Mino Raiola: de lavar pratos numa pizaria a agente de Pogba e Ibrahimovic
Chama-se Mino Raiola, tem 51 anos e verão após verão tenta rivalizar com Jorge Mendes no domínio do mercado de transferências. Apesar de ter uma boa carteira de futebolistas, tem sido sucessivamente ultrapassado pelo agente FIFA português que, entre outros, representa Cristiano Ronaldo. Mas neste verão este cenário pode ser alterado.
O maior negócio deste defeso até agora foi intermediado por Jorge Mendes, que fez a ponte nas negociações entre o Benfica e o Atlético de Madrid e ajudou a fechar a contratação de João Félix pelos colchoneros, numa operação que teve um custo total de 126 milhões de euros. Mas Raiola, que já transferiu Matthijs De Ligt para a Juventus neste mês, pode em breve conseguir uma operação que supere os valores de Félix, caso a transferência de Paul Pogba seja uma realidade.
Mino Raiola fechou neste mês a transferência de De Ligt do Ajax para a Juventus, uma contratação que custou aos cofres do emblema italiano onde alinha Cristiano Ronaldo 75 milhões de euros. De Ligt, apesar de ter apenas 19 anos, é já considerado um dos melhores defesas centrais do mundo e esteve igualmente na agenda de clubes como Barcelona, Real Madrid e PSG.
No dia em que o empresário chegou a Turim acompanhado de De Ligt, os adeptos da Juventus aproveitaram a presença do agente para lhe fazer mais um pedido: "Traz o Pogba." Sim, Paul Pogba, internacional francês campeão do mundo que atualmente joga no Manchester United, é outro dos jogadores representados por Raiola, tal como Zlatan Ibrahimovic, Marco Verratti, Donnarumma, Henrikh Mkhitaryan, Moise Kean, Matuidi, Balotelli, Manolas e Donny van de Beek, entre muitos outros. Uma carteira de jogadores de fazer inveja.
Pogba pode em breve tornar-se na grande bomba e permitir a Raiola fazer o negócio mais dispendioso deste verão. O jogador já disse que está disponível para deixar o Manchester United e tanto a Juventus como o Real Madrid estão em campo. Nas últimas horas, várias publicações inglesas e espanholas garantiram que o Real está só à espera de acertar a saída de Gareth Bale para avançar em força para Pogba. Em cima da mesa estarão de 160 milhões de euros, que tornariam o médio a transferência mais cara deste verão e permitiram a Raiola fazer o maior negócio deste mercado.
Raiola é uma personagem. Ao contrário de Mendes, não liga muito à imagem. Gordinho e de estatura baixa, veste-se quase sempre de forma descontraída - T-shirt, camisa fora das calças e ténis. E às vezes até de fato de treino. "És gordo. Se algum dia fizerem um filme sobre a minha vida, tu vais ser interpretado pelo Danny DeVito", disse-lhe em 2017 Ibrahimovic, um relato feito pelo próprio agente no livro do avançado sueco.
A forma como Zlatan Ibrahimovic passou a ser representado pelo agente diz muito da forma de ser de Raiola. Quando o sueco há muitos anos quis encontrar um novo empresário para lhe gerir a carreira, perguntou a um amigo jornalista alemão quem lhe aconselhava. Entre vários nomes surgiu o de Mino. "Mas há um problema", disse o amigo. "Qual", perguntou Zlatan. "É mafioso", respondeu o amigo do avançado sueco. "Mafioso soa bem", atirou Zlatan. E assim começou a ligação entre ambos.
Coincidência ou não, em 2016 o empresário foi notícia por ter comprado uma casa. Não foi uma casa qualquer. Raiola adquiriu uma mansão em Miami que tinha pertencido a Al Capone, o mafioso ítalo-americano que inspirou várias séries e filmes. O agente gastou cerca de oito milhões de euros na luxuosa casa com sete quartos, piscina e uma varanda de enormes dimensões.
Nascido em Itália, mudou-se para Amesterdão ainda bebé. E cresceu a ajudar a família na pizaria que abriram na cidade de Haarlem. "O meu pai trabalhava 18 a 20 horas por dia. Quando tinha 11 ou 12 anos fui trabalhar com ele, para o conhecer. Ele estava na cozinha e eu fiquei a lavar os pratos. Hoje ainda gosto de lavar pratos", contou Raiola numa entrevista ao Financial Times, em 2016. De lavar pratos começou a servir às mesas e a partir daí o negócio começou a prosperar, chegando a família a deter um total de 11 restaurantes. Italianos, claro.
Raiola começou muito cedo a aprender línguas. Hoje fala de forma fluente italiano, holandês, alemão, francês, inglês, castelhano e português, algo precioso na sua profissão. Ao mesmo tempo que trabalhava no restaurante tentou a sorte como jogador de futebol, uma das suas paixões. Por isso jogou nas camadas jovens do HFC Haarlem, mas depressa mostrou mais jeito para gerir do que para jogar, por isso aos 18 anos passou a treinar os sub-18 da equipa da cidade onde residia.
