"Os músicos são uma espécie de astronautas"

Ela é a voz e o rosto sorridente do Couple Coffee, o casal de músicos bebedores de café e que acaba de lançar o disco <em>Fausto Food</em>. Filha de Alípio de Freitas e de Wanda Cozetti Marinho, Luanda conta como cresceu entre Brasília, Bissau, Rio de Janeiro e Lisboa.
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A 16 de novembro, ela e o marido Norton Daiello, o casal café, mostram o disco ao vivo no Paradise Garage, em Lisboa. Esta é uma conversa que fala de uma aranha alentejana chamada Grandolina que canta a Grândola Vila Morena e reconstrói teimosa a sua teia. E que traz a saudade do pai, "intrometida nas coisinhas menorzinhas".

Acabam de lançar o Fausto Food, com canções do Fausto Bordalo Dias. Não é fast food?

Não, não é fast food. Engraçado, acabou por ficar essa associação mas quando pensei em Fausto Food pensei mesmo em faustoso, luxuoso, chique, de pompa e circunstância. Fazer essa brincadeira com fast food obriga a pensar o porquê. Fui pesquisar e coitadinha da fast food, ela ficou associada à junk food, à comida de plástico.

Mas nem toda a fast food é?

E nem começa assim. A fast food é a comida das migrações, das colocações dos outros povos nas outras cidades. É a comida rápida do trabalhador, da classe operária, uma comida que tinha que levar e comer, e tinha que ser proteica e calórica e dar conforto.

A Luanda nasceu há 49 anos.

E tenho muita implicância com o nove.

Porquê?

O nove é aquele número engraçado que ainda não chegou e está quase lá. Tive sempre isso. Quando tinha nove queria fazer dez, quando fiz 19 queria fazer 20, quando fiz 29 queria fazer 30, quando fiz 39 queria fazer 40 e agora fiz 49, quero fazer 50. Mas ainda falta.
Acaba de fazer anos, em setembro. Tem muito tempo para se habituar à ideia dos 49.

Cada vez mais eu aprendo que o tempo é um conceito muito elástico, um ano que pode ser muita coisa e um dia pode ser mais ainda.

Como começou a cantar? Parece natural na sua voz, tem a música no corpo.

Comecei a cantar profissionalmente aos 17 anos em pianos-bares em Brasília e fazia parte do Coro do Teatro Nacional e vários outros coros em Brasília. Dez anos da minha vida foram dedicados concomitantemente à música clássica e à música popular, ao jazz. Nunca fiz outra coisa. Mesmo as coisas que não estavam diretamente ligadas ao palco estavam ligadas à música. Fazia workshops, preparava atores, cantava em peças, sempre ligada à música. Nunca fui uma menininha que ficava de microfone à frente do espelho, nunca pensei ser cantora. Eu escolhia outra coisa e de repente aquela outra coisa tinha a ver com música de novo, já estava lá. Acho que virei cantora para ter que ver com músicos, eu adoro os músicos. Gosto de conviver com eles, ver o que eles pensam, são uma espécie de astronautas.

Astronautas?

Os músicos são uma espécie de astronautas, pilotos de Fórmula 1, têm uma habilidade engraçada. O cantor também tem, traz dentro de si. É um instrumento que tem de se trabalhar sozinho. Quando vejo um cara que tem uma habilidade assim, que os dedos pisam aquilo tudo e rapidamente, nunca deixo de me maravilhar.

No caso da Luanda o instrumento é a voz, e tem de ser trabalhada.

Já foi muito mais. Tenho toda uma escola, sou licenciada em canto, mas no dia-a-dia um bocado dessa técnica, desse treino, vai por água abaixo. Tento nunca entrar no palco com a voz fria, mas também não entro com a voz super quente. Cada cantor tem os seus maneirismos. Há cantores que gostam de entrar com a voz superaquecida, eu gosto de entrar com a voz ainda dando um bocado de combate, para ir vendo como é que dou mais. Cada voz é uma diferente, quando aquece muito ela fica plástica. Então a voz é a do dia.

Não gosta de cantar sozinha? Como apareceu o Couple Coffee?

