Paraguai expulsa traficante brasileiro que matou alegada prostituta na cela de prisão

Piloto, um dos líderes do Comando Vermelho, terá cometido o crime numa tentativa de evitar a extradição para o Brasil
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O narcotraficante brasileiro Marcelo Pinheiro, mais conhecido como Piloto, foi expulso do Paraguai depois de ter assassinado à facada uma jovem de 18 anos, alegadamente uma prostituta, na sua cela da prisão de alta segurança de Assunção. Um crime que deixou escandalizado o país e que levou também à demissão do topo da hierarquia policial.

Piloto, um dos líderes do grupo criminoso brasileiro Comando Vermelho (rival do Primeiro Comando da Capital), foi detido em dezembro de 2017 numa operação conjunta das autoridades brasileiras e paraguaias, com o apoio da agência norte-americana de combate ao tráfico de droga DEA. Atuava a partir do Paraguai desde 2012, depois de ter fugido do Brasil durante a ocupação da Favela de Manguinhos no Rio de Janeiro. Era então o chefe do tráfico neste local, tendo começado a vida no crime com roubos de veículos. A sua alcunha vem do facto de ter sido motorista do grupo criminoso. Era procurado por assalto à mão armada, homicídio, tráfico de armas e de droga. Arrisca uma pena de 26 anos de prisão.

Detido numa prisão de alta segurança em Assunção, enfrentava um julgamento no Paraguai por documentos falsos e posse ilegal de armas. Mas a procuradoria estava determinada a usar o "critério de oportunidade", isto é, abdicar da acusação, para acelerar a sua extradição para o Brasil. Tudo porque a pena que arriscava no Paraguai era inferior a dez anos e mantê-lo no país não era relevante, visto ter cometido crimes mais graves noutro país.

Mas Piloto queria evitar a extradição. "O Paraguai é o país da impunidade, da corrupção", disse numa conferência de imprensa a 6 de novembro, desde a prisão. "Você sabe que eu tenho um processo de homicídio, cá no Paraguai, que eu fiz e fui absolvido. Isso é impunidade ou não é? Você mata uma pessoa e é absolvido. Que bueno", afirmou.

Morte na cela da prisão

Às 12.35 do passado sábado, 17 de novembro, apesar de não ser dia de visitas, Lídia Meza entrou na cela de Piloto na Agrupação Especializada na Polícia Nacional. Este é, na realidade, um quartel policial que serve de prisão para polícias e militares e que acolhe prisioneiros considerados VIP, como guerrilheiros, narcotraficantes e políticos corruptos que pagam para ter direito a privilégios.

Lídia, de 18 anos, pediu autorização para a visita e esta terá sido autorizada porque Piloto não estava proibido de manter contactos com ninguém. A sua entrada foi controlada e verificada pelas guardas do sexo feminino. O encontro foi na cela porque, por ser um quartel policial usado para manter detidos os criminosos mais perigosos, não existe uma sala de visitas. As autoridades não sabem qual era a relação entre os dois.

Segundo a família, Lídia, natural de General Resquín, no departamento de San Pedro, trabalhava no cuidado a uma idosa de 90 anos (tinha folga ao sábado e ao domingo). Contudo, de acordo com o Ministério Público do Paraguai, ela trabalharia como prostituta e já tinha estado com Piloto em pelo menos outra ocasião.

O contacto entre ambos seria feito através de uma aplicação de telemóvel, com Piloto a ter um sem problemas na sua cela (possivelmente com cumplicidade da polícia).

Às 13.50, mais de uma hora depois de Lídia chegar à prisão, um dos guardas ouviu gritos vindos da cela do narcotraficante brasileiro. Quando entrou, encontrou a jovem estendida no chão, numa poça de sangue. Ainda foi levada para o hospital, mas já chegou sem sinais de vida.

Segundo o ministro do Interior do Paraguai, Juan Ernesto Villamayor, a jovem foi agredida com um golpe forte que a deixou inconsciente antes de ser apunhalada 16 vezes com uma faca de sobremesa. As autoridades acreditam que, com este crime, o narcotraficante queria evitar a extradição para o Brasil.

Expulsão

Mas, o seu plano falhou. Pelo contrário, o crime acabou por acelerar a sua entrega às autoridades brasileiras. Em vez de esperar pelo desenrolar do processo de extradição, o presidente paraguaio, Mario Abdo Benítez, resolveu expulsá-lo do país.

"Decidi expulsá-lo para que o nosso país não seja terra de impunidade para ninguém. Temos esta atribuição e a utilizamos. Já foi o suficiente: seis tentativas de fuga abortadas. Pedimos celeridade com todas as nossas vozes e nossa força, e agradeço porque recebemos todo o apoio da Justiça", disse o presidente, que tomou a decisão com base no cumprimento da lei de migrações do Paraguai, que autoriza a expulsão de estrangeiros que atentem contra a soberania nacional.

A mais recente tentativa de fuga foi em outubro, quando as autoridades travaram um plano que passava por explodir um carro armadilhado frente à prisão. Três supostos membros do Comando Vermelho foram mortos numa troca de tiros com as autoridades, tendo a polícia apreendido o carro com 84 quilos de dinamite e apreendido várias armas.

Entretanto, no início deste mês, a advogada argentina que defendia Piloto no Paraguai tinha sido assassinada. Os investigadores acreditam que Laura Casuso terá sido morta por um dos clientes (defendia vários narcotraficantes), descontentes por não ter obtido resultados satisfatórias durante o processo. Além de Piloto, Laura trabalhou para Jarvis Chimenes Pavão (extraditado para o Brasil em dezembro de 2017) e Elton Rumich, detido pelas autoridades brasileiras.

Piloto já se encontra na prisão federal de Catanduvas, no estado do Paraná, onde ficará isolado pelo menos durante 20 dias, sem direito a visitas (exceto as dos advogados). Só sairá da cela durante duas horas por dia.

Demissões

Após este caso, o presidente do Paraguai resolveu fazer uma limpeza na liderança da Polícia Nacional. Assim, Abdo Benítez demitiu o comandante Bartolomé Gustavo Báez López e o subcomandante Luis Pablo Cantero Vázquez..

O presidente tinha reunido com o Conselho de Segurança logo no domingo, para determinar as medidas a tomar depois da morte de Lídia, devido às suspeitas de cumplicidade policial.

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