"Não há razão para que não haja diálogo" na Catalunha
O prémio Nobel da Paz, José Ramos-Horta, pede a Madrid e a Barcelona que se entendam pela via do "diálogo". Entrevistado em Bruxelas para o DN/TSF, aquele que foi um dos principais arquitetos da independência de Timor entende que a solução para a Catalunha deve contemplar "algum grau de satisfação" dos independentistas, sendo ao mesmo tempo capaz de assegurar a "unidade" do território.
Enquanto governante de um país com a história de Timor-Leste, como analisa as tensões em Espanha, tendo em conta as ambições independentistas de uma parte da população catalã?
Obrigado por me colocar numa situação delicada [risos]. Mas, respondo da mesma maneira, como fiz há uns anos, quando a BBC me telefonou para comentar [a situação] da Escócia. Algo deve ter ocorrido muito mal, para que vocês, depois de 300 anos a viverem juntos, uma parte de vós queira sair do Reino Unido. Algo falhou no diálogo e nas relações. A solução não é exatamente a separação.
Qual é?
Não vou cair na tentação - que aliás não é sequer uma tentação - de passar prescrições a Espanha e às autoridades da Catalunha de como ultrapassar a situação. Mas, a democracia e a sociedade em Espanha são muito avançadas. Houve situações mais difíceis no passado e foram ultrapassadas. O diferendo entre o governo central de Madrid e a Catalunha não é uma situação tão difícil de encontrar uma solução, pela via do diálogo.
Diálogo. É essa a solução...
Não há razão para que não haja diálogo, para encontrar uma nova fórmula que satisfaça aqueles que estão a querer a separação. Mas, que possam continuar como uma Espanha unida e forte, no quadro europeu. No passado, eu dava sempre o exemplo da Espanha como um país, que através de ampla autonomia concedida às regiões, mantém a sua unidade. O País Basco, por exemplo, é das regiões mais autónomas do mundo.
Enquanto prémio Nobel da Paz, como é que assistiu às imagens que correram mundo, das cargas policiais no dia do referendo?
Houve obviamente excesso do uso da força, pelos agentes da polícia, em relação aos manifestantes [eleitores]. Embora, não tenha nada que ver com as situações que existem em muitos outros países incluindo em Timor-Leste.
Surpreendeu-o que acontecesse na Europa dita civilizada?
Sim, obviamente. Já o disse na altura. Subscrevi uma carta iniciada por um grupo de prémios Nobel em que condenámos o uso da força pelas autoridades, mas apelando ao diálogo entre as partes interessadas, para Espanha.
Que desfecho espera?
Acredito que um Estado tão rico e tão próspero, que um Estado tão forte como a Espanha, com centenas de anos de história, há de encontrar uma solução. E, daqui a uns anos, vão olhar para o que aconteceu, no passado, como um episódio que acontece nos países europeus. Porque já houve situações muito mais difíceis - nem há uma comparação possível -, nos Balcãs e, os europeus conseguiram resolver, embora ainda haja tensões, na Bósnia ou entre o Kosovo e a Sérvia. São extremamente complicadas e conseguiram resolver. Acho que dialoguem para o bem da Espanha e da Catalunha, enquanto província autónoma de Espanha.
Em Bruxelas