O menino que queria roubar a bola à estátua do Eusébio
Mohcine Hassan carrega nos ombros um nome famoso no futebol português. O pai, Hassan Nader, brilhou no Farense - em 1994-95 foi o rei dos marcadores na I Divisão - e alinhou duas épocas no Benfica. Nessa altura, o menino de 3 anos já ia à Luz ver os jogos do progenitor, mas só se lembra de procurar "roubar a bola à estátua do Eusébio". Agora, na antecâmara do Olhanense-Benfica desta noite (19.00 SportTV1), o jovem avançado, de 23 anos, sabe que tem os holofotes virados na sua direção. "Diverte-te e faz o que tens a fazer. Tenta marcar um golo, mas, acima de tudo, diverte-te", disse o pai Hassan, ao telefone desde Marrocos, durante uma das conversas diárias que mantém com Mohcine, emprestado pelo V. Setúbal ao emblema de Olhão.
"Dá-me muitos conselhos e eu gosto de ouvir as suas palavras, mais a mais porque são a voz da experiência e de alguém que foi figura no futebol português. Sei que ele vai estar atento ao jogo, mas não há qualquer tipo de pressão", conta o atacante, também ponta--de-lança como o pai e habitual titular do onze de Bruno Saraiva. "Em certa medida, é apenas mais um jogo. A obrigação está toda do lado do Benfica, embora o Olhanense tenha qualidade e vá procurar mesmo ganhar o jogo", prossegue, sem evitar um sorriso quando confrontado com a ideia de marcar um golo. "Vou fazer o meu trabalho e se surgir uma oportunidade... quem sabe? Tenho na cabeça a ideia de seguir as pisadas do meu pai e ser até melhor do que ele", atira, com determinação.
De Casablanca, onde treina a segunda equipa do WAC, Hassan Nader, hoje com 52 anos, também acredita nas potencialidades do herdeiro. "Não é por ser meu filho, mas tem imensa qualidade. Até esperava que ficasse no plantel do V. Setúbal. Disse-lhe para não baixar os braços, para melhorar e adquirir experiência, porque sempre é melhor jogar do que estar no banco. Importa que trabalhe bem, no duro, e que todos os dias tenha motivação", vinca, aludindo a um fator que esta noite não vai certamente faltar. "Já falámos sobre o jogo com o Benfica, claro. É para a Taça, prova em que os mais pequenos gostam de fazer cair os grandes. Os jogadores do Olhanense estão contentes, vão lutar e querem dar nas vistas. O Benfica, só por si, é sempre uma fonte de motivação."
Se o sonho comanda a vida, o de Mohcine Hassan é marcar esta noite. "O Luisão? Seja ele ou o Jardel estou pronto para fazer o melhor e obter um golo", o que seria, convenhamos, o orgulho máximo do pai Hassan. "Gostaria que ele fosse melhor do que eu. Acima de tudo, desejo que a carreira lhe corra bem e que um dia jogue na I Liga e num grande. Prognóstico para hoje? O Benfica é difícil de bater, é uma enorme equipa, mas tudo é possível", sublinha, sem colocar de parte a surpresa que o deixaria radiante, apesar de todos os laços que o une ao Benfica. "Tenho muitas saudades do Farense e do Benfica. Fazem parte da minha vida e nunca vou esquecer Portugal. Aliás, tenho dois filhos que vivem aí e por aí devem ficar", argumenta o antigo goleador.
Com dois golos nos seis jogos efetuados pelo Olhanense, que milita no Campeonato de Portugal, o mais novo do clã Hassan garante que "a equipa sabe o que tem de fazer" para contrariar o Benfica e vitória não é uma palavra vã. "Queremos ganhar. De resto, é mais um jogo", relativiza, quiçá pensando nos conselhos de quem fez do golo a sua profissão. "Era muito pequeno, não me lembro de ver jogar o meu pai no Benfica. Sei que ia ao Estádio da Luz e queria roubar a bola à estátua do Eusébio."
Esta noite, quando subir ao relvado do Estádio Algarve, sabe que há um homem, num outro continente, a desejar que o nome Hassan figure de novo nos escaparates do futebol português.