O regresso às origens na pureza dos Açores

A segunda etapa do Red Bull Cliff Diving realiza-se no arquipélago português, uma etapa sempre aguardada e muito apreciada pelos atletas
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O ilhéu de Vila Franca do Campo não deixa ninguém indiferente, principalmente a quem salta de 27 metros de altura para um oceano Atlântico em todo o seu esplendor. A segunda etapa do Red Bull Cliff Diving é uma das mais aguardadas pelos atletas. Afinal é o regresso às origens de uma modalidade que começou há 250 anos no Havai. Nos Açores salta-se directamente da rocha. É a pura ligação entre natureza e ser humano.

Olhando para estes atletas é difícil não pensar que não é qualquer um que enfrenta uma série de factores nem sempre previsíveis para saltar de tamanha altura. Se há desporto que exige perfeição, o Cliff Diving é um deles. É preciso muito treino e preparação mental. Assim o dizem os dois campeões Rhiannan Iffland e Gary Hunt, tal como o lendário Orlando Duque. Eles são alguns dos principais rostos de uma modalidade que procura tornar-se olímpica. Mas enquanto não faz parte do expoente máximo do desporto, é o título mundial que está em jogo.

Os Açores são a segunda paragem do campeonato. Tudo começou a 24 de Junho em Inis Mór, na Irlanda e Iffland e Hunt são os grandes candidatos a mais um título. A australiana persegue o segundo depois de em 2016 ter sido um autêntico fenómeno. Apareceu como wild card e ganhou logo na estreia, terminando no pódio em todas as etapas. Aos 25 anos é a sensação do Cliff Diving e tudo começou num cruzeiro. "Eu tropecei nestes "mergulhos altos" enquanto trabalhava como performer de mergulhos num cruzeiro. Era acrobata. Sempre fiquei muito impressionada quando via o Red Bull Cliff Diving e, para ser honesta, no momento em que vi, sonhei em fazer parte daquela impressionante modalidade", contou Rhiannan Iffland ao DN. Quando trabalhava no cruzeiro ficou logo atraída pelas plataformas de 17 metros. "As emoções, adrenalina, a combinação de dois desportos que adorava há anos, fiquei imediatamente preparada para começar o meu caminho rumo ao Cliff Diving", admitiu.

Os treinos fora de época são feitos perto de casa, com o surf a ser uma forma de limpar o corpo e a mente. A forma como apareceu de rompante no ano passado, fez com que recebesse muita atenção por parte dos media. "Para ser honesta, a atenção mediática aumentou a pressão, tal como ter de manter o nível. Tento que essas coisas não me afectem", disse a australiana, salientando que mergulhar nos Açores "é uma experiência incrível".

"Lançar-me directamente do penhasco para o pequeno canal foi a melhor sensação. É difícil de descrever, mas entrar na água e estar rodeada por penhascos e estar numa gruta onde tudo ecoa é surreal", salientou.

Ao contrário de Iffland, Gary Hunt já está muito habituado à atenção mediática, não se estivesse a falar de um dos melhores do mundo. É hexacampeão do Cliff Diving, além de outros títulos mundiais fora desta competição. Motivação para continuar a ganhar não lhe falta: "Estamos sempre a aprender. Cada local tem os seus desafios e em cada novo mergulho eu testo os meus limites e, para mim, a felicidade é progressão."

O britânico de 33 anos é conhecido por não gostar muito de alturas, a não ser que implique saltar para água. "Saltar para a piscina foi a minha religião. Aprendi como me relacionar com as pessoas, como enfrentar os meus medos e aprendi muito sobre mim. Continuo a aprender e é isso que me motiva."
Com 28 etapas ganhas no Red Bull Cliff Diving, incluindo nos Açores, a perfeição é algo quase natural: "Quando nos aproximamos da perfeição, o treino começa a ser mais de fortalecimento mental. Claro que a técnica é essencial, mas o que muitas vezes retém as pessoas é a autoconfiança."

A ambição olímpica

Hunt e Iffland têm em comum o desejo de terem a oportunidade de lutar por uma medalha olímpica. "Um mergulho destes é uma experiência pessoal e luta-se contra os próprios medos, mas, ainda assim é uma competição", disse Gary Hunt. Iffland falou no orgulho em que seria representar o seu país nos Jogos Olímpicos.

O mesmo já não acontece com Orlando Duque. "Acho que já estarei retirado. Em 2024 gostaria de estar num papel diferente neste desporto e, espero, poder ajudar no processo de chegar aos Jogos Olímpicos. Isto é um desporto espectacular e acredito que tem tudo para fazer parte do programa olímpico", explicou o colombiano. Aos 42 anos é uma lenda do Cliff Diving: "Não me vejo dessa forma. Há algumas pessoas que me chamam lenda, mas eu apenas quero fazer o que adoro. Claro que é uma honra ser considerado assim, contudo, não é algo em que pense ser."

Apesar dos muitos anos que já tem na modalidade, Orlando Duque realçou ao DN como continua a adorar a competição, a preparar-se nas pré-épocas para as diferentes etapas e a ver como os restantes atletas estão de forma e assim poder continuar a melhorar os seus saltos. "Mergulhar é o desporto que adoro e quero continuar a desfrutar durante muitos anos."

Admitiu que a experiência ajuda, mas mantém a exigência nos treinos para assim ter a possibilidade de fazer frente aos mais novos. "Tenho de assegurar que mantenho a qualidade na técnica dos saltos, mas também o corpo tem de manter-se forte e preparado para lidar com o que surja nas competições", contou. Duque só tem elogios para os Açores. "Adoro porque é a única etapa que podemos saltar directamente dos penhascos. Aproxima-me do que é mais natural neste desporto", confessou.

Os conselhos de quem sabe

Para quem possa sonhar em estar entre esta elite mundial, Gary Hunt e Orlando Duque deixaram os seus conselhos. O britânico disse para não se fazer apenas os mergulhos indicados pelo treinador. "Procura mergulhos que te interessa e que nunca vistes. Vai passo a passo. As bases são o mais importante, não procures logo os penhascos. Há muito trabalho a fazer a mergulhar primeiro para uma piscina", frisou.
Quanto a Duque: "Há que garantir que se aprende as técnicas de mergulho primeiro. Isso dará sempre uma vantagem quando se decidir levar os mergulhos para mais alto. Quando se controla o corpo, mais de metade do trabalho está feito. É importante ir aumentando [a altura] aos poucos até se estar confortável."
A ronda final do Red Bull Cliff Diving está agendada para as 12.30 (senhoras) e 12.55 (homens). Apesar dos atletas gostarem de saltar da rocha, também têm a plataforma. As senhoras saltam dos 21 metros, os homens dos 27.

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