Nós tomamos mesmo muito café, não é uma lenda. Eu tinha o meu disco próprio, o Norton tinha o dele e já estávamos naquela de vir para Portugal, eu já tinha um contrato. Aí pintou uma chance de fazer um espetáculo num teatro. Eu e ele estávamos juntos e eu já tinha percebido que tínhamos uma história para contar musicalmente. O Norton também está na música desde a adolescência, nunca fez outra coisa. Perceber o que já não se quer mais fazer como som é muito interessante. Eu já vinha nesse processo, ele também. Eu tinha esse proposta para o Espaço Correia Lima, um teatro pequeno no Rio de Janeiro, e tive sempre curiosidade de fazer um show de baixo e voz, porque o baixo é o meu instrumento predileto, sempre foi.

O baixo?

Sempre foi. Acho que a culpa é do Paul McCartney que é o meu amor.

O Norton está ali atrás do vidro.

Mas ele com o Paul McCartney concorda bravamente. Eu tenho outros mas ele concorda. No Rio de Janeiro, a minha alcunha era "presidente do sindicato dos baixistas". Sempre foi o meu instrumento queridão, toquei sempre com baixistas incríveis.

O que é que o baixo lhe dá?

Segurança, primeiro. Eu acho que, como diz o Norton, é o coração, o bater do coração. Talvez a bateria seja o fluxo sanguíneo, alimentando as artérias o tempo todo. O Paul McCartney é o baixo mais melódico do mundo, talvez eu tenha ali sido apresentada a uma forma diferente do baixo, como instrumento cantor, protagonista. Eu sempre considerei o baixo muito protagonista, e daí encontrar o Norton Daiello que além de ser um baixista de excelência é um protagonista no seu ofício, tem a curiosidade do intérprete que para mim foi muito importante. Fizemos um repertório de baixo e voz, com curiosidade para ver se funcionava. Eu tinha já na cabeça o barangandan, o Conversa de Botequim. Não sabíamos se ia dar certo, não era "vamos fazer um duo de baixo e voz e conquistar a galáxia".

Isso passava-se em 2005?

Em 2004. O Couple Coffee tem basicamente o mesmo tempo que o Norton e eu temos como casal, é bonito, é um projeto nosso, é como se fosse o nosso filho.

É o casal café?

Exatamente isso. Íamos ao cinema, no Rio de Janeiro, de bicicleta, com a Gabriela de Chevalier, uma amiga nossa, e estávamos atrasados. Largámos a bicicleta mas queríamos tomar um café, e a Gabriela ficou furiosa: vocês querem tomar café, já estamos atrasados, que mania, parece um casal café. Uau, casal café, é mais ou menos isso, mas fica esquisito, então ficámos couple, couple of coffee, cup of coffee. E assim chegamos ao Couple Coffee, que em Portugal é bonitinho, chamam-nos Couple.

Depois vieram para Portugal.

Logo. Chegámos em 2005 com um disco semi-pronto, que foi um plano B. A vida é feita de planos B, uma pessoa foca-se muito no plano A mas às vezes o plano B é que é o grande plano. Enquanto se está distraído fazendo o grande plano, o plano B vai avançando. A minha mãe estava doente, entre o diagnóstico e a morte foram quatro semanas. Nós estávamos fazendo o show, e eu tinha um outro disco para lançar aqui, o Dia de Luanda. De repente percebi: vamos para Portugal com os meus filhos, temos de trabalhar rápido, esse repertório é diferente, somos só nós dois. Liguei para um amigo e disse: "preciso de gravar". Gravámos em três noites, terminámos no sábado de manhã, peguei o avião, fui para Goiânia desligar as máquinas da minha mãe. Nessas horas a força vem sabe-se lá de onde, ainda mais quando se tem filhos o assunto muda de figura.

Que idade tinham os seus filhos?

À época tinham 14 e sete, e minha mãe era o universo deles, foi mesmo duro. Como agora foi para eles também, a morte do meu pai. É a vida.

Já vamos falar da sua mãe e do seu pai.

Tive sorte, tive dois malucos como progenitores mas acho que funcionou. Chegámos aqui com esse disco semi-pronto e fui ter com o Gonçalo Riscado e o Alex Cortez, da [editora] Transformadores. São os nossos amados, pessoas a quem devemos o ser o Couple Coffee. O meu pai foi lá comigo, fez todos os contactos. E eu falei do disco novo e disse: ouçam e digam logo se fazemos ou se ficamos com o outro. E eles deram logo o tom do que nós seríamos em Portugal. Chamaram o JP Simões, o Vitorino, o Gabriel Gomes e o Serginho Costa, que fizeram as participações especiais no disco. É a minha postura e do Norton, a postura do músico de jazz, do músico brasileiro também um pouco, de conhecer o som de fulano e beltrano e fazer outro som juntos.