Mostrava jeito para o negócio, tinha boa conversa e ainda antes dos 20 anos montou uma empresa, a Intermezzo, que tinha como finalidade ajudar holandeses que quisessem abrir negócios em Itália. E foi durante esse período que se tornou milionário, ao comprar por um preço irrisório um McDonald's local e ao conseguir vendê-lo meses depois por uma pequena fortuna.
A partir daqui, diz, deixou de se guiar pelo dinheiro. E dedicou-se de corpo e alma à sua maior paixão, o futebol. Como diretor do Harleem, ainda esboçou um plano para tentar garantir um jovem que começava a dar nas vistas nas camadas jovens do Ajax, Dennis Bergkamp, mas não conseguiu levar o plano adiante. Foi então que começou a trabalhar no agenciamento de jogadores, mas numa primeira fase como funcionário do empresário Robert Jansen. Algo que não durou muito tempo pois a sua ambição passava por trabalhar por conta própria.
O primeiro negócio de Raiola aconteceu em 1992, quando intermediou a transferência de Bryan Roy do Ajax para o Foggia, de Itália. Mas foi em meados da década de 1990, mais concretamente em 1996, que fez o seu primeiro grande negócio, quando transferiu Pavel Nedved do Sparta de Praga para a Lazio.
A partir daqui nunca mais parou. Entre os grandes negócios que ajudou a fazer estão a transferência de Paul Pogba da Juventus para o Manchester United por 105 milhões de euros em agosto de 2016, em que terá recebido uma comissão de 27 milhões de euros. E todas as movimentações que fez com Zlatan Ibrahimovic (do Ajax para a Juventus, da Juventus para o Inter Milão, do Inter para o Barcelona, do Barcelona para o AC Milan, do AC Milan para o PSG e finalmente do PSG para o Manchester United).
Em junho, o jornal inglês The Guardian dedicou um grande trabalho ao empresário com um título sugestivo: "O superagente que é o sonho de qualquer jogador e o pesadelo dos treinadores." E de facto é mesmo assim. Raiola fala de mais e às vezes em defesa dos seus jogadores aconselha-os de uma forma que nem sempre é a mais ética. Por isso o empresário é detestado por alguns treinadores, como é o caso de Alex Ferguson, que num dos seus livros chegou a dizer sobre Paul Pogba que ele "tinha um mau agente, um balde de merda". "Há um ou dois agentes de quem simplesmente não gosto. Mino Raiola, agente de Paul Pogba, é um deles. Desconfiei dele no instante em que o conheci", acrescentou.
Outro treinador com quem o agente andou desavindo foi com Pep Guardiola. "Como treinador é fantástico, como pessoa um zero absoluto. É um cobarde, um cão", atirou, como resposta ao facto de o treinador catalão não ter dado protagonismo a Ibrahimovic quando ambos coincidiram no Barcelona. Guardiola também não deixou o agente sem resposta. "Ainda há dois meses ofereceu-me a possibilidade de Mhikitaryan e Pogba virem para cá [Manchester City]. Porquê? E agora chama-me cão?"
A grande maioria dos jogadores que preenchem a carteira de Raiola são casos de sucesso. Mas nem sempre é assim. E neste caso falamos de Mario Balotelli, jogador que passou ao lado de uma grande carreira e que sempre foi mais notícia pelos atos praticados fora dos relvados. "O Balotelli fez uma escolha, consciente ou inconscientemente, decidiu não colocar o futebol no topo das suas prioridades. Por isso sucederam-se sempre fenómenos marginais que influenciaram as suas performances", referiu ao Financial Times, reconhecendo que também teve responsabilidades a gerir a carreira do jogador italiano: "O maior erro foi tê-lo deixado sair do Manchester City para o AC Milan contra a minha vontade."
Em maio, o agente viu-se envolvido numa nova polémica, desta vez com a FIFA a decretar-lhe uma suspensão de três meses sem poder realizar qualquer negociação, justificando que Raiola não cumpriu com a regulamentação no caso de uma negociação de um jogador menor (Gianluca Scamacca, de 16 anos, da Roma para o PSV). Mas o empresário recorreu e o Tribunal Arbitral do Desporto (TAD) suspendeu o castigo, que permitiu ao agente fechar há relativamente pouco tempo a transferência de De Ligt e continuar a exercer a sua atividade normalmente.
Raiola pode ter muitos defeitos, mas se há coisa de que não o podem acusar é de não defender os jogadores que representa. E muitas vezes as respostas são feitas através do Twitter, como foi o caso recente em que Paul Scholes, antigo jogador do Manchester United e agora comentador de futebol, criticou uma atuação de Paul Pogba. "Há pessoas que precisam de falar porque têm medo de cair no esquecimento. O Paul Scholes seria incapaz de reconhecer um líder mesmo que tivesse à sua frente o Sir Winston Churchill", disparou.
Mas o empresário também não se furta a comentar outros temas, como quando há uns anos, numa altura em que se falava numa possível reeleição de Joseph Blatter para a presidência da FIFA. "Querem um ditador à frente da FIFA ou uma democracia? Até um miúdo de 15 anos sabe que a única coisa de bom na FIFA são os videojogos", atirou, comparando o voto em Blatter como estar a favor do regime da Coreia do Norte.