A imagem de Santo António está presente em todos os continentes e é seguramente o português mais famoso do mundo. A sua história começa em Lisboa, cidade onde nasceu por volta do ano de 1191, no dia que a tradição fixa a 15 de agosto, numa casa em frente à Sé Catedral. Foi aí batizado uma semana depois com o nome de Fernando de Bulhões, e foi na Sé que Fernando de Bulhões fez os primeiros estudos, ingressando como menino do coro. Foi também na Sé que durante a adolescência realizou um dos primeiros milagres que lhe são atribuídos: um dia vinha a descer da torre da Sé e é acometido pelo demónio; para o afastar desenha com o dedo uma cruz na parede, cruz que ainda hoje aí permanece como testemunho de tal prodígio. Para aprofundar os seus estudos ingressou no importante Mosteiro de São Vicente de Fora, tornando-se cónego regrante de Santo Agostinho, mas as constantes solicitações da família e amigos não o deixaram ter a serenidade que procurava, pelo que pediu transferência para o Mosteiro de Santa Cruz em Coimbra, também da mesma ordem. Tinha cerca de 20 anos e foi passar os próximos dez em Coimbra, levando uma vida discreta de estudo e oração. Por volta de 1219 conheceu os cinco frades da recém-criada ordem franciscana que tinham sido enviados por São Francisco de Assis para evangelizar no norte de África e que passaram por Coimbra. Estes cinco frades foram martirizados em Marrocos e os seus corpos enviados para o Mosteiro de Santa Cruz, um episódio que marcou a vida de Fernando de Bulhões para sempre: ingressou na ordem franciscana, mudou o nome para António em homenagem a Santo Antão (patrono do convento onde estavam instalados os franciscanos em Coimbra) e partiu para Marrocos para evangelizar e para se tornar, ele próprio, mártir. No outono de 1220 frei António deixou Portugal para sempre..No entanto, passou esse inverno muito doente em Marrocos, pelo que foi enviado para Lisboa na primavera de 1221. A tradição refere que uma tempestade arrastou o barco em que vinha para a costa da Sicília, sendo recolhido pelos frades seus irmãos. Participou do Capítulo das Esteiras, a reunião geral da ordem franciscana que se realizou a 30 de maio de 1221 com a presença do próprio São Francisco. No final do capítulo, o discreto frei António foi colocado no ermitério de Montepaolo no norte de Itália, onde manteve uma vida simples e dedicada à oração. Em 1222 deslocou-se à cidade de Forli para participar nas ordenações de frades franciscanos e as circunstâncias forçaram a que improvisasse um sermão. Ali revelou todo o seu conhecimento e eloquência, e impressionou de tal forma os seus ouvintes que logo que São Francisco tomou conhecimento nomeou-o pregador da ordem. Começou assim uma vida de evangelização que o levou a percorrer todo o norte de Itália e sul de França. Foi nomeado o primeiro professor da ordem em Bolonha, lecionando em Montpellier, Toulouse e Pádua. Foi escolhido para guardião de conventos e custódio provincial, tarefas acompanhadas por pregações contra as heresias que eram famosas e atraíam milhares de pessoas que o queriam ouvir. Em 1228 pregou em Roma perante o Papa Gregório IX, que o qualificou como Arca do Testamento pelos conhecimentos que demonstrava. Em 1231, depois de uma Quaresma muito cansativa passada em Pádua, com pregações e confissões diárias, recolheu-se em Camposampiero para descansar, onde ocorreu o famoso milagre da aparição do Menino Jesus e que marcou a iconografia de Santo António. Morreu no dia 13 de junho de 1231 em Arcela, a caminho de Pádua, cidade que tinha escolhido para morrer. Só no dia 17 de junho, na terça-feira seguinte, o seu disputado corpo foi entregue à cidade de Pádua e esse dia ficou marcado por tantos e extraordinários milagres que a terça-feira permanecerá para sempre como um dia especial na devoção antoniana. Ainda hoje na Igreja de Santo António em Lisboa todas as terças-feiras é concedida uma bênção especial com a relíquia do santo e rezado o responso