"Onde está a Mona Lisa", perguntavam os jornais de todo o mundo no verão de 1911. O mais famoso quadro de Da Vinci tinha desaparecido das paredes do Louvre e a demanda até encontrá-lo demoraria dois anos, com a imprensa a seguir cada passo. No Diário de Notícias as atualizações eram feitas quase diariamente, numa coluna chamada Hestrangeiro - e numa secção que percorreria o jornal durante os dois anos seguintes: "O caso do roubo da Joconde do Museu do Louvre"..O quadro desaparecera das paredes do museu no dia 21 de agosto desse ano, mas as autoridades demorariam 26 horas até dar pela sua falta. É que era segunda-feira, dia em que as portas estavam encerradas aos visitantes. Sem vestígios nem pistas de qualquer tipo, os investigadores franceses viam-se a braços com uma missão complicada. E sempre que os indícios apontavam um caminho, este revelava-se beco sem saída. A primeira notícia de que o DN dá conta a propósito do caso data de 25 de agosto. Reuniu-se o Conselho de Ministros francês com a direção do museu e juntos determinaram o despedimento do chefe dos guardas. Nos anos seguintes, eram reforçados os cordões de segurança em redor das principais obras. Esta não era a primeira obra roubada do Louvre, mas era a mais importante. O corpo de guarda - até essa altura de 150 homens para vigiar 250 mil obras - foi duplicado..Por essa altura já França tinha fechado todas as suas fronteiras - ninguém saía do país sem ser revistado. Mas ao fim de uma semana, a polícia via-se com uma mão cheia de nada e outra de coisa nenhuma. Com a chegada do outono era preciso dar outro rumo à investigação. As autoridades sabiam que não faltavam falhas de segurança no Louvre, um mês antes do roubo de Mona Lisa, um repórter francês tinha criado um escândalo ao passar a noite num sarcófago - para provar precisamente que a segurança do Louvre era completamente inoperante..No início de setembro o jornal que tinha publicado essa história, o Paris-Journal, entrevista um homem que é identificado como O Ladrão e que alega ter ele próprio roubado várias pequenas peças do Louvre e vendido a um grupo de artistas conhecido em Paris. E, ainda que o jornal se recuse a identificar a sua fonte, a polícia percebe nas declarações uma citação do poeta Guillaume Apollinaire. O Ladrão era afinal o seu secretário, e Apollinaire um membro definitivo do grupo de artistas que rodavam em torno de Pablo Picasso..As autoridades acreditavam que atrás do grupo se escondia uma organização de traficantes de obras de arte. Prendem primeiro Apollinaire, que confessa a venda de algumas obras a Picasso e em casa do pintor espanhol descobrem duas pequenas estatuetas de arte primitiva ibérica. Na base das peças, uma inscrição que não deixava margem para dúvidas: propriedade do Museu do Louvre..Apollinaire e Picasso são levados a tribunal e o segundo enfrenta o perigo de deportação. Mas o poeta francês decide arcar com todas as culpas e o juiz acredita que não tinha sido nenhum dos dois a roubar La Gioconda. Apollinaire passa uma semana na prisão e Picasso é libertado com nada mais do que uma admoestação. Mas agora a investigação via-se sem qualquer pista para seguir. Onde estava Mona Lisa? Ninguém parecia saber..Dois anos depois a resposta chegaria de Itália. Um negociante de arte chamado Alfredo Geri chamaria a polícia a 10 de dezembro de 1913, alegando que um homem o tinha feito viajar até à província de Como, no norte do país, para tentar vender-lhe o quadro de Leonardo da Vinci..A polícia bate então à porta de Vincenzo Peruggia e revista a casa. Lá dentro, estava a pintura de que toda a gente falava. Em Florença, os investigadores confirmariam a autenticidade da obra. Era Mona Lisa..Peruggia, um antigo funcionário do Louvre, confessaria à polícia como roubara a obra. Funcionário do museu, vestira uma bata branca e, na hora do fim das visitas de domingo, escondera-se dentro de um armário. Na manhã de segunda, depois de as funcionárias da limpeza saírem da sala, pegou simplesmente no quadro, retirou-o da moldura e saiu. La Gioconda ficaria dois anos no seu apartamento em Paris até ele se decidir a fazer viagem de retorno a Itália..Quando questionado sobre as suas intenções, Peruggia respondeu em tribunal: patriotismo. Queria devolver a casa a obra do pintor italiano, alegando que não era justo que as tropas de Napoleão a tivessem levado para Paris. O que ele não sabia é que fora o próprio Da Vinci a vendê-la a Francisco I, rei de França e seu protetor..A devolução da obra ao Louvre seria no entanto tensa - e ainda é. Se as relações entre Paris e Roma estão hoje azedas pelas críticas italianas à gestão francesa da crise dos coletes amarelos, em 1913 houve braço-de-ferro entre os dois países por causa de quem deveria ficar com La Gioconda - Itália ainda hoje exige a restituição do quadro. Sete meses depois, arrancava a Primeira Guerra Mundial, com italianos e gauleses a ocuparem lados opostos da barricada.