realização do congresso social-democrata, em meados de fevereiro, notou o comunista que se "acentuam expressões de consensualidade" e se regista a "assumida articulação entre PS e PSD em torno das reformas estruturais".

A "enganosa designação" de "reformas estruturais" esconde "medidas de agravamento da exploração do trabalho, de retrocesso económico e de injustiça social", atirou Jerónimo de Sousa, sublinhando que, no passado, resultaram em "desregulação económica, flexibilização laboral e desproteção social".

"Um caminho que pretendem não só consolidar, mas relançar afivelando a máscara das reformas estruturais e à sombra de uma suposta inócua descentralização (mas, de facto, uma transferência de encargos e desresponsabilização do Estado) e uma consensualizada política de investimentos e aplicação de fundos comunitários, vendidos como a coisa mais natural, tão natural como o ar que respiramos", acusou.

Para Jerónimo de Sousa, aqueles "consensos" constituem "um primeiro passo no caminho dos consensos e de restauração de um bloco central informal para voos mais largos, em que muitos aspiram a que a Segurança Social torne a marcar lugar".

com Lusa

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