Parlamento ajuda Marcelo a passar à margem do dossier eutanásia

O processo legislativo de legalizaçâo da eutanásia está a entrar na reta final. Não deverá porém chegar ao Presidente da República a tempo de o obrigar a tomar decisões antes das eleições
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O "convictamente católico" Marcelo Rebelo de Sousa tem feito todo o seu primeiro mandato sem dizer o que fará quando chegar a Belém uma lei legalizando a eutanásia - e deverá ir a votos dia 24 de janeiro nas eleições presidenciais sem ter de o fazer, mesmo estando agora o processo legislativo a entrar na reta final.

Neste sexta-feira, reuniu o grupo de trabalho constituído no âmbito da comissão parlamentar de Assuntos Constitucionais que está a tratar de fundir num só articulado os cinco projetos aprovados na generalidade em 20 de fevereiro passado (projetos do PS, BE, PAN, PEV e Iniciativa Liberal).

O trabalho de consolidação de um articulado final não foi porém concluído - o grupo de trabalho voltará a reunir.

A discussão na especialidade - artigo a a artigo - está portanto a terminar. Mas ainda faltam passos para serem dados. Depois de o grupo de trabalho terminar a tarefa de redigir um projeto, este deverá regressar ao plenário da comissão parlamentar de Assuntos Constitucionais para ser votado pelos deputados.

E só quando concluída esta votação é que o presidente da comissão - o social-democrata Luís Marques Guedes - remeterá o articulado para o presidente da Assembleia da República. Competirá a Eduardo Ferro Rodrigues a tarefa de mandar incluir o diploma num guião de votações.

A agenda do plenário da Assembleia da República já está fechada até 8 de janeiro. Se o processo for o normal, a lei não deverá ser discutida de novo no plenário - apenas votada. Isto a não ser que hajam partidos que o avoquem (no todo ou em parte). A seguir à votação final e global costuma acontecer, de novo em comissão, um processo chamado de "redação final" que demora mais alguns dias, limpando eventuais erros de escrita e de ordenação da numeração. Só depois o articulado seguirá do Parlamento para a Presidência da República.

Embora isso possa acontecer em pleno período oficial de campanha eleitoral para as presidenciais - de 11 de janeiro a 22, com a eleição marcada para 24 - a verdade, também, é que, para promulgar ou vetar política a lei (isto é, devolvê-la ao Parlamento), o Presidente da República dispõe de um prazo, vinte dias, que lhe permite atirar uma decisão final para depois das presidenciais.

Marcelo, na verdade, só estará apertado se receber a lei em janeiro e quiser mandá-la para o Tribunal Constitucional, para efeitos de verificação preventiva de constitucionalidade. Aí terá oito dias para se pronunciar, data contada a partir do dia de receção do diploma em Belém. Seja como for, a ter de tomar essa decisão durante a campanha - ela não será uma decisão política, antes jurídica.

Dito de outra forma: Marcelo - um católico convicto alinhado com as posições da hierarquia da Igreja (evidentemente contra a legalização da eutanásia) estará a remeter uma primeira decisão para o Tribunal Constitucional. O que estará em causa, nessa eventual circunstância, é a legalidade do diploma face ao nº 1 do artigo 24º da Lei Fundamental, que diz simplesmente que "a vida humana é inviolável".

O projeto de diploma final diz que a eutanásia também poderá ser feita em estabelecimentos privados de saúde e determina que, se um paciente ficar inconsciente depois de autorizada a sua morte assistida, o processo para imediatamente, só podendo ser retomado quando o paciente retomar consciência e reiterar a vontade.

Ontem à noite, na SIC, Marcelo deu a sua primeira grande entrevista como recandidato presidencial. A questão da eutanásia não foi matéria perguntada pelos jornalistas. Estes preferiram questionar Marcelo sobre, por exemplo, a polémica em torno do SEF. Marcelo Rebelo de Sousa admitiu a possibilidade de o organismo perder a competência de fiscalizar as fronteiras.

Quanto ao Novo Banco, reconheceu que o Tribunal de Contas "tem limites" na sua capacidade de auditar matérias bancárias "tão complexas".

Questionado, o Presidente recandidato admitiu que dará posse a um Governo do PSD apoiado no Chega, como aconteceu nos Açores. "Não vejo razão constitucional para não o fazer."

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