a Santo António. Foi proclamado santo a 30 de maio de 1232, menos de um ano depois da sua morte. Conta-se que nesse dia em Lisboa os sinos de todas as igrejas tocaram espontaneamente e que uma alegria se espalhou pela população que saiu à rua atónita. Só dias mais tarde souberam do sucedido e a razão de tal fenómeno. Em Pádua ficou conhecido como Il Santo - o santo - e as obras para a construção de uma catedral para albergar as suas relíquias começaram imediatamente após a sua morte. A cidade onde o santo nasceu também lhe prestou homenagem e a edilidade de Lisboa adquiriu a sua casa, construindo aí uma capela, mais tarde transformada em igreja, por ação dos reis D. João II e D. Manuel I. No mesmo edifício instalou-se também o Senado da Cidade que ficou mais de 400 anos no local, até às vésperas do terramoto de 1755. A igreja foi parcialmente destruída pelo terramoto, resistindo a cripta e a imagem do altar-mor que por isso permanecem objeto de culto especial. Reconstruída com doações recolhidas em Portugal e por todo o reino, conta-se que as crianças de Lisboa também quiseram participar e começaram a armar pequenos tronos durante a festa de Santo António, pedindo "um tostãozinho para o Santo António", tradição que se manteve até à atualidade. Entronizado como o santo milagreiro, a quem tudo se pede, Santo António vai acumulando padroados ao longo dos séculos. Padroeiro dos barqueiros, dos náufragos e marinheiros, dos pescadores e dos agricultores, dos feirantes e dos animais, dos cavalos e dos burros. Padroeiro dos viajantes e dos velhos, dos pobres e dos oprimidos, das solteiras, das grávidas e das estéreis, dos namorados e dos casamentos, protetor dos lares e das famílias, da pureza e da virgindade. É o advogado das almas do purgatório, invocado para encontrar objetos perdidos e pessoas desaparecidas, ajuda a encontrar emprego e auxilia nos problemas financeiros. Este carácter protetor manifesta-se ainda pela colocação de registos de azulejos nas fachadas dos edifícios ou na presença da sua imagem em farmácias, leitarias ou drogarias, para velar pelos bons negócios. Entendido por vários autores como reminiscências de cultos pagãos, estas práticas associam-se às festas que lhe são dedicadas a 13 de junho e que iniciam o período das festas dos Santos Populares, assimilação das antigas festas do solstício de verão, celebrado com ritos de fogo e cerimoniais associados à fertilidade e abundância. Por isso, as festas incluíam o saltar à fogueira, a noite das "sortes" nas fontes e chafarizes onde a água adquiria virtudes mágicas, a queima das alcachofras para saber se havia casamento, os manjericos que só podem ser tocados, os cravos e os balões. Daqui surge também um dos padroados mais conhecidos de Santo António, o santo casamenteiro, que se generaliza sobretudo a partir do século XIX em Portugal, Itália e Espanha, mas também no Brasil e por toda a América Latina. Para esta reputação não será alheio o facto de Santo António, ainda em vida, proclamar a santidade do matrimónio e ser um excelente conciliador de casais. Para lá disso, muitos dos seus milagres relacionaram-se com a proteção de raparigas. Por isso, a sua intervenção era solicitada através de inúmeras fórmulas e a imagem de Santo António era, muitas vezes, sujeita a práticas de coerção mais ou menos violentas quando demorava a atender os pedidos. Colocado de costas para a parede, mergulhado em poços ou em bacias de água, amarrado à perna da mesa ou da cadeira, deixado ao relento ou retirando-lhe o Menino Jesus. Estas práticas foram-se atualizando e ainda hoje é tradição lançar uma moeda na sua estátua em Lisboa; se esta ficar no livro aberto que o santo tem na mão, é mais do que certo que haverá casamento em breve. Existem muitas outras tradições associadas a Santo António, que nos recordam o carinho e a devoção popular que Portugal sempre lhe dedicou e que o tornou santo padroeiro de Portugal e padroeiro principal da cidade de Lisboa.