Origem étnica nos Censos. Grupo que teve a ideia quer reunião com a ministra
Um grupo de cinco pessoas que fizeram parte do Grupo de Trabalho "Censos 2021 - Questões Étnico-Raciais" pediu uma audiência com a ministra da Presidência e da Modernização Administrativa, Mariana Vieira da Silva, para apresentar a sua discordância da decisão do INE (Instituto Nacional de Estatística) de excluir dos censos a pergunta sobre a origem étnico-social da população portuguesa.
"A iniciativa da criação do grupo partiu do Governo e cabe-lhe esclarecer o que pretende fazer com as circunstâncias que ditaram a criação deste grupo uma vez que não se alteraram de então para cá. Compete ainda ao governo assumir como pretende responder aos desafios colocados pelos movimentos sociais e pelas instâncias internacionais sobre a necessidade da recolha de dados étnico-raciais para efeito de elaboração de politicas públicas de combate aos desigualdades étnico-raciais", referem os signatários de uma carta que foi endereçada à ministra com a tutela do INE. São Anabela Rodrigues, Cristina Roldão, José Semedo Fernandes, Mamadou Ba e Marta Araújo.
Na missiva, fazem o historial do processo de abordagem à introdução da pergunta sobre a origem étnico-social no Censos, recordando passos dados pelo Governos e declarações de ministros desde 2017. Em março passado, apontam, saiu o relatório do Grupo de Trabalho (GT) Censos 2021 em que a "esmagadora maioria dos membros do GT - entre eles representantes de comunidades racializadas e imigrantes, assim como alguns dos maiores peritos nestes domínios e diversos na sua proveniência institucional - se posicionou a favor da introdução da questão (9 membros a favor face a 4 contra)", esclarecem.
Agora, com o parecer negativo do INE, estes cinco elementos questionam a forma como o INE chegou à decisão e, sobretudo, os seus fundamentos. "Como se compreende que um organismo de carácter técnico e especialista em estatística venha a apresentar uma perspetiva política - aliás, de acentuada relutância política? Por um lado, rejeita a inclusão da pergunta no Censos mas propõe novamente questionários ad hoc. Ao contrário do que poderíamos esperar daquela que é a maior instituição de produção estatística, o INE defende que para conhecer o racismo e desigualdades étnico-raciais se utilizem inquéritos não representativos da população ou dos grupos racializados. Ora, inquéritos e estudos dessa natureza já vão existindo em Portugal, sem que daí adviesse mudança nas políticas públicas sobre o racismo e desigualdades étnico-raciais", lê-se na carta enviada à ministra da Presidência.
"Como se explica que um parecer desta natureza mostre um alinhamento tão explícito com o poder instituído? Neste parecer são apenas invocados os argumentos daqueles que são contra a recolha, estando ausente qualquer ponderação e problematização séria dos argumentos a favor. São elencados os riscos relativos à segurança dos dados, à possível descredibilização da operação censitária e o risco de apropriação discriminatória. Ora, em nenhum lugar do parecer é dito - mas deveria - que esta recolha de dados permitiria desmontar muitos dos preconceitos racistas que existem sobre as comunidades racializadas; que a recolha e publicação destes dados permitiriam o reconhecimento da diversidade da sociedade portuguesa e das desigualdades étnico-raciais, abrindo uma discussão no espaço público, e sobretudo dentro das instituições, sobre o combate ao racismo e desigualdades", apontam os cinco subscritores da carta.
Neste ponto não se inibem de criticar o representante da população cigana no GT. "Em nenhum lugar se refere a posição favorável dos afrodescendentes e imigrantes representados no GT ou de representantes da população cigana que, não fazendo parte do Grupo de Trabalho, se posicionaram publicamente a favor. A posição do representante da população cigana no GT é apenas convocada na medida em que vai ao encontro do status quo."
É neste quadro que Anabela Rodrigues, Cristina Roldão, José Semedo Fernandes, Mamadou Ba e Marta Araújo pedem a audiência ao membro do Governo, com carácter urgente, dada a "tomada de decisão do dia 17 de junho, no Salão Nobre do INE, "onde mais de 20 representantes institucionais - nenhum deles negro, migrante ou cigano - decidiram que continuaremos a fingir que o racismo não é parte estrutural da sociedade portuguesa".