"Versalhes? Floresta Negra? É aqui, em Serralves". O músico Pedro Abrunhosa sintetiza assim a rara diversidade cénica que dota o Parque Serralves de uma especial singularidade. É dele o testemunho que fala de um parque que é "raiz" e onde "a terra toca o céu". Mas Serralves precisa de mais. De mais testemunhos, de mais histórias, das memórias de todos os que já passaram pelo espaço, para ajudar a contar a história de um lugar que se tornou património indissociável da cidade do Porto e coração de um dos ecossistemas culturais mais importantes do país. Por isso, no ano em que o Parque comemora os seus 100 anos, o apelo é lançado a toda a comunidade: "Ajudem-nos a contar Serralves"..Todas as histórias contam neste projeto colaborativo que será o ponto alto do programa de comemoração do centenário do Parque que começou a ganhar forma em 1923, quando Carlos Alberto Cabral, 2.º Conde de Vizela, herdou a Quinta do Lordelo, situada na Rua de Serralves. "Trazer as memórias da história do Parque através das pessoas que o vivenciaram e ajudaram a evoluir é a forma mais justa de celebrar este centenário", assinalou ontem a diretora do Parque de Serralves, Helena Freitas, ao lado da presidente da Fundação de Serralves, Ana Pinho, e da historiadora Maria Fernanda Rollo, convidada para coordenar o projeto dos "100 anos do Parque".."Olhar para a história de Serralves é uma missão muito bonita, muito importante e é um privilégio. Esta é uma instituição inspiradora. Aqui a gente sonha e alguma coisa acontece", destacou a historiadora, que, das várias dimensões presentes na história do Parque de Serralves, desde a ambiental à artística, salientou "a capacidade de conectar com as pessoas". É esse legado que Serralves quer respeitar e reforçar na celebração do centenário do espaço que desde 1999 alberga também o Museu de Arte Contemporânea projetado por Álvaro Siza Vieira.."Uma das componentes deste projeto é abrir o espaço para uma história que não está nos livros nem nos papéis e que é vital para esta identidade de Serralves. Convidar as pessoas para partilhar as suas memórias, os seus testemunhos, para nos mostrarem as fotografias, os postais, os papéis que têm em casa, porque esse testemunho é-nos fundamental para construir, conseguirmos recuperar e compor a história deste espaço fantástico. Serralves, e o Parque de Serralves em particular, têm essa característica, têm o potencial e têm desempenhado uma dimensão verdadeiramente transformadora ao nível da cidade como um todo, na sua dinâmica urbana, nas suas sociabilidades, mas também ao nível das pessoas individualmente. Sendo um espaço público é um espaço íntimo de cada um, nas suas experiências pessoais, nos seus afetos e nas suas relações sociais e pessoais", descreve Maria Fernanda Rollo, ao DN..Assim, "num convite à sociedade em geral e em especial aos habitantes do Porto" para partilharem as suas memórias e darem os seus testemunhos, Serralves vai promover os Dias da Memória, no fim de semana de 21 e 22 de abril, abrindo portas ao público "para convidar as pessoas a partilhar as suas recordações, memórias, fotografias e outros objetos" que possam guardar sobre o Parque de Serralves. Além disso, todas as pessoas são convidadas a partilhar a suas memórias através de um contacto de email criado propositadamente para o efeito: memorias@serralves.pt.O programa de recolha de testemunhos contempla ainda os Encontros de Memórias, que decorrerão já no próximo mês de março, um conjunto de três entrevistas coletivas (nos dias 3, 17 e 30), onde se reunirão vários convidados para participar numa conversa temática sobre Serralves e as suas várias dimensões: programa educativo e responsabilidade social (dia 3), memórias artísticas e literárias (dia 17) e o Parque e a Cidade, com representantes de entidades que convivem com Serralves (dia 30). As memórias serão partilhadas digitalmente e darão também origem a uma exposição e a um livro..Monumento nacional desde 2012, o Parque de Serralves teve em 1986 aquele que foi provavelmente o momento mais importante da sua história, quando, em risco de ser engolido pelas ambições imobiliárias da época, viu o Estado adquirir os terrenos e ser criada a Fundação que hoje o gere..Ana Pinho, atual presidente do conselho de administração, celebra "um espaço onde sempre se procurou fazer o melhor de cada tempo e, por isso, um espaço intemporal" e salienta que "nos últimos anos o Parque tem ganho uma cada vez maior relevância na concretização da missão de Serralves", conjugando "as vertentes ambiental e artística em harmonia