O Sr. Camomila que é acusado de ser apenas uma marioneta de Renzi
Paolo Gentiloni chega a primeiro-ministro de Itália já sabendo que tem os dias contados à frente dos destinos do país - e nem terá direito ao período de "lua-de-mel" político que caracteriza os novos executivos. Tudo porque o ex-chefe da diplomacia de Matteo Renzi (o qual se demitiu depois de ter perdido o referendo constitucional) é acusado pela oposição de ser uma mera marioneta do antecessor, que mantém a liderança do Partido Democrático e continua a ser a melhor opção do centro-esquerda para vencer as próximas eleições italianas.
"O Demolidor passa a campainha de presidente do Conselho [chefe do governo] ao Sr. Camomila", escreveu o diretor do jornal Il Fatto Quotidiano, Marco Travaglio, usando as alcunhas de ambos para dar uma ideia da diferença de personalidades. Se Renzi, de 41 anos, era o jovem exuberante que chegava ao poder em 2014 para abalar o sistema, Gentiloni, de 62 anos, é o antigo jornalista de berço aristocrático, discreto, que prefere o compromisso ao confronto. E que deve a sua ascensão política a Renzi, com o La Stampa a dizer que é um maior apoiante do ex-primeiro-ministro do que o próprio.
"Ele é apenas uma marioneta de Renzi. Eles precisavam de alguém para pôr lá e dar tempo a Renzi para limpar a sua imagem depois do desastre do referendo", disse Manlio di Stefano, deputado do Movimento 5 Estrelas - partido antissistema e anti-Europa que ameaça o Partido Democrático (PD) nas sondagens.
O facto de ter feito poucas mudanças em relação ao governo de Renzi não ajuda a afastar as críticas de que é uma marioneta. A sua função será fazer uma reforma política que acabe com o bónus de deputados para o partido que conseguir mais de 40% dos votos na primeira volta ou vencer na segunda - para se poderem antecipar as eleições previstas só para maio de 2018. Outro desafio é garantir a solvência do sistema bancário, que está em risco de entrar em rutura e criar uma nova crise na zona euro.
Mas, afinal, quem é Gentiloni? Até há dois anos, era um quase desconhecido dos italianos. Foi em outubro de 2014 que saltou para a ribalta quando Renzi o escolheu para substituir Federica Mogherini - que foi para chefe da diplomacia europeia - à frente dos Negócios Estrangeiros. Nesse cargo, os analistas dizem que teve um bom desempenho face ao caos na Líbia, à crise dos refugiados e à tortura e assassínio de um estudante italiano no Egito.
O antigo jornalista já tinha sido ministro, no segundo governo de Romano Prodi (2006-2008), mas de uma pasta menor, a da Comunicação. Nessa ocasião tentou, sem sucesso, acabar com o império de media do ex-primeiro-ministro Sílvio Berlusconi, que voltaria depois novamente ao poder. Em 2012, concorreu às primárias do PD para a câmara de Roma, ficando em terceiro e último lugar com 11% dos votos.
Jornalista aristocrático
Gentiloni nasceu a 22 de novembro de 1954, em Roma, e é descendente do conde Gentiloni Silveri, tendo por isso direito ao título de nobre de Filottrano, Cingoli e Macerata. Atraído pela esquerda radical nos tempos de estudante, deixou cair os dois apelidos. Passou de ser "um dos rapazes que jogava voleibol" para ser "um dos homens que fumava tudo", terá dito à revista Magazine .
Licenciado em Ciência Política na Universidade La Sapienza, de Roma, Gentiloni trabalhou como jornalista na La Nuova Ecologia, revista oficial da associação ambientalista italiana Legambiente. Foi aí que conheceu Francesco Rutelli, dos Verdes, de quem foi porta-voz durante a campanha para a presidência da câmara de Roma, em 1993, continuando a trabalhar com ele como comissário para o Jubileu e para o Turismo. Em 2001, já fazendo parte das listas do partido A Margarida - ao qual também pertenceu Renzi e que acabaria por se fundir com outras formações no Partido Democrático -, foi eleito deputado.
"O Paolo é uma pessoa muito reservada", disse à BBC o jornalista Stefano Menichini, amigo de Gentiloni há quase três décadas. "Nunca há mexericos sobre ele. Nada. Nunca o vão ver em locais de férias famosos", acrescentou, contando que ele prefere as "montanhas austríacas". Outros amigos disseram à AFP que gosta de jogar ténis e ir à ópera. Gentiloni é casado desde 1988 com a arquiteta Emanuela Mauro. O casal não tem filhos.