O Parlamento chumbou um projeto de lei do PAN, numa votação em que foi considerada a representatividade das bancadas, mas se a votação fosse por deputado poderia ter passado. Na passada sexta-feira aconteceu o mesmo com pontos de um projeto de resolução do PCP. É tudo regular, está previsto no regimento da Assembleia da República, no entanto são casos únicos pelo menos nas três últimas legislaturas - e podem obrigar a uma clarificação do regimento..A 29 de novembro passado, a mesa declarou a rejeição do projeto de lei 670/XIII do PAN, que procedia "à alteração do regime jurídico aplicável aos bombeiros portugueses no território continental, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 241/2007, de 21 de junho". O projeto reuniu os votos favoráveis dos deputados presentes do BE, PS e do PAN, a abstenção dos do PCP e do PEV e os votos contra do PSD e do CDS. Confrontando o número de parlamentares que compõem as duas bancadas da direita com o dos deputados do PS, BE e PAN, o resultado seria de facto 107 contra e 106 a favor..No entanto, os responsáveis do site Hemiciclo - que escrutina a atividade parlamentar - detetaram algo invulgar. O Hemiciclo cruza sempre os resultados das votações com os registos de presenças, de modo a poder tornar clara a forma como cada deputado votou em cada diploma (que o site do Parlamento não divulga). Segundo esse registo de quórum, o site contabilizou 99 votos favoráveis dos deputados presentes contra 98 rejeições (e 17 abstenções), num total de 215 deputados presentes (assumindo que o presidente da Assembleia da República não participa na votação excetuando situações em que o próprio explicita ou é autor do diploma)..Na última sexta-feira, voltou a acontecer com um projeto de resolução do PCP, que cria um programa para reduzir e controlar a biomassa florestal. O projeto foi votado a dois tempos: os pontos 3 e 4, que foram aprovados sem questão. E os restantes pontos que a mesa também deu como aprovado (com votos a favor do PSD, PCP, PEV e PAN; e votos contra do PS e BE; e a abstenção do CDS) tiveram 94 a favor e 96 contra. Seriam rejeitados..Em novembro e agora, o facto de terem faltado à sessão plenária mais deputados à direita explica estes resultados. Em novembro, foram nove os faltosos no PSD e CDS; e seis do PS. Na sexta-feira, faltaram 12 do PSD (e um do PCP); no PS foram oito..São casos únicos nas três legislaturas, segundo David Crisóstomo, do Hemiciclo, que tem registadas as votações desde 2009. "Não existiu um outro caso similar, onde o número de aprovações e rejeições estivesse em conflito com o resultado declarado pela Mesa da Assembleia - nem há registo na comunicação social de tal ter acontecido desde 2001", explicou ao DN David Crisóstomo..O Parlamento recusa esta interpretação. Segundo o artigo 94.º, relativo às votações (ver caixa), estas são "por levantados e sentados, que constitui a forma usual de votar" e que, neste caso, "a Mesa apura os resultados de acordo com a representatividade dos grupos parlamentares". O secretário da mesa do Parlamento, Duarte Pacheco, explicou ao DN que pode existir uma discrepância entre o quórum verificado (que acontece antes do início das votações) e o momento exato em que aquelas iniciativas foram votadas - podem ter saído e entrado deputados. "A fotografia não corresponde à fotografia do momento da votação", notou o deputado, referindo-se ao resultado apurado pelo site Hemiciclo.."Para evitar esta situação", defendeu Duarte Pacheco, "tem de existir sempre uma maioria de deputados em efetividade de funções", ou seja 116, quórum esse que "consagra a legitimidade das votações". E defendeu que "se a Mesa se aperceber que há uma distorção completa da realidade", ou seja, menos deputados que os necessários, "a própria fará uma nova contagem de deputados"..Questionado pelo DN, o PAN respondeu com o citado artigo 94.º, que dita a votação "por levantados e sentados". Segundo o PAN, "para haver quórum (...) apenas basta ter metade mais um deputado". Sem mais, admitiram ao DN: "Não obstante este facto concordamos com as regras estabelecidas e vertidas em regimento e, concomitantemente, com o resultado da votação."