Desde então nunca mais pararam de fazer esse tipo de trabalho, de ligação aos outros, e culminam agora com canções do Fausto que nós conhecemos mas a que dão uma nova vida. Como reagiu o Fausto?

Muito bem, agora já podemos falar porque ele já falou, está tudo tranquilo. Ele ficou emocionado. Falámos com ele, tivemos esse cuidado, porque a gente mexe muito, mexe na forma, coisas caras ao compositor. Ele só ouviu o disco pronto, mixado e masterizado.

Não acompanhou?

Foi acompanhando, almoçávamos juntos e dizíamos o que estávamos a gravar, as canções que escolhíamos, é um disco de rock & roll. Ele foi de uma generosidade enorme porque em nenhum momento - e a gente levou dois anos a gravar - ele disse "se calhar era melhor mostrarem-me alguma coisa". Mais ainda porque queríamos fazer um novo som. O Norton queria trabalhar como arranjador para outros instrumentos, tocar outros instrumentos, não ser o baixista que tem a obrigação de fazer a linha harmónica, podia ser baixista mesmo.

Toca também guitarra elétrica no disco.

E muito bem. Chamámos o Renato Junior para fazer a produção connosco, foi um ponto muito importante, porque queríamos dar um outro aproach mais forte, e o Renato foi incrível, deixou a gente trabalhando, procriando no aquário durante um ano e depois no final é que veio. E o Nelson Carvalho também na mixagem foi incrível.

E depois ainda tiveram o Pedro Jóia, o Alexandre Frazão...

Resolvemos: vamos fazer um disco rock & roll, então na bateria queremos o Frazão. Só no Foi por ela é que não é ele, é uma gaja, a Sonia "Little B" Cabrita, com o seu banquinho de alcinhas. Chamámos o Flak, porque também queríamos uma outra sonoridade ali. Já tínhamos dito que queríamos trabalhar juntos e eu nunca perco isso da cabeça. Mas tem que ser em alguma coisa que a pessoa brilhe, não é "vou lá fazer porque a Lulu pediu". E o Zé Peixoto no violão, naturalmente. E aí veio o Jóia. Nesse disco temos os sopros pela primeira vez, não são usados como naipes, são usados como linhas, com o André e o Zé Conde, aqueles gémeos incríveis. Deve ser uma mãe feliz, acorda e vê aquelas duas pessoas iguais e talentosíssimas. Nunca sei quem é quem, é um inferno. E o Rúben da Luz. E as vozes queridas, o Caracol, a Ushia - num disco do Fausto tinha que haver uma galega, porque o Fausto também é um apóstolo na Galiza - o Carlos Blanco e a Viviane.

Com quem já tinha uma colaboração no projeto Rua da Saudade.

Nós temos uma conta, nós as duas, porque no Rua da Saudade quando o Renato fez o casting, quem ia cantar com quem, eu e a Vivi ficámos sem dueto e ficámos tristes. Claro, não dá para todo o mundo fazer dueto com todo o mundo e dizíamos "um dia temos de remediar isto". Íamos participando nos shows uma da outra, fazemos muitas coisas juntas. A Viviane e o Tó [Viegas] são família, esse disco foi pensado, inventado em muita conversa naquela varanda de Olhão. Foi o mais demorado de todos os nossos discos.

Vamos falar da sua mãe, que morreu em 2005. Como era ela?

Se acham que eu sou muito alegre, a minha mãe era o triplo. Muito alegre, muito perspicaz, muito arguta, muito inteligente, tinha uns olhos muito rápidos. Às vezes o olhar dela pensava mais rápido do que ela. Uma mulher de armas. Teve uma vida rocambolesca desde o início. Casou com 19 anos, ficou viúva com 22, o meu irmão nasceu quatro dias depois de o pai morrer. Tudo foi sempre um bocado épico na vida da mamãe. Vinha de uma família muito tradicional de Goiás, o meu avô foi secretário de Segurança, ela teve uma vida super burguesa, passava férias no Copacabana Palace. Mas sempre percebendo que o mundo tinha alguma cosa estranha. Ela era muito inquieta e quando acabou o curso normal, o avô disse: agora vai casar e ter filhos. E minha mãe respondeu "quero saber mais". Ele abriu a biblioteca - tinha milhões de livros - "estão aí os teus professores". A minha mãe só foi estudar aos 30 anos, quando o meu avô morreu. Veja o que é a vontade de uma pessoa.

