O Fidesz, Viktor Orbán e a sua democracia iliberal sofreram uma pesada derrota neste domingo ao ver eleito para presidente da Câmara de Budapeste o candidato da oposição unida, Gergely Karácsony, um cientista político liberal, de 44 anos..Karácsony triunfou sobre István Tarlós, um aliado do Fidesz, que estava na liderança da autarquia da capital húngara desde 2010. O especialista em sistemas eleitorais, que também já foi presidente da Câmara de Zuglo, obteve 50%. O engenheiro de 71 anos, que também já fora burgomestre de Budapeste, ficou-se pelo segundo lugar com 44%.."Demos a toda a gente uma lição de democracia... a oposição unida, que os eleitores há muito queriam, começa a tomar forma. Os resultados dizem-nos que o caminho a seguir é em frente. A mudança em Budapeste e noutras cidades principais é o primeiro passo para mudar toda a Hungria", declarou Karácsony, aos seus apoiantes, prometendo que a capital húngara será no futuro uma cidade verde que voltará a estar alinhada com a Europa. O seu opositor disse que "não há nada a acrescentar" e desejou-lhe "boa sorte" como presidente da Câmara de Budapeste. Miskolc, Szeged e Eger foram outras das cidades onde candidatos da oposição ou independentes apoiados pela oposição saíram vencedores..Orbán, por seu lado, notou que, a nível nacional, nestas autárquicas, a maioria dos eleitores preferiu o Fidesz e os seus aliados da Aliança Democrática, afirmando-se confiante numa renovação da vitória nas eleições legislativas de 2022 na Hungria. "Os cidadãos de Budapeste decidiram que chegou a hora de fazer qualquer coisa de diferente. Aceitamos esta decisão. No interesse do país e dos cidadãos de Budapeste estamos prontos para cooperar.".A imagem da Hungria tem sofrido bastante desgaste, pelo menos a nível externo, com o populismo de Orbán. Os seus conflitos com a UE são uma constante e servem de combustível para alimentar o nacionalismo interno..Há um ano, o anterior Parlamento Europeu votou a favor de sanções contra o governo húngaro de Viktor Orbán, acusando-o de violar os princípios da democracia e as regras da União Europeia com medidas tão polémicas como a da sua vedação antimigrantes ou a criminalização da ajuda - alimentar ou outra - aos refugiados e migrantes ilegais..Em março deste ano, dois meses antes das eleições para o novo Parlamento Europeu, o PPE suspendeu o Fidesz, partido de Orbán, depois de este ter usado cartazes e outros materiais de propaganda numa campanha de fake news que responsabilizava a União Europeia e o ainda presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, de facilitarem a chegada maciça de refugiados e migrantes ao continente europeu..Mais recentemente, a Comissão de Assuntos Jurídicos do Parlamento Europeu rejeitou o candidato nomeado por Orbán para comissário do Alargamento na nova Comissão de Ursula von der Leyn, László Trócsányi, por conflito de interesses. Um deputado do Fidesz, Jozsef Szajer, logo fez saber que aquela comissão parlamentar "quis castigar" o ex-ministro da Justiça húngaro "por ter defendido os húngaros e protegido as fronteiras". O primeiro-ministro húngaro mandou, entretanto, um nome alternativo a Von der Leyen, o do embaixador em Bruxelas, Olivér Várhelyi..A questão agora é se a fórmula de ataque à UE chegará a Orbán para manter o poder a nível nacional, numa altura em que até o Jobbik, partido racista de extrema-direita, se uniu à oposição liberal, centrista e de esquerda contra o chefe do governo. A eleição de Gergely Karácsony em Budapeste mostra isso mesmo. O cientista político foi eleito com o apoio do Partido Socialista da Hungria, do partido verde Diálogo pela Hungria, dos liberais-sociais da Coligação Democrática, dos centristas do Movimento Momentum, do partido verde Os Políticos podem ser Diferentes e do Partido Liberal Húngaro. O Jobbik, por seu lado, absteve-se de apresentar um candidato próprio à autarquia da capital húngara.."Parece que a maioria dos húngaros está farta do Fidesz. [Os resultados] mostram o poder da oposição contra as forças antieuropeias [e constituem] uma mudança bastante significativa na paisagem política do país", disse, citada pelo Politico.eu, a eurodeputada Katalin Cseh, eleita pelo Movimento Momentum.."A vitória de Gergely Karácsony em Budapest ecoa a de Ekrem Imamoğlu em Istambul e a vitória em Varsóvia de Rafal Trzaskowski. As plataformas congregadoras da oposição podem tirar do poder regimes neoautoritários nas grandes cidades (...) Graças a alianças notáveis entre todas as forças da oposição, que conseguiram remover o Fidesz das suas cidades fazendo uma política menos ideológica e com mais objetivos tangíveis, a esperança foi restaurada (...) Mas não é certo que a coligação da oposição possa evoluir para um movimento mais consolidado para expulsar o Fidesz do poder em menos de dois anos, tempo que falta para as legislativas", escreveu no jornal britânico The Independent, Umut Korkut, professor de política internacional e investigador de política húngara no projeto Horizon 2020 RESPOND..Apesar das referências a Rafal Trzaskowski, eleito presidente da Câmara de Varsóvia em 2018, pela Plataforma Cívica (PO), a verdade é que a oposição polaca não se conseguiu unir e afirmar desta mesma forma. E, apesar de na capital da Polónia, a PO ter tido mais votos nas eleições legislativas deste domingo do que o partido conservador Lei e Justiça (PiS) - numa relação de 42,9% para 28,2% - o certo é que, a nível nacional, a vitória foi do PiS. Com 44% dos votos, a formação liderada pelo ex-primeiro-ministro Jaroslaw Kaczynski, antimigrantes, anti-gays e pelos valores tradicionais da família católica, repetiu a maioria absoluta conquistada em 2015..Isenções fiscais para pessoas com menos de 26 anos, aumento dos abonos de família, aumento dos salários mínimos para todos os trabalhadores, entre outras medidas, fizeram que o PiS contasse com o apoio das pequenas aldeias, vilas e cidades da Polónia, onde as pessoas se sentiam deixadas para trás na transição do comunismo para a sociedade dos dias de hoje. Porém... (há sempre um porém). "A vitória retumbante dos populistas conservadores sociais seria impensável sem o apoio da poderosa Igreja Católica. A aliança entre "o trono e o altar! está destinada a continuar, tal como a resposta de esquerda anticlero. Mas muitas alianças desse género podem ter consequências fatais para a igreja a longo prazo, como se viu no caso de Espanha", escreveu Bartosz Dudek, diretor da Deutsche Welle na Polónia, num artigo publicado no site da rádio alemã.."Formar um projeto de coligação mais vasto continuará a revelar-se bastante difícil antes das próximas eleições legislativas, dada a necessidade de alinhamento de prioridades muito díspares, que vão das do Jobbik ao Momentum", declarou, à Reuters, Naz Masraff, analista do think tanks Teneo Intelligence.