O suicídio (político) como prova de vida

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Rui Rio admitiu o cenário de saída da liderança do PSD em caso de derrota nas próximas autárquicas, contrariando a tese de que os sufrágios locais não têm leituras nacionais. Aliás, fez depender o todo dessa parte: cada voto nas freguesias, nas Câmaras e Assembleias Municipais pesam na balança da legitimidade democrática de Rio.

Em teoria, e a priori, todos temos a perceção dessa consequência. Na prática, agora não sobram dúvidas porque ficamos com a certeza, depois de Rui Rio jogar tudo nas autárquicas, transformando-as na sua prova de vida à frente do partido, pela antecipação, entretanto, da hipótese de suicídio político.

Na verdade, nunca seria de outra maneira. Contudo, dizê-lo e assumi-lo perante a opinião pública e perante os eleitores, a cerca de três meses das eleições, com o PSD em ebulição é, no mínimo, arriscado.

Poder-se-ia ver nisto estratégia, mas os portugueses estão todos a assistir apenas e só à falta de estratégia de Rui Rio, marca que é cada vez mais sua, e de um PSD, que é cada vez menos seu, por ter uma parte a lutar pela manutenção nos órgãos nacionais e outra parte a pensar na melhor data para o próximo congresso nacional e no melhor discurso de alternativa para a segunda-feira da ressaca eleitoral autárquica. O assunto da demissão, enquanto hipótese, no discurso de Rio poderia tratar-se de bluff, mas está longe de o ser, pois todos conhecemos o baralho que tem em mãos e a dificuldade de tirar qualquer carta da manga, daqui até à hora da saída. Com outro jogo poderia soar a ironia, mas nestas condições é puro desnorte.

Rio entrou - num mundo político de onde nunca saiu - com a imagem do homem sério, que não se discute nem discuto, com a vontade de mudar o que de estrutural havia a mudar, mas sem força para atrair o PS e o Governo à consumação das grandes reformas - a única novidade conseguida, mais na forma do que na substância, foi o primeiro passo da democratização das Comissões de Coordenação e de Desenvolvimento Regional, com a eleição dos respetivos Presidentes e Vice-Presidentes pelos autarcas. O líder político convicto e disruptivo está a ser ultrapassado pela incompetência perante as responsabilidades e os desafios nacionais.

Rui Rio suicidou-se politicamente ao apostar tudo num futuro esgotado, apontando-o como prova de vida política.

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