Em 2018 , uma fotografia de um Wang Fuman chegado à sala de aula carregado de neve no cabelo e sobrancelhas tornou-se viral. O menino de oito anos e a sua irmã tinham de percorrer quatro quilómetros e meio a pé, por vezes sob temperaturas de -9 ºC, desde a casa da avó até à escola numa região montanhosa da província de Yunan, no sudoeste da China. A chegada à escola não proporcionava grande alívio às suas mãos geladas e com frieiras, uma vez que o estabelecimento não dispunha de aquecimento..Twittertwitter952421288647249920.A sua história passou pelas barreiras da censura e rapidamente o "rapaz floco de neve" ou o "rapaz gelo", como ficou conhecido, foi transformado num pequeno herói nacional, elevado à galeria dos que sofrem dificuldades mas nunca desistem pela fé no país e no Partido Comunista Chinês (PCC)..A convite das autoridades, Wang Fuman, o pai e a irmã de 10 anos viajaram até Pequim e visitaram a academia de polícia (o petiz havia dito que o seu sonho era ajudar a apanhar ladrões). Mas mais importante, um ano depois a escola recebeu aquecimento, computadores e laboratórios, a família de Wang foi realojada junto à escola, e ao pai foi oferecido um trabalho na construção civil, embora a 400 quilómetros de distância..Apesar de Wang e a irmã figurarem entre os 61 milhões de crianças chinesas deixadas para trás pelos pais que vão à procura de trabalho nas cidades, é uma história de sucesso do regime comunista, divulgada pelos meios oficiais e pela rede social Weibo e conta para as estatísticas: em novembro passado a China declarou que os últimos nove condados extremamente pobres foram removidos da lista de 832, feita em 2014..O líder chinês Xi Jinping discursa nesta quinta-feira no Grande Salão do Povo para homenagear os participantes no trabalho de redução da pobreza do país: meio milhão de secretários nas aldeias e nada menos do que três milhões de quadros do PCC enviados às regiões mais pobres, entre os quais 1800 morreram durante a sua missão, informa o Global Times, o órgão oficial chinês em língua inglesa..A hora é de colher os louros. É certo que não foi o atual secretário-geral do Partido Comunista Chinês e presidente da República Popular da China quem deu início às reformas para uma "sociedade moderadamente próspera", ou xiaokang, e a consequente abertura à iniciativa privada e ao investimento estrangeiro: foi Deng Xiaoping, em 1979. Também não foi Xi Jinping quem lançou as bases para o combate à pobreza, mas o seu antecessor Hu Jintao..Quando Xi Jinping ascendeu ao poder, em 2012, parte significativa da população já havia apanhado o ascensor social, mas muitos milhões, em especial nas remotas zonas rurais, mantinham um modo de vida de subsistência, em constraste com uma fatia da população com níveis de vida de país avançado. Ao longo dos primeiros anos de mandato de Xi Jinping, 13 milhões de pessoas saíam por ano da pobreza. E no 13.º plano quinquenal, de 2016 a 2020, figurava o objetivo de erradicar a pobreza extrema.."Uma vitória impressionante", declarou Xi em dezembro. "Segundo os padrões vigentes, todas as pessoas pobres do meio rural foram retiradas da pobreza e todos os condados foram removidos da pobreza. A pobreza absoluta e a pobreza regional global foram eliminadas", concluiu o líder chinês, que se prepara para um festejo triunfante em julho, ocasião em que será comemorado o centenário do PCC.."Na minha opinião, os políticos ocidentais agem para as próximas eleições. A China tem um partido no poder que quer atingir grandes objetivos. Na história do desenvolvimento humano, a China conseguir isto é, se não único, então pelo menos algo digno de admiração", comentou Hu Angang, conselheiro governamental e diretor de Estudos da China na Universidade de Tsinghua, ao Financial Times. Nos últimos 40 anos, o crescimento económico da China resultou em mais de 800 milhões de chineses a escaparem à pobreza extrema... Este é um feito extraordinário", disse por sua vez Martin Raiser, o diretor nacional do Banco Mundial na China..No entanto, os especialistas advertem que o aumento dos rendimentos tornou o limiar de pobreza da China desatualizado e, como tal, os critérios de atuação do Estado. As autoridades estabeleceram uma linha de pobreza baseada no rendimento de cerca de 2,30 dólares por dia (1,89 euros) e ofereceram ajuda direcionada aos que se encontram abaixo dessa linha..A China, onde 257 pessoas se tornaram bilionárias durante a pandemia (dados de 2020), é agora um país de rendimento médio-alto, pelo que o Banco Mundial sugere um valor de referência que duplica o limiar atual. "A atual linha baixa, unidimensional e rural de pobreza já não reflete o que significa ser pobre na sociedade chinesa em rápida evolução", comentou Terry Sicular da Universidade do Ontário Ocidental à AFP..Por outro lado, a rigidez e complexidade dos critérios para determinar quem recebe ajuda também têm alimentado algum descontentamento. Essa ajuda pode passar por um programa que, por exemplo, obrigue um agricultor a diversificar culturas e eliminar outras, ou a deslocar populações para zonas menos inóspitas, num país que conta com 40% da população em áreas rurais..Xi Jinping, no discurso em que louvou o feito, reconheceu que havia mais trabalho a fazer, tendo apontado o perigo que a desigualdade representa. "O problema do desenvolvimento desequilibrado e insuficiente no país ainda é notório e a tarefa de consolidar e expandir os resultados da redução da pobreza ainda é difícil", disse na reunião do órgão político supremo da China. A estabilização do mercado de trabalho, o aumento da formação profissional e o reforço da coordenação laboral entre as prósperas províncias orientais e as regiões ocidentais sem acesso ao litoral precisavam de atenção para evitar que as pessoas voltassem a cair na pobreza, disse a agência Xinhua..Para Li Xiaoyun, um perito em combate à pobreza na Universidade Agrícola da China, em Pequim, a luta da China contra a pobreza deve agora passar a travar uma "guerra prolongada" contra a pobreza relativa, numa sociedade em que as famílias devem o equivalente a 121% dos seus rendimentos..O programa de redução da pobreza adotou uma abordagem direcionada em cada região, em cada condado e cada lar de forma a tirar todos da extrema pobreza. 100 Milhões de chineses saíram da pobreza entre 2012 e 2020, ou seja, desde o início do mandato de Xi Jinping como secretário-geral do Partido Comunista, num total de 850 milhões desde as reformas dos anos 1970..88% Estimativa do Banco Mundial sobre a população chinesa abaixo da linha de pobreza internacional em 1981, percentagem que em 2013 já tinha caído para 1,9%..67,7 Mil milhões de euros foi quanto Pequim investiu entre 2016 e 2020 no programa de redução da pobreza..5,5 Milhões de chineses encontravam-se em extrema pobreza no final de 2019. Até julho, quando se celebrar o centenário do PCC, esse número deverá ser reduzido a zero..127 Euros mensais (mil yuans) é quanto auferiam 600 milhões dos 1,4 mil milhões de chineses em 2020, segundo o primeiro-ministro Li Keqiang.