Foi para que universidade?

Foi para a PUC, Católica, em Goiás fazer História. A partir daí, é tudo muito rápido. Aos 41 ela estava na cadeia.

Estamos a falar do momento mais feroz da ditadura militar.

Sim, a minha mãe foi para a luta armada, para a clandestinidade, é presa política durante cinco anos.

Qual é o nome dela?

Wanda Cozetti Marinho. Por vezes aparecia Vanda e ela dizia "o meu W é tão bonito...". Ela foi para a luta armada e foi presa, ela e o meu pai.

Alípio de Freitas.

O casal revolucionário. Depois de cinco anos na cadeia fica um ano com liberdade condicional. Eram julgados pelas três forças - Exército, Aeronáutica e Marinha - tinha sempre alguma coisa que faltava. É condenada de novo mas consegue fugir do Brasil e vai para a Guiné-Bissau. E eu vou-me encontrar com ela até que ela decide que é o momento de voltar para o Brasil, quando eu tinha 15 anos.

Antes da independência da Guiné?

Não, depois. Nós fazemos parte da imensa leva de cooperantes. Tenho muita saudade da Guiné, foi um tempo muito feliz na minha vida, meu coração é bem guineense. Tenho a minha sobrinha enterrada lá, a primeira filha do meu irmão nasceu lá e morreu poucos dias depois. Tenho raízes na Guiné.

Voltaram para o Brasil já sem ditadura?

Médio, não é, tinha tido uma abertura mas ainda não tinha havido a primeira eleição direta, estavam naqueles estertores finais.

Onde estava o Alípio nessa altura?

Estava em Moçambique.

O seu pai e a sua mãe conheceram-se no tempo da guerrilha?

No tempo da guerrilha no Brasil. Eu nasci em 1968, devem ter-se conhecido em final de 1966.

E não viveram juntos muito tempo porque foram presos entretanto?

Eram casados, cada um na sua cadeia, depois quando ela saiu ia visitá-lo. Mas eu nunca tive os meus pais vivendo juntos, não me lembro, só quando era bebé, eles contavam essas histórias. Achavam-me sempre muito excêntrica e muito divertida, devia ser super mimada, devia poder fazer o que queria.

O seu pai, nascido em Portugal, ex-padre, também viveu esses anos sempre em grande ativismo político.

Na verdade o meu pai mudou de hábito. Ele foi padre porque queria estudar, a história é essa. A vocação dele era o Homem, a Humanidade, e não há vocação mais divina do que essa. Fez o seminário em Bragança e, depois de um tempo numa paróquia, foi para o Brasil para dar aulas e assumir lá uma paróquia. No Brasil sou conhecida como "a filha do padre Alípio".

O seu nome é uma homenagem a uma cidade.

Mais a uma ideia, a uma ideia do que era o MPLA, do que eram as lutas de libertação daquela época. Os quadros de esquerda do planeta trocavam informações entre eles. O meu pai sempre teve muita ligação ao pessoal do MPLA, da Frelimo, do PAIGC, a nossa ida para a Guiné-Bissau não é escolhida ao acaso do vento. Luanda era um nome bonito e naquela época havia duas canções, do Sérgio Ricardo e do Geraldo Vandré, que falavam em Luanda. E o meu pai decidiu chamar-me Luanda. Se eu fosse menino acho que nem tinha nome até hoje, chamavam-me "o menino que nasceu e se ia chamar Luanda". Ia ser bem comprido.

O seu pai morreu há pouco tempo [13 de junho de 2017] e no fundo conviveu mais com ele em Portugal do que no Brasil.

Diretamente e em sequência, sim.

Como é que uma pessoa chega a um pai que conhece mal, que não está presente?