e respeito uma pela outra"..Por isso, "o centenário do Parque marca de forma especial a programação e atividade de Serralves em 2023", acrescenta, "com um programa dedicado a atrair ainda mais público e mais diverso, cruzando passado, presente e futuro". Os grandes eventos são, naturalmente, parte da "estratégia de abertura de Serralves à sociedade" e, para este ano, estão programadas novas edições dos já tradicionais Serralves em Festa, Festa do Outono, Bioblitz e Serralves em Luz..Na vertente mais ecológica e ambiental, Serralves tem também novidades a apresentar, desde a nova horta pedagógica à Estufa ou aos novos caminhos da Quinta. E, para que possa sempre manter-se como um espaço à frente do seu tempo, há um futuro para antecipar, sublinha a diretora do Parque, Helena Freitas: "A biodiversidade e a mitigação climática são conceitos que têm de estar presentes nesta regeneração em curso na sociedade por um mundo mais ecológico e inclusivo". E também aí Serralves quer continuar a ser "um modelo" de um espaço natural integrado em ambiente urbano..Helena Freitas, Diretora do Parque de Serralves."Eu conheço Serralves desde pequenina. Sou natural de Vila Nova de Famalicão e sempre me lembro de vir a Serralves. E é interessante porque sempre tive uma imagem positiva de Serralves enquanto espaço à frente do seu tempo. Um espaço de qualidade, capaz de trazer uma mensagem muito positiva e de harmonia enquanto espaço natural. Além disso sempre fui muito interessada pelo serviço educativo também, por esta capacidade pedagógica de trazer muito cedo, desde o princípio do projeto, as crianças e as escolas. Isso também foi um ato visionário de Serralves. A mim, o que mais me encanta, particularmente, enquanto espaço é de facto a frente da Casa, aquele horizonte. Sou fascinada por cor e aquele horizonte de cor, a capacidade de fazer da natureza um envelope tão bonito e harmonioso com a Casa, é fantástico..Maria Fernanda Rollo, Historiadora e coordenadora do projeto 100 anos no Parque "Quando as minhas filhas eram mais pequenas e lhes perguntávamos onde queriam passar o fim-de-semana, normalmente, fim-de-semana sim fim-de-semana não, a resposta era: "Serralves". E eu resido em Lisboa. Nunca lhes perguntei exatamente porquê, mas acho que encontraram aqui um espaço de segurança, de cuidado, de liberdade, onde podiam correr, brincar, ver, ligar a arte com a natureza, ter um sentido estético da vida, olhar as árvores de outra forma. Esses contactos têm aqui formas especiais de ser. Profissionalmente, como historiadora, não tenho dúvidas de que estamos perante uma dimensão de singularidade. Serralves tem sido um reflexo do que tem sido a história do Porto. Na sua dimensão de urbanismo, naquilo que é a afirmação até de elite industrial e da afirmação do Porto nesse plano desde meados do século XIX, que tem uma matriz muito diferenciadora do resto do país.".Ana Pinho, Presidente da Fundação de Serralves."Eu tenho mais dificuldade em lembrar-me das memórias mais antigas porque estou cá todos os dias. Por isso, as minhas memórias mais fortes são as mais recentes e passam por tanta coisa que é difícil pormenorizar. Mas o que fica de todos os momentos, mesmo quando o dia-a-dia é mais exigente ou confuso, é que este é um local onde eu verdadeiramente me sinto feliz. Gosto de passear sozinha pelo Parque, passar pelos Liquidâmbares, um local extraordinário onde nos sentimos acolhidos mas ao mesmo tempo temos espaço, horizonte... e muitos outros locais. Esta Parque é fantástico e singular porque tem espaços naturais muitos diferentes que nos fazemsentir bem. O banquinho no recanto do jardim das Camélias, o Parterre central que é avassalador, o Prado... enfim, tantos lugares diferentes e que nós, Serralves, tentamos potenciar para atrair cada vez mais diferentes públicos.".- 21 e 22 de abril. Dias da Memória. Convite à sociedade em geral, e em especial aos habitantes do Porto, para partilharem as suas memórias sobre o Parque. - 24 e 25 de maio Conferência Serralves 100 Anos de História e Património. - 15 de junho Roteiro histórico no Parque de Serralves. - 17 de outubro Exposição Parque de Serralves: 100 anos de Histórias e Memórias. - 18 de novembro Apresentação do livro Parque de Serralves: 100 anos de Histórias e Memórias..- 8 a 14 de maio. Bioblitz. - 2 a 4 de junho. Serralves em Festa. - 23 e 24 de setembro. Festa do Outono..A programação regular contempla ainda oficinas de férias, espetáculos, percursos no Parque, formações, mercados, conferências e outros projetos que pode consultar em Serralves.pt