Parlamento obriga May a apresentar plano B em 3 dias se acordo chumbar
Os ânimos aqueceram na Câmara dos Comuns quando, de forma surpreendente, o presidente John Bercow aceitou levar a votos uma emenda ao acordo do governo sobre o Brexit. A emenda, apresentada pelo conservador Dominic Grieve, foi aprovada por 308 votos a favor e 297 contra.
A emenda diz o seguinte: "No caso da moção sob a secção 13(1)(b) ser rejeitada ou emendada de modo a ser rejeitada, um ministro da coroa apresentará dentro de três dias de sessão uma moção sob a secção 13, considerando o processo de saída da União Europeia sob o artigo 50." Um palavreado pouco claro que vincula o governo a procurar uma alternativa o quanto antes, tendo em conta que faltam 79 dias para o Reino Unido sair do Brexit, isto caso a decisão não seja adiada ou revogada.
A decisão de John Bercow acolher a emenda para votação escandalizou uma parte significativa da bancada conservadora e surpreendeu o governo. O executivo - e os trabalhistas - acreditavam que o acordo do governo só poderia receber emendas por parte de um membro do governo, como explica a editora de política do Guardian, Heather Stewart.
Vários tories interpelaram o speaker, ao tomarem conhecimento da sua decisão. Uns puseram em causa a sua imparcialidade e a sua dignidade, outros como Iain Duncan Smith afirmaram não terem memória de um precedente destes.
Perante as baterias assestadas contra a cadeira do presidente, John Bercow sentiu-se na necessidade de defender a sua decisão. "O precedente não é vinculativo. Se nos guiássemos apenas pelos precedentes nada nos nossos procedimentos mudaria. Se as pessoas quiserem votam contra a emenda." E depois valorizou a sua função. "Há uma responsabilidade em dar voz à Câmara dos Comuns e a defender os direitos da oposição e dos pequenos partidos, seja no Brexit, seja em que tema for. O meu trabalho não é ser cheerleader do ramo executivo. O meu trabalho é defender os direitos da Câmara dos Comuns."
Nem todos os conservadores puseram em questão Bercow. Kenneth Clarke, que defende a permanência do Reino Unido na UE, mas que anunciou ir votar a favor do acordo de May, virou-se para os colegas de bancada e disse: "A quem está excitado sobre a hipótese de poderem ter direito a um voto, aconselho que vistam um colete amarelo e vão lá para fora". Uma referência ao pequeno grupo de pessoas que nos últimos dias se tem manifestado pelo Brexit, à porta de Westminster, de forma agressiva.
Durante o início do debate que se realizou antes, a primeira-ministra Theresa May disse que continua as conversações com a União Europeia e que tem estado a tentar melhorar a questão da Irlanda do Norte sobre o acordo de retirada do Reino Unido da UE - "morto como o dodó mais morto", como disse Pete Wishart, do Partido Nacional Escocês. O governo publicou hoje um documento intitulado Stormont Lock e pretende dar mais garantias de que a Irlanda do Norte será consultada sobre futura legislação que afete o território no caso de o mecanismo de salvaguarda (backstop) do Brexit ser ativado.
No entanto, Bruxelas e líderes europeus têm reiterado que não há mais conversações em cima da mesa; quanto à Irlanda do Norte, o partido unionista DUP, que tem servido de aliado no Parlamento aos conservadores, já reagiu à iniciativa, tendo voltado a dizer que só votaria a favor do acordo caso o backstop fosse eliminado do mesmo.
A primeira-ministra disse ainda que se no final de 2020 ainda não existir um novo acordo comercial com a União Europeia, o Parlamento votará em estender o período de transição ou em ativar o mecanismo de salvaguarda.
O líder da oposição, Jeremy Corbyn, voltou a criticar Theresa May por ter adiado a votação sobre o acordo para receber mais garantias de Bruxelas e ter falhado o objetivo. Lembrou que na noite anterior os deputados rejeitaram uma saída sem acordo. "Ninguém quer um Brexit sem acordo - são 4 mil milhões de libras desperdiçados."
O trabalhista lembrou que foi a primeira vez desde os anos 70 que o governo perdeu um voto relativo ao Orçamento. E atacou também os planos de contingência do governo. "O ministro dos Transportes está a gastar milhões de libras em empresas de ferries sem ferries. Devolva a palavra ao povo e deixe-o decidir numa eleição geral", afirmou.
Theresa May aproveitou o facto de Jeremy Corbyn ser eurocético. "Estou à espera do seu plano do Brexit. É a favor e contra o livre movimento, é a favor e contra os acordos de comércio, queria sair da UE e agora quer parar o Brexit", disse a governante.