O 'Nabucco' e a importância de haver uma direção

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A estreia do Nabucco teve um São Carlos à cunha e, quando terminou, a casa foi generosa em aplausos. Merecidos, considerando o nível a que esteve a Sinfónica Portuguesa (como total orgânico ou nos episódios solísticos ou de ensemble), eficazmente preparada e motivada por Antonio Pirolli, este de géstica sempre atenta e efetiva para o palco.

Nas vozes, Elisabete Matos (primeira Abigaille cá) agarrou o papel desde a primeira entrada, para não mais o largar, "animal de palco" que é: a escrita de Abigaille é temível, com laivos de intencional ne plus ultra da parte de Verdi, mas Elisabete tudo ultrapassou, até as fioriture mais belcantistas, aí apoiada q.b. por tempi "negociados" com a regência. Odena (seu primeiro Nabucco) deu boa conta do papel, denotando só ocasional intonação baixa. Mas foi "prejudicado" pela excelente prestação de Simon Lim como Zaccaria. Carlos Cardoso é tenor de típico recorte italiano, mas Ismaele exige tom e postura mais ardite e não só gentili... Como Fenena, Maria Luísa de Freitas foi notavelmente contida, i.e., incorporou a personagem. Os restantes cumpriram bem. O coro, muito requisitado, teve desequilíbrios de intonação e homogeneidade, estes, nomeadamente, em momentos do célebre Va, pensiero.

Mais desequilibrado se revelou o lado cénico-dramatúrgico, a cargo do team de André Heller-Lopes. O conceito cenográfico até é ponto de partida interessante, mas o seu aparato visual não tem real correspondência em termos de eficácia na progressão narrativa, sendo antes amplamente decorativo. Os figurinos são equívocos: os hebreus como sionistas burgueses bem-postos (mas militantes armados?...), liderados por um Zaccaria sósia de Theodor Herzl (um pretenso radical decalcado de um moderado?); os assírios parecendo cópias de Zorro (!) e, na família real, porquê Abigaille tão mais faustosa que pai e irmã? E deficiente sobretudo a direção de atores e de massas (coros), quiçá o maior embaraço da produção. Pena.

crítico musical

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