O fugitivo Ledezma foi recebido por Rajoy e Maduro não gostou
"Não permitamos que a Venezuela nos morra nas mãos", disse Antonio Ledezma, o mais conhecido opositor ao regime de Nicolás Maduro depois do também detido Leopoldo López, ontem à chegada à Madrid, depois de ter fugido da prisão domiciliária em que se encontrava em Caracas. "Hoje, em Espanha, sinto-me livre".
Ledezma, de 62 anos, foi recebido no aeroporto de Madrid pela mulher e as duas filhas, acompanhadas pelo ex-presidente da Colômbia Andrés Pastrana e pela eurodeputada espanhola Beatriz Becerra. À sua espera tinha também um grupo de apoiantes, que cantou o hino venezuelano.
O presidente do Distrito Metropolitano de Caracas, afastado pelo regime em 2015, deixou ainda algumas críticas à oposição, principalmente as divisões que estão a surgir entre os adversários do presidente Maduro. "O governo está a tirar vantagem dos erros dos dirigentes da oposição, que convido a que façam uma autocrítica. A oposição tem de encontrar a bússola que perdeu, num momento em que a Venezuela está a chegar ao ponto de se afundar definitivamente", declarou no aeroporto.
Em prisão domiciliária desde fevereiro de 2016 - à exceção de três dias em agosto deste ano, durante os quais foi levado pelas autoridades -, a vida de Ledezma até esta quinta-feira era marcada pela rotina dos controlos dos funcionários encarregues da sua vigilância que lhe tocavam à porta às oito da manhã e às oito da noite. Com o passar do tempo esta visita da noite deixou de ser diária e, na quinta-feira, após o controlo matinal, Ledezma fugiu de casa e foi de automóvel até à Colômbia, seguro de que só dariam pela sua falta na manhã seguinte.
Na chegada ao país vizinho contou que passou por 29 controlos da polícia do exército durante a sua viagem de fuga entre Caracas e a Colômbia, pedindo desculpas por a família não saber o que ia fazer. "Peço à minha mulher e filhas que percebam. Elas passaram longas horas de angústia sem saberem onde eu estava", explicou Ledezma quando chegou à cidade colombiana de Cucuta, após passar uma ponte vindo de San António, na Venezuela. "Foi uma decisão só minha".
Após a sua fuga, Ledezma foi apelidado de "vampiro" por Maduro e acusado por oficiais do governo venezuelano de ajudar os radicais violentos, incluindo oficiais militares dissidentes que conspiram derrubar o presidente através de ataques aéreos. Acusações que o opositor diz serem inventadas. "Espero que nunca o devolvam, podem ficar com o vampiro", disse Nicolás Maduro na sexta-feira à noite. "As pessoas de Madrid terão de ter cuidado à noite, o vampiro vai para Madrid", acrescentou o presidente venezuelano.
Antes de embarcar num avião privado para Bogotá, a capital da Colômbia, Ledezma adiantou estar a planear uma "peregrinação mundial" para lutar pela liberdade política na Venezuela. E agradeceu ao governo colombiano por ter dado recentemente asilo a outra dissidente, a ex-procuradora-geral da Venezuela, Luisa Ortega. "É tempo de Maduro se afastar e permitir um governo de transição", afirmou o autarca destituído. "Maduro não pode continuar a torturar o povo venezuelano, ele está a matar os venezuelanos à fome".
A primeira paragem desta sua peregrinação foi Madrid, onde ao início da tarde foi recebido pelo primeiro-ministro espanhol, Mariano Rajoy. No encontro, Ledezma descreveu a grave situação em que se encontra o seu país, sublinhando que a "Venezuela está num abismo, está a viver num colapso". Rajoy "reiterou o pleno compromisso de Espanha com a democracia na Venezuela", garantindo que irá "continuar a trabalhar, a nível bilateral e em colaboração com os seus parceiros europeus e iberoamericanos" para ajudar nesse objetivo.
O Ministério dos Negócios Estrangeiros venezuelano considerou esta reunião como uma "ingerência" e um "ato pouco amistoso" por parte de Espanha.