Nuno Maulide é professor catedrático desde os 33 anos na Universidade de Viena, onde lidera o seu próprio grupo de investigação. Soma mais de 20 prémios e distinções na carreira, entre os quais todos os patamares das seletivas bolsas do European Research Council (ERC) e, ainda nesta semana, juntou-lhe a eleição de cientista do ano pela associação de jornalistas de Ciência e Educação da Áustria. Na Wikipédia, a sua biografia pode ser consultada em alemão e inglês. Em português, pelo menos até agora, é que ainda não..O estatuto de quase desconhecido no seu próprio país (nasceu em Lisboa, 1979), apesar do currículo, não surpreende nem desilude o académico: "Após a conclusão do curso de Química, no Instituto Superior Técnico, fiz o meu percurso académico no estrangeiro", justifica. Porém, lembra: "Mantenho laços profissionais fortes com colegas em Portugal. Por exemplo, recentemente, com o Instituto de Tecnologia Química e Biológica (ITQB), onde sou desde há pouco tempo professor catedrático convidado, mas também com o Instituto Superior Técnico ou a Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa.".Na Áustria, onde a sua equipa se tem destacado pelo trabalho inovador na área da Química Orgânica, criou também reputação de excelente comunicador e divulgador da ciência, mesmo dedicando-se a uma área que não costuma ocupar o mesmo espaço de outras na comunicação social. E foi o reconhecimento dessa capacidade, além do trabalho desenvolvido, que levou os jornalistas austríacos a decidirem destacá-lo entre os pares..Comunicar, ensinar, explica Nuno Maulide, é algo que sempre soube que iria fazer. Mesmo quando ainda tinha dúvidas sobre a área a que se dedicaria.."Sempre gostei muito de ensinar, fosse que tema fosse. Durante a minha infância e juventude, a "profissão de sonho" oscilou entre professor de música, professor de piano, professor de ginástica, instrutor de condução, professor de inglês... acho que se reconhece um padrão", brinca. "Tal como no caso do ensino, a comunicação de ciência pode ser resumida, no seu essencial, no transformar de conceitos abstratos em ideias intuitivas e que façam sentido para um público tão lato quanto possível. O mais difícil é fazê-lo em alemão", diz..O seu percurso académico (com passagem pelo Politécnico de Paris) até ao doutoramento, na Universidade Católica de Lovaina, na Bélgica, e Universidade de Stanford para um pós-doc, foi rápido e com impacto, valendo-lhe várias distinções ao longo do percurso. Mas isso não significa que tenha sido linear. Na verdade, teve sempre de ponderar a gestão de duas paixões com peso igual: a ciência e a música. Acabou por prevalecer a primeira, ainda que não de forma absoluta.."A opção foi tomada duas vezes - no final do secundário, em que decidi concorrer à Escola Superior de Música e eventualmente inscrever-me no Curso Superior de Piano. A segunda no final desse primeiro ano, quando decidi regressar ao percurso científico entrando no Instituto Superior Técnico no curso de Química", conta. "Continuo (e penso que continuarei toda a vida) a ser um pianista amador com muita paixão pelo piano e pela música", acrescenta..Química sustentável.No Maulide Group da Universidade de Viena trabalha-se numa área de ponta da química orgânica: a chamada "química sustentável", cujo objetivo é encontrar formas de tornar mais ecológicos os produtos químicos, omnipresentes em todos os setores da atividade humana. "A investigação e desenvolvimento de novas reações químicas, em condições sustentáveis e eco-protetoras é muito importante para a nossa sociedade", defende. "A Química Sustentável pode assegurar a produção dos compostos químicos que são essenciais para o nosso modo de vida - sejam compostos farmacêuticos, agroquímicos, novos materiais para as mais diversas aplicações ou cosméticos - de uma forma que respeite o meio ambiente e optimize os recursos do nosso planeta.".A equipa tem "bastante experiência no desenvolvimento de tais reações, correntemente chamadas de reações com economia de átomos", e foi para o estudo de uma nova família dessas reações que recebeu a chamada bolsa Consolidator do ERC. "O projeto baseia-se no estudo de reações que estabelecem novas ligações entre átomos de carbono mas sem gerar quaisquer produtos secundários. Ou seja", explica, "não é necessário remover resíduos nem eliminar produtos indesejados. Todos os átomos dos materiais de partida estão presentes no produto final. Daí a designação de economia de átomos".