"Os próximos tempos serão duríssimos. Por favor, ajudem-nos todos"
Foi com um apelo emocionado que a ministra da Saúde, Marta Temido, encerrou na tarde desta terça-feira um debate parlamentar quase totalmente dedicado à pandemia, no dia em que Portugal ultrapassou pela primeira vez a barreira dos 200 mortos. "Os próximos tempos serão duríssimos. Por favor, ajudem-nos todos", pediu Marta Temido, depois de responder com alguma exasperação ao deputado da Iniciativa Liberal, João Cotrim Figueiredo, que questionou a não abertura do Hospital de Miranda do Corvo.
"O que temos são camas e espaço. Há enfermeiros para mandar para lá? Há médicos para mandar para lá? Paremos de enganar os portugueses", retorquiu a ministra.
Se a intervenção de Marta Temido ficou marcada por este apelo, as de António Costa trouxeram pela primeira vez a assunção de que o alívio das restrições no período natalício foi um erro. "Nas circunstâncias em que estamos hoje, nunca nenhum de nós teria defendido aquelas medidas. São tomadas em função das circunstâncias e dos dados que temos", disse António Costa em resposta ao líder parlamentar do CDS, Telmo Correia. E disse assumir "plena responsabilidade por isso: "Se o senhor deputado acha que resolve os problemas do país dizendo que a culpa foi minha da forma como as famílias celebraram o Natal e que é por isso que estamos como estamos, ofereço-me já a esse sacrifício. É assim que eu vivo com a minha consciência e assumindo plena responsabilidade pelas circunstâncias em que o país está hoje".
Durante o debate, António Costa disse que tudo fará para não encerrar os estabelecimentos escolares, como aconteceu no primeiro confinamento. "Estamos a bater-nos para manter as escolas abertas, sabemos o enorme custo social que representa fechá-las", defendeu António Costa, sustentando que o efeito se prolongará por décadas.
Mas esta é uma decisão sujeita a revisão e que será invertida num cenário em que a variante inglesa se dissemine em Portugal, advertiu o primeiro-ministro: "Se para a semana ou daqui a 15 dias se souber, se já nesta quarta-feira se souber , que a estirpe inglesa se tornou dominante no país, então, muito provavelmente, vamos ter mesmo de fechar as escolas".
Nesta altura, de acordo com os números avançados pelo líder do Executivo, há 13 escolas encerradas no país (num total de 5440 estabelecimentos escolares) devido a surtos de covid-19. E há, no total, 39736 alunos (em mais de um milhão) em regime de aulas não presenciais. Segundo o primeiro-ministro, o regime misto (presencial e online) ainda não foi usado porque não se revelou necessário.
Costa anunciou que vai iniciar-se esta quarta-feira uma campanha de testes rápidos nas escolas para detetar casos de covid-19, que começará pelos concelhos em risco extremo de contágio. O PSD lamentou "só agora" avance esta medida."Vendo que os grupos etários mais afetados são os jovens entre os 13 e os 25 anos, qual a razão para não ter começado mais cedo?", criticou o líder parlamentar social-democrata, Adão Silva, questionando também o porquê de não se ter iniciado "no começo do ano letivo a distribuição de computadores" prometida por Costa em abril de 2020.
António Costa admitiu que o Governo não cumpriu os objetivos quanto à distribuição de computadores, mas rejeitou que isso tenha pesado na decisão de não encerramento, como se sugeriu nas bancadas da oposição. Segundo o primeiro-ministro "foram distribuídos até agora cem mil computadores que cobriram todos os alunos dos escalões A e B" e estão "adjudicados os 350 mil restantes".
Com Catarina Martins, do Bloco de Esquerda, a insistir que o Governo deve avançar com a requisição civil ao setor privado da Saúde - "Não espere pela rutura do SNS para requisitar os privados" - Costa disse que isso será feito se for necessário, o que até agora não aconteceu. Ainda que sublinhando que o privado segue uma lógica legítima, o primeiro-ministro fez questão de assinalar que no dia de hoje Ministério da Defesa disponibilizou mais camas que todo o setor privado nestes meses.
"Só hoje, o ministro da Defesa Nacional conseguiu mobilizar mais 140 camas [para doentes covid] e 10 camas de cuidados continuados integrados, o que significa que são mais que aquelas que os privados disponibilizaram no seu conjunto para combater a covid-19", disse o primeiro-ministro.
Costa avisa que o combate contra a pandemia de covid-19 "ainda está para durar por muitos e longos meses" e vai perdurar até que "60 a 70% da população estiver imunizada".
Quanto à vacinação, o primeiro-ministro sublinhou que foi recomendada uma aceleração da vacinação contra a covid-19 nos lares, afastando qualquer "risco de adiamento" da segunda toma, que pode ocorrer até 42 dias depois da primeira.
Quanto à possibilidade de o país recorrer à compra de outras vacinas, fora do quadro da União Europeia, levantada pelo PCP - "Portugal não pode ficar refém da UE e das farmacêuticas" - argumentou Jerónimo de Sousa - Costa afastou esse cenário, dizendo que em nenhuma circunstância serão usadas vacinas que não tinham sido licenciadas pelas autoridades europeias.