O meu pai sempre foi um grande amor, a minha mãe dizia muito - "vocês são tão parecidos". Somos parecidos em muita coisa, chega a ser assustador. Parecidos no temperamento, nas atitudes. Na cadeia ele estava todo o tempo à minha disposição nos fins-de-semana, depois saiu e o exílio separou-nos, tivemos vidas separadas, as distâncias eram mais complicadas naquela época. Estamos falando de um tempo em que as distâncias só se resolviam de avião, "de jangada leva uma eternidade, de saveiro leva uma encarnação" como dizia o Gilberto Gil [Parabolicamara]. Agora é mais fácil as pessoas manterem contacto umas com as outras. Quando a Luísa tinha dois anos e o Bruno uns oito...

São os seus filhos?

...sim, Luísa e Bruno. A Guadalupe [Portelinha] que é a boadrasta, a esposa dele, um dia disse-lhe: você e a Luanda têm de acertar um jeito mais constante de se verem, os teus netos estão crescendo. A distância tinha-se colocado entre nós, a gente se amava mas se via pouco, ele ia ao Brasil de férias. E aí ele passou a ser aquele avô e aquele pai do Natal, do vovô querido, do presente. A primeira vez que a Luísa que se encontrou com ele, tinha dois anos, sentou-se no colo e falou: Você é o meu vovô? Sim. O seu cabelo fugiu da sua cabeça para a sua cara?

Porque ele era careca e tinha barba.

Sim. A vida foi-se encarregando de nos botar próximos de novo, muito mais próximos. Ter convivido com ele esses doze anos foi maravilhoso, e para os meus filhos também. Quando a pessoa morre, parece aquele fogo de artifício. Depois o corpo parece que esfria um bocadinho e se calhar já estamos aguentando um pouquinho. Aí de repente vem aquele momento em que a morte se intromete na coisinha menorzinha, é aí que o bicho da saudade vai pegar. Ontem estávamos na casa do Alvito, na casa dele.

No Alentejo?

Sim. Era a casa dele, ele estava muito lá, e agora vamos lá mais vezes até para cuidar das plantas que gritam socorro. Ontem, o gás acabou. Nós somos bichos de cidade, estamos habituados a gás canalizado. Ali é de botija e acabou, e pronto, temos de comprar outra. E de repente deu-me uma tristeza danada, porque a vida acaba nas pequenas coisinhas e eu dei-me conta de que aquela era a última botija de gás que o meu pai tinha comprado, que tinha realmente terminado mais uma coisa da minha vida com ele naquela casa. E aí entrei numa que umas borboletinhas brancas do Alvito são o papai. Por coincidência ou não, a cada hora que eu estou aflita aparece aquela borboletinha branca. Essa e a Grandolina, a minha aranha de estimação. Ela toma conta da casa, eu vou, tiro a aranha e ela canta a Grândola Vila Morena na minha cara e reconstrói a teia dela.

A aranha chama-se Grandolina?

A minha filha não é tão poética assim, já me disse que a Grandolina já vai na 15.ª geração, que não deve ser a mesma, mas eu encalhei que ela é a Grandolina, a aranha alentejana, cheia de vigor e força.

E canta a Grândola Vila Morena.

Na minha cara, e ainda põe a teia em lugares que eu não sabia que ela ia colocar. Pô, Grandolina, jura?

Luanda, é uma vida cheia?

É sim. É bom.

E cheia de música. O que vai acontecer com este disco?

Está tudo vindo por aí, a nossa agência está a todo o vapor marcando as datas. Eu sou a rainha das datas erradas, para mim dia 3 é terça, dia 2 é segunda. Vamos ter uma festa de lançamento em novembro, com todos os convidados, um lugar para a gente apresentar um bocado isso, como uma fiesta. Vamos fazer um show num teatro de Lisboa no ano que vem, a agora vamos gravar um clip novo, com o Foi por ela.

Foi por ela com uma gaja na bateria?

Não sei quem vai ser, não vou intrometer-me nessa história, deixei o pessoal criar, estão animadíssimos. Eu sou muito workaholic, muito pegadinha, tudo com os detalhezinhos, aquela Libra com céu de trabalho em Virgem. Mas como boa libriana também, tem uma hora que eu falo OK, agora é a hora de você se divertir. Talvez seja essa a graça de fazer um trabalho: tem uma hora que tem de deixar as outras crianças brincarem com o seu carrinho, se não as crianças ficam tristes.

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