O SNS, os médicos e todos os outros profissionais de Saúde

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Há pouco mais de um ano afirmámos aqui que faltavam médicos em Portugal. Um conjunto de amigos, todos médicos, criticaram muito a nossa análise, porque Portugal tem mais médicos que a média dos países da União Europeia e do que as recomendações internacionais mencionam.

Dados de então levaram-nos a afirmar que, no SNS, apenas cerca de 11 mil médicos estavam obrigados em pleno a realizar serviço de Urgência.

Com a agitação que o setor está a passar, parece que é legítimo afirmar que o SNS tem médicos a menos e "quase" não tem médicos que não trabalhem em mais do que uma Unidade de Saúde, sejam elas públicas ou em acumulação entre o setor público e privado. Sabemos todos que, se os médicos entenderem trabalhar só num sítio e não fizerem trabalho extraordinário, o sistema colapsa. Há muito mais procura que oferta, seja porque as novas gerações olham para o trabalho de forma diferente, seja porque a ideia de trabalhar obrigatoriamente no setor público (leia-se SNS) já não tem a adesão que tinha no final do século passado.

Numa altura em que o Governo prepara grandes mudanças no setor, importa que seja capaz de trazer os profissionais para o seu lado. É preciso serenar os médicos, mas vai ser preciso fazê-lo a todos os outros profissionais de Saúde.

Por um lado, é preciso melhorar as condições de trabalho, quer no que diz respeito aos espaços, quer aos equipamentos. A antiguidade de muitos equipamentos e a incerteza com que respondem às solicitações, cria ansiedade e falta de previsibilidade no trabalho. Muitos dos edifícios precisam de mais conforto para os doentes, mas também para os profissionais.

Por outro lado, e é aqui que se centra grande parte do conflito latente, é preciso pagar melhor. Os profissionais de Saúde, com os médicos à cabeça, são dos que mais demoram a formar-se, desde logo porque os cursos são mais longos, mas também porque a especialização consome outro tanto tempo. São poucos aqueles que encontram no emprego público horários das 9 às 5, com a maioria a trabalhar por turnos, vendo noites e fins de semana ocupados com trabalho. Acresce ainda que são poucos os que trabalham apenas o seu horário normal de 35 horas, vendo-se obrigados a trabalhar muito mais horas involuntariamente.

Por tudo isto, é óbvio que são dos trabalhadores mais mal pagos da Administração Pública, com a agravante de serem dos mais bem pagos do setor privado. É por isso necessário que o SNS se torne competitivo do ponto de vista laboral, se pretendemos mantê-lo como serviço de referência ao qual todos recorrem. Segurar os melhores pode implicar grandes transformações na forma como se paga, tendo esta de estar obrigatoriamente indexada à produção.

O SNS é um dos bens mais importantes da democracia portuguesa e por isso importa que se saiba preservá-lo, garantindo que continua a ser a primeira escolha dos doentes. Para isso é necessário que seja a primeira escolha dos profissionais e que estes possam sentir-se felizes com o trabalho.

Ouvi ontem que os médicos pedem 30% de aumento. É com certeza um aumento irreal e impossível..., mas não me parece mal, já que um assistente em início de carreira, depois de 6 anos de curso e 5 de especialidade, ganha 16,52€ à hora (ilíquidos).

Presidente do Instituto Politécnico de Coimbra

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