Nicolas Cage nas sete quintas da selvajaria

Samurais, cowboys, vingadores tóxicos e gueixas são as estrelas do novo filme de Sion Sono, cineasta de género japonês. Desta vez, convoca Nicolas Cage para <em>Prisioneiros de Ghostland</em>, um <em>Mad Max</em> para a miudagem.
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Nicolas Cage por estes dias anda a misturar cinema independente de suposta qualidade, como o recente Pig, e fitas de série B de assumido mau gosto. O homem tem uma dívida fiscal para pagar e o seu tipo de acting com canastrice como marca registada já não lhe permite acesso ao cinema dos grandes estúdios. Tal como Bruce Willis, é uma estrela de cinema do passado em queda livre. Curiosamente, a sua inclinação são filmes de ação e de artes marciais com um elevado grau de loucura, por isso não deixa de ser espantoso quando é o próprio a dizer que este Prisoners of the Ghostland é o seu filme mais "insano". Na verdade, este encontro de Cage com o japonês Sion Sono não é o filme de ação igual a tantos outros. Tal como no cinema de Sono, há uma grande aposta em elementos cromáticos e estéticos que remetem para uma sub-cultura dos mitos dos samurais nipónicos. Mas como esta é uma co-produção com Hollywood, há uma salganhada com "sci-fi" apocalíptica e muito western anárquico. No geral, muita tralha a ser atirada para os olhos da plateia...

Passado num Japão assumidamente artificial, este é o conto de um criminoso americano no Japão, de seu nome Herói, alguém traumatizado por um roubo a uma dependência bancária que corre mal e leva à morte de uma criança sorridente que parece saída de um filme de Jacques Demy. A solução para a redenção é resgatar a neta do Governador, um cowboy cruel americano. Para o fazer terá de ir até à Ghostland, de onde reza a lei ninguém sai. Para piorar tudo, Hero está controlado com um fato que pode explodir a qualquer momento, coisa que acontece logo na primeira tentativa: Hero perde um dos seus testículos e, como não poderia deixar de ser, temos direito a um uivo demente de Nicolas Cage. Sim, a "loucura" do filme é essa.

Sion Sono tem o ambiente e a atmosfera pretendida sempre controlada, embora tudo pareça um banal acumular de folclore daquilo que se entende por "magia" japonesa". Os slow-motions parecem imposições e há em toda essa demonstração um perverso efeito de vaidade. Obviamente, tal como nos filmes ainda mais excessivos de Sono, surge uma ideia ou ideal de instalação de alucinação, ainda que aqui tudo se cole mais a uma reprodução sem escala dos princípios do último Mad Max, de George Miller - Ghostland é uma espécie de terreno deserto onde uma tribo tenta sobreviver depois de um acidente nuclear tóxico.

O filme tem ainda algumas curiosidades que não são propriamente de se deitar fora: a presença de um assustador Nick Cassavetes como assassino de crianças e algum requinte visual no meio de tanta selvajaria. Além disso, tudo vai dar ao jogo do desplante de exagero de Nicolas Cage, quer a forçar expressões quer a tentar transmitir emoções. Quase que é uma performance a quer ser boa de tão má. Enfim, de Cage espera-se sempre tudo e em breve chega The Unbearable Weight of a Massive Talent, de Tom Gormican, onde o ator interpreta uma versão de si próprio, um pouco como acontecia com John Malkovich em Queres ser John Malkovich?, de Spike Jonze.

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