Há pouco mais de um ano, os EUA ofereciam uma recompensa de cinco milhões de dólares por informações que pudessem levar à captura do terrorista Mukhtar Robow. Agora, o antigo fundador e ex-líder das milícias de Al-Shabab (com ligações à Al-Qaeda) é candidato à presidência do Estado do Sudoeste, uma região autónoma da Somália..Os observadores acreditam que o homem que quis impor a lei islâmica na Somália e que tecia louvores a Osama bin Laden tem hipóteses de ganhar esta corrida a governador, depois de ter deixado em 2013 o grupo e se ter entregado em agosto de 2017 às autoridades somalis. Mas o governo federal não quer autorizar a candidatura do ex-terrorista às eleições que se realizam a 17 de novembro..Robow, também conhecido como Abu Mansour, foi um dos fundadores das Al-Shabab ("A juventude"), mas deixou o grupo há cinco anos, depois de pôr em causa a liderança de Ahmed Abdi Godane (que seria morto em setembro de 2014, num ataque aéreo norte-americano)..Depois de deixar a milícia, Robow regressou à terra natal, na região de Bakool, onde com o apoio da sua guarda pessoal conseguiu evitar ao longo de anos ser morto ou capturado pelas Al-Shabab ou pelas forças somalis..No ano passado, dois meses depois de o Departamento de Estado norte-americano retirar a recompensa pela sua captura e após negociações secretas, entregou-se às autoridades e tem sido um crítico do seu antigo grupo: "Não concordo com o credo deles, que não serve a religião islâmica", afirmou, citado pela AP..Em outubro de 2017, depois de mais de 500 pessoas terem morrido num ataque com um camião armadilhado em Mogadíscio, que foi reivindicado pelas Al-Shabab, Robow foi doar sangue para mostrar a sua solidariedade. Quando o grupo fez explodir no último mês uma bomba em Baidoa, capital interina do Estado do Sudoeste, esteve no hospital a visitar as vítimas e a condenar os ataques..Mas nunca respondeu na justiça pelos crimes que terá cometido ou que terá ordenado enquanto líder das Al-Shabab. Nem nunca expressou remorsos..Treinado pela Al-Qaeda no Afeganistão.Nascido em 1969 (em Xudur, na Somália), Robow cresceu em Mogadíscio, onde deu aulas de árabe depois de estudar Direito Islâmico na Universidade de Cartum, no Sudão. Terá também fundado o primeiro campo de treino islamita na Somália em 1996, recrutando muitos jovens do Estado do Sudoeste para as Al-Shabab..Era um dos líderes do grupo com mais experiência, tendo viajado para o Afeganistão e treinado ao lado da Al-Qaeda em 2000 - entrando para a lista de terroristas dos EUA, que em 2013 ofereceram a tal recompensa de cinco milhões de dólares em troca de informações que levassem à sua captura..Anos antes, em março de 2008, quando o grupo tinha sido incluído na lista de organizações terroristas dos EUA, tinha dito: "A Al-Shabab sente-se honrado de ser incluído na lista. Somos bons muçulmanos e os americanos são infiéis. Estamos a fazer a jihad [guerra santa] para livrar a Somália dos etíopes e dos seus aliados, os lacaios seculares da Somália. Vamos continua a atacar os capacetes-azuis na Somália, independentemente da sua nacionalidade.".Segundo o governo norte-americano, além de porta-voz e comandante militar, Robow era também um líder espiritual das milícias Al-Shabab, tendo planeado e executado ataques contra tropas somalis e membros das forças de paz da União Africana. Mas em 2013 deixou o grupo (enfraquecendo-o), em confronto com Godane. "Ele recusou ouvir-nos e só está interessado no poder", disse em junho de 2013 Robow, segundo o site do projeto Counter Extremism..As Al-Shabab, que perdeu o controlo de Mogadíscio em 2011, foi considerado o grupo armado mais perigoso em África em 2016, sendo responsável por mais de 4200 mortes, de acordo com o Centro Africano de Estudos Estratégicos, sediado em Washington..O grupo ainda controla partes da Somália, tendo também atacado para lá das suas fronteiras (especialmente no Quénia). Defende um país governado sob a lei islâmica (sharia), tendo os seus próprios tribunais, polícia e sistema educativo nas zonas que controla (maioritariamente rurais)..Candidatura.Robow anunciou a sua candidatura à presidência do Estado do Sudoeste no início de outubro, em Baidoa. "Depois de receber pedidos de pessoas desta região e de intelectuais, decidi candidatar-me à presidência deste Estado nas próximas eleições", afirmou, citado pela Voice of America. "Aceitei os pedidos e, se Deus quiser, vamos ganhar e a paz vai prevalecer", acrescentou..Mas as autoridades somalis rejeitaram a candidatura, com o Ministério do Interior a alegar que ele é inelegível porque ainda é alvo de sanções internacionais (incluindo dos EUA)..Contudo, dizem os analistas consultados pela AP, o problema é que ninguém dentro do governo federal sabe quem tem autoridade para decidir quem pode ser candidato (e já enviaram responsáveis para tentar convencê-lo a retirar a candidatura). Entre os dez candidatos encontra-se o atual presidente do Estado do Sudoeste e antigo presidente do Parlamento somali, Sharif Hassan Sheikh Adan..No fim de semana, houve manifestações na região sudoeste a acusar o governo federal de se imiscuir na votação, ao querer impedir a candidatura de Robow - que as Al-Shabab consideram um apóstata. Apesar do passado, há quem defenda o ex-líder, que em 2009 salvou a vida a cinco membros do governo regional, salvando-os de uma execução certa, quando o grupo assumiu o controlo de Baidoa (então sede do governo federal transitório da Somália).."Ele já mudou para melhor, por isso esqueçam a sua antiga identidade", disse à AP Ali Ahmed Isaq, um líder local. "Como outros políticos com um passado terrível, como senhores da guerra que agora são políticos, não se pode negar-lhe um papel de liderança", acrescentou.