"Nunca mais", dizem alunos que sobreviveram ao tiroteio na Florida

Cerca de cem estudantes de Parkland foram ao Capitólio do estado exigir aos seus representantes leis de controlo de armas e viram os congressistas chumbar a discussão da proposta que visava proibir a posse de semiautomáticas
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"A nossa mensagem é muito simples", disse ontem Tanzil Philip, de 16 anos, aluno no Liceu Marjory Stoneman Douglas, onde na semana passada morreram 17 pessoas num tiroteio. " Nunca mais. Isto nunca deveria ter acontecido". Philip foi um dos cerca de 100 estudantes desta escola de Parkland que ontem percorreram mais de 700 quilómetros em três autocarros até Tallahassee, a capital da Florida, para se encontrarem com dezenas de legisladores, republicanos e democratas, no Capitólio do estado. Este foi o primeiro evento oficial do movimento de estudantes #NuncaMais (#NeverAgain) e que pretende alterar as leis sobre a venda e posse de armas bem como sobre a saúde mental para que a sua escola tenha sido o último palco de um tiroteio.

"Não estamos aqui para dizer que somos ótimos, que estamos a fazer tanto, porque nós sabemos o que estamos a fazer. E estamos a fazê-lo por uma razão", declarou Delaney Tarr, sublinhando que ela e os colegas viajaram até Tallahassee para mudar as coisas, não para receber palmadinhas nas costas. "Estamos a fazê-lo para que os nossos legisladores mudem as coisas".

Um dos alunos do Marjory Stoneman Douglas, Kyle Kashuv, de 16 anos, contou ser republicano e ter apoiado Donald Trump. Mas admitiu que o tiroteio o fez reconsiderar a sua posição sobre a posse de armas. "Antes eu achava que todas as pessoas, segundo a Constituição, deveriam poder ter armas, mas agora percebo que nem toda a gente deve poder fazê-lo. Devemos ter verificações de antecedentes mais rigorosas e avaliações mentais... Precisamos de um meio termo e de reformas", disse ontem.

Ao final do dia (hora de Lisboa) pelo menos seis legisladores já se tinham recusado encontrar com alunos, algo considerado "inaceitável" pelos jovens. "Vocês trabalham para nós", frisou Ethan Rappaport, de 15 anos. "Nós não somos empregados deles. Nós somos os seus patrões. Não deveríamos trabalhar para vos ajudar a trabalhar".

A Câmara dos Representantes da Florida, controlada pelos republicamos chumbou ontem (71-36) o debate de uma proposta que pretendia proibir a venda e posse de armas semiautomáticas. Uma decisão que deixou em lágrimas e enfurecidos os sobreviventes do tiroteio de Parkland presentes nas galerias. Na mesma sessão, os congressistas estaduais aprovaram uma proposta de lei que declara a pornografia um risco para a saúde pública. "Como é que eles puderam fazer-nos isto? Estão a brincar comigo??? #NuncaMais"escreveu no Twitter Emma González, uma das sobreviventes do tiroteio. "A raiva que eu sinto agora é indescritível".

Um pouco por toda a Florida, estudantes saíram das suas salas de aulas em solidariedade com os colegas do Marjory Stoneman Douglas, que estavam ontem em protesto em Tallahassee. Muitos dos jovens do sul do estado acabaram por se juntar em Parkland, junto à escola palco do tiroteio na semana passada. Este protesto também chegou à capital dos EUA - um grupo de estudantes de um liceu do Maryland foram até ao Congresso, em Washington, de transportes públicos.

Donald Trump, um defensor do direito à posse de armas, tinha na sua agenda de ontem um encontro com pais, estudantes e professores afetados pelos tiroteios de Parkland (14 de fevereiro, 17 mortos), Sandy Hook (14 de dezembro de 2012, 28 mortos) e Columbine (20 de abril de 1999, 15 mortos). Este encontro na Casa Branca estava marcado para um dia depois do presidente dos EUA ter afirmado que a sua administração iria dar passos no sentido de banir os chamados bump stocks, um acessório que permite transformar uma arma semiautomática em automática. Uma porta-voz da Casa Branca disse estarem abertos à ideia de criar um limite de idade nacional para a compra de armas de assalto.

Na segunda-feira, Trump já tinha admitido um possível reforço do controlo de armas, ao dar o seu apoio a um projeto de lei bipartidário, que pretende aumentar a eficácia da base de dados nacional sobre antecedentes criminais e assim impedir que as pessoas ali incluídas possam comprar armas.

Uma sondagem divulgada esta terça-feira pelo The Washington Post e a ABC, 62% dos norte-americanos consideram que Donald Trump não está a tomar as medidas apropriadas face ao tiroteio da semana passada na Florida. A rejeição (77%) é ainda maior em relação ao trabalho do Congresso. No entanto, a maioria das pessoas (58%) sublinhou que a principal causa destes tiroteios é a incapacidade de identificar e tratar a doença mental. Só 28% responsabilizou as leis de controlo de acesso a